Fazenda monta ‘plano de guerra’ para reduzir bloqueios e manter déficit zero

O Estado de S. Paulo

 

A equipe econômica montou um “plano de guerra” para reduzir, ao máximo, a necessidade de bloqueio orçamentário no primeiro relatório bimestral de receitas e despesas do ano, previsto para março – e, assim, tentar manter viva a meta de déficit zero em 2024.

 

O entendimento é de que um contingenciamento (bloqueio preventivo de despesas) expressivo inviabilizaria politicamente a manutenção do objetivo fiscal perseguido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com o aumento da pressão do PT e de integrantes do próprio governo para abandonar a meta de zerar o déficit.

 

A estratégia é acelerar, no curtíssimo prazo, a entrada de arrecadação nova no caixa da União e tentar garantir o maior corte possível de gastos por meio do combate a fraudes, principalmente na Previdência. Há ainda negociações com o Congresso para postergar decisões com impacto nas contas públicas – como, por exemplo, a desoneração da folha de pagamentos e a recomposição de políticas públicas desidratadas pelos parlamentares (mais informações na pág. B2).

 

Assim, o plano da equipe econômica se baseia em quatro pilares principais: um voltado à ampliação das receitas e outros três direcionados à contenção de gastos. Mas como são todas ações de curto prazo, há dúvidas sobre como o governo seguirá evitando contingenciamentos ao longo dos próximos relatórios bimestrais e alcançará as metas propostas para os exercícios seguintes.

 

Arrecadação

 

Pela ótica da receita, primeiro pilar do plano, a medida considerada mais urgente é a regulamentação da lei que altera a tributação das empresas que recebem algum tipo de subvenção do ICMS. A medida provisória que determina a volta da tributação federal sobre essas grandes companhias foi aprovada no apagar das luzes de 2023, e o Fisco corre para colocar as regras em pé nos próximos dias. O governo estima arrecadar R$ 35 bilhões por ano com a medida, mas há um valor a ser recolhido no curto prazo que ainda não está na conta.

 

Com a mudança legal, o governo pretende cobrar o devido em impostos federais dos últimos cinco anos. As empresas terão, contudo, um desconto de 80% nas dívidas tributárias, caso façam a adesão voluntária ao programa. Os 20% desse estoque ainda não estão no cômputo da arrecadação prevista, e é com isso que a Fazenda trabalha para incrementar a receita no curtíssimo prazo.

 

O entendimento da Receita Federal, segundo apurou o Estadão, é de que o desconto é favorável às empresas a ponto de desestimular a contestação judicial, que geraria pagamentos de custas judiciais acima desse porcentual. Assim, se acredita que haverá interesse em optar pelo recolhimento imediato.

 

O universo de tributação dessa medida alcança, principalmente, 500 grandes empresas, que responderam por dois terços da renúncia tributária com a medida em 2022, avaliada em R$ 53 bilhões.

 

A Receita também prepara a regulamentação da tributação dos sites deapostas esportivas, cuja arrecadação prevista no Orçamento deste ano é de pouco mais de R$ 700 milhões. A cifra, porém, é considerada conservadora. Também são conservadoras, para a Fazenda, as projeções sobre o potencial de receitas com medidas aprovadas em 2023, como a tributação dosfundos offshore e exclusivos – em dezembro, o recolhimento de impostos foi de R$ 3,9 bilhões, ante previsão de R$ 3,2 bilhões.

 

Gastos

 

Pelo lado do gasto, outro pilar do plano, a aposta principal é no combate a fraudes na Previdência, por meio do maior uso da inteligência artificial no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), como antecipou o Estadão em dezembro. Desde o último dia 15, a ferramenta criada pela Dataprev realiza varreduras em atestados médicos enviados pela internet.

 

Um grupo de trabalho interministerial também está debruçado sobre esses pagamentos, que representam a maior despesa pública. A meta de economia na revisão dos benefícios é de R$ 12,5 bilhões, inclusive já incorporada ao Orçamento de 2024. Mas a avaliação no governo é de que há espaço para superar essa cifra.

 

Por isso, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, tem sido chamado de possível “salvador” do Orçamento. Ele se reuniu na última segunda-feira com Haddad para discutir o tema. Na saída, Lupi disse que as ações tocadas pela pasta devem superar a meta prevista no Orçamento. O objetivo é tentar repetir o que o Ministério do Desenvolvimento Social fez com as revisões do Cadastro Único, que levaram a uma economia de mais de R$ 10 bilhões no Bolsa Família. (O Estado de S. Paulo/Bianca Lima, Mariana Carneiro e Anna Carolina)