O Estado de S. Paulo
Após se reunir em Montevidéu com o presidente do Uruguai, Lacalle Pou, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acenou ontem com negociações para eventual acordo comercial do Mercosul com a China. Ele também prometeu destravar as conversas entre Mercosul e União Europeia – algo que o presidente brasileiro classificou como urgente – e se comprometeu a discutir uma renovação do Mercosul, uma demanda do país vizinho.
As declarações vêm num momento em que o Uruguai ameaça fechar acordo de livre-comércio com o governo chinês, o que colocaria em risco as bases do Mercosul – integrado ainda por Argentina e Paraguai.
“Disse a Lacalle e digo a meus ministros, vamos intensificar as discussões com a União Europeia e vamos firmar esse acordo para que a gente possa discutir apenas um possível acordo entre China e Mercosul. E eu acho que é possível”, declarou Lula. “Estamos completamente de acordo com as ideias de discutir a chamada inovação ou renovação do Mercosul. Primeiramente, queremos sentar com nossos técnicos, depois com nossos ministros e, finalmente, com os presidentes para que a gente possa renovar aquilo que for necessário renovar”.
Com um PIB que representa apenas 2,6% do total do Mercosul – a participação do Brasil é de 70% –, o Uruguai ameaça um dos principais pilares do bloco com o projeto de acordo unilateral com a China. A ideia é que as tarifas e cotas para importação entre os dois países sejam eliminadas. O entrave é que o Mercosul só permite que acordos do tipo sejam negociados em bloco, como vem acontecendo entre os países do grupo e a União Europeia.
O Mercosul adota, desde 1995, a Tarifa Externa Comum (TEC) para padronizar a alíquota de importação de produtos provenientes de fora do bloco. Os países têm direito a criar um número limitado de exceções, ou seja, itens que não são submetidos à tarifa. Um acordo entre Pequim e Montevidéu, no entanto, poria fim à TEC para produtos chineses no país vizinho, ameaçando parte do arcabouço legal do Mercosul. Como há livre comércio dentro do bloco (ainda que haja salvaguardas), itens vindos da China poderiam entrar no Uruguai sem serem taxados e, posteriormente, atravessar as fronteiras do país também sem que o pagamento da TEC fosse feito.
Antes de Lula, Lacalle Pou reiterou sua disposição de flexibilizar o Mercosul e de manter as negociações por um acordo comercial com a China. “O Uruguai vai avançar nas suas negociações com a China. O Brasil pode, paralelamente, fazer seu caminho e, após isso, vamos compartilhar tudo o que foi negociado. E o Uruguai pode se ajustar com aquilo que o Brasil propuser. O Brasil pode dizer o que conseguiu negociar com a China”, afirmou o presidente uruguaio. “Para resumir, o Mercosul que queremos precisa ser moderno, flexível e aberto ao mundo”. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Gayer, Luciana Dyniewicz e Sofia Aguiar)