Sobram carros nas montadoras, faltam compradores

O Estado de S. Paulo

 

Apesar das paradas de produção dos últimos dois meses, os estoques de veículos alcançaram o maior volume dos últimos três anos, exigindo novos ajustes das montadoras. Pelo menos 12 das 27 fábricas de carros e caminhões ativas no País já interromperam ou vão interromper ao menos parte da produção nos próximos dias na tentativa de impedir um excesso de oferta no mercado, algo que pressionaria para baixo os preços dos veículos.

 

O segmento começou o mês com quase 204 mil veículos em estoque – um represamento equivalente a 31 dias de vendas. Esse volume não era registrado desde abril de 2020, quando a pandemia paralisou as vendas e levou a um encalhe superior a 237 mil veículos.

 

Com a melhora no fornecimento de componentes eletrônicos, cuja escassez limitou a produção nos últimos dois anos, a indústria automotiva esperava retomar mais rapidamente os resultados de antes da pandemia. Porém, mesmo com a reação, puxada por entregas às locadoras, as vendas do primeiro trimestre, se comparadas com as de igual período dos últimos 17 anos, só ficaram acima do resultado de 2022, quando havia falta de peças.

 

Em um momento em que a indústria planeja aquecer a produção de carros de entrada com o apoio do governo, a falta de compradores, atribuída ao contexto de juros altos, desaceleração do emprego e endividamento das famílias, uma combinação que atinge os preços dos carros menos acessíveis, leva as montadoras a segurar o ritmo e discutir com os sindicatos como evitar demissões.

 

Lay-off

 

Nas maiores fabricantes de caminhões, a produção está sendo reduzida a um turno. Com a antecipação das compras, antes do aperto dos limites de emissões na virada do ano, o setor já aguardava uma redução da demanda, mas as encomendas dos caminhões menos poluentes, e mais caros, estão aquém do esperado.

 

Na quinta-feira, a fábrica de caminhões da Volkswagen em Resende (RJ) aprovou a suspensão de contratos de trabalho, o chamado layoff, por pelo menos três meses a partir de 2 de maio. O número ainda está em discussão, mas, conforme adianta o sindicato local, pode ficar entre 700 e 900 trabalhadores, o que deve representar a suspensão de um turno.

 

Segundo a Volkswagen Caminhões e Ônibus, a medida se tornou necessária diante das dificuldades do mercado tanto no Brasil quanto em alguns de seus principais destinos de exportação. A montadora segue os passos de concorrentes como Mercedes-Benz, que já anunciou a redução da produção para um turno a partir de maio, por dois ou três meses, assim como a Scania, que já opera em um turno. Já a Volvo vem adequando a produção de caminhões pesados e semipesados com redução do volume diário, mas segue em dois turnos.

 

Nas fábricas de carros, os ajustes, em geral, estão ocorrendo com interrupções de linhas. Entre elas, a Nissan vai nas próximas duas semanas suspender a produção em sua fábrica, também em Resende.

 

Em Taubaté (SP), a Volkswagen retoma hoje a produção do Polo Track, o sucessor do Gol, porém em apenas um turno, pois 900 trabalhadores tiveram as férias iniciadas em 27 de março prorrogadas por dez dias.

 

A Volks também voltou a parar ontem a fabricação do utilitário-esportivo T-Cross, no Paraná. A fábrica, que assim como a unidade em São Bernardo do Campo (SP) já tinha parado entre 22 de fevereiro e 3 de março, terá as atividades suspensas por mais 20 dias.

 

Além dessas montadoras, ajustes de produção foram realizados pela Stellantis nas fábricas de Goiana (PE) e Porto Real (RJ); General Motors, em São José dos Campos (SP); Hyundai; e Renault. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Laguna)