2023 começa com otimismo para o mercado da eletromobilidade

O Estado de S. Paulo/Mobilidade

 

A Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) começou o ano de 2023 com comemoração em dose dupla. Em primeiro lugar, porque, em 2022, registrou crescimento de 41% nas vendas de veículos leves eletrificados, no Brasil, atingindo 49.245 unidades, sendo 8.460 emplacamentos dos totalmente elétricos.

 

O segundo motivo de confiança, de acordo com Adalber to Maluf, presidente da instituição, veio por meio de uma sinalização positiva do governo federal recém-empossado na formação de ministérios. O novo gabinete tem, claramente, como foco a busca por caminhos mais sustentáveis tanto para o desenvolvimento da indústria nacional quanto para o meio ambiente, em um nítido avanço em relação à gestão anterior.

 

Na entrevista a seguir, Maluf demonstra otimismo nas perspectivas de avanço da eletromobilidade, além de reforçar a importância da inovação na indústria. Confira.

 

Qual sua análise sobre o cenário da eletromobilidade no Brasil?

Adalberto Maluf: No final de 2022, celebramos as vendas de quase 50 mil veículos eletrificados no ano. E, com isso, os elétricos plug-in ultrapassaram, pela primeira vez, a participação de 1% do mercado nacional de veículos. Embora não haja nenhuma política pública, ainda assim crescemos.temos de comemorar, mas é importante levar em conta que, no mundo, a relação já chega a 15%. Essa evolução aconteceu de forma consistente e rápida. Por que não acreditar que, no Brasil, não será igual ao que ocorreu nos outros países?

 

Quais foram os fatores responsáveis pelo crescimento nas vendas de veículos elétricos no Brasil?

Maluf: O número de modelos avançou muito nos últimos anos. Foi de 70 para cerca de 130. Além disso, vimos uma questão muito forte com a agenda ESG. Inclusive, quem moveu o mercado foi o mundo corporativo. Chegamos a quase 1.000 comerciais leves e cerca de 650 caminhões. As empresas brasileiras estão se movimentando, apesar de não ter estímulo. As únicas políticas públicas que realmente avançaram no País foram as subnacionais, ou seja, as prefeituras e os Estados, que isentaram os eletrificados do rodízio (no caso de São Paulo) e de pagar IPVA, entre outros estímulos. Isso já foi o suficiente para dar o primeiro empurrão.

 

Em 2022, a ABVE encaminhou a Carta da Eletromobilidade aos então candidatos à Presidência da República. Houve algum retorno?

Maluf: Fizemos uma apresentação, ainda durante a campanha, a todos os que concorriam a presidente. Na ocasião, o então candidato Lula pediu ao senador Jean Paul Prates (PT-RN), um dos maiores especialistas em energia do Brasil e que, recentemente, foi nomeado presidente da Petrobras, que o representasse. Para mim, essa iniciativa foi um sinal bem interessante. Há pelo menos dez anos, todas as petroleiras globais diversificaram suas atividades e se tornaram empresas de energia.antes do segundo turno, tivemos uma reunião com Geraldo Alckmin, vice-presidente e ministro de Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, que fez várias anotações durante a apresentação. Depois, ele discursou com eloquência sobre o tema, o que me deixou otimista.

 

O que deve ser feito para o avanço da eletromobilidade no País?

Maluf: O Brasil tem índices de industrialização muito abaixo, em relação aos demais países do mundo. Somos um País com dimensão continental, no qual a indústria de transformação caiu de cerca de 35% do PIB, no começo dos anos 1980, para 10%, agora. Não existe país desenvolvido que tenha renunciado a investimento em transformação. O emprego do futuro será baseado em tecnologia, e não mais em habilidades manuais. Então, é preciso estar atrelado à indústria inovadora. Se não nos inserirmos nessas novas cadeias produtivas tecnológicas globais, corremos o risco de voltar a ser o Brasil colônia.

 

A Ford fechou as fábricas no País e, hoje, apenas importa. Recentemente, anunciou lucro de R$ 1 bilhão na América do Sul. É possível que outras montadoras façam o mesmo?

Maluf: Sim. Estamos falando de uma mudança no mundo automotivo global. A Ford fechou porque tinha uma fábrica antiga e produzia automóveis que, embora fossem bem vendidos, eram plataformas de veículos a combustão, modelos antigos. A matriz da Ford deve ter dito: estamos atrasados, perdemos a corrida tecnológica, vamos voltar às origens e para onde há estímulo. Onde tem estímulo? Argentina, por exemplo. O fechamento dessas fábricas deveria ter dado um sinal muito ruim para o País.

 

Por quê?

Maluf: O Brasil corre um risco muito grande. Faz sentido a Audi, a Land Rover ou mesmo avolkswagen manterem uma produção, aqui, se os produtos não estiverem inseridos em uma escala global? Não faz. Quando a gente vê esses pequenos números de elétricos no Brasil, por exemplo, entende que ainda tem muito a crescer, mas já permitem que as fábricas comecem a se coordenar. Em toda inteligência digital é onde será criada a maior parte dos empregos. Por isso, ficamos muito felizes quando Alckmin anunciou a Secretaria de Economia Verde, que deve explorar temas como energias renováveis e mobilidade.

 

Muito se discute sobre as rotas para a descarbonização, e o Brasil tem forte apelo com etanol. É possível ter caminhos diferentes da eletrificação?

Maluf: Não há solução única para o mundo inteiro. Porém, estamos falando de um bem que é facilmente reposto por outro de produção global. Ou seja, se não produzirmos o que o mundo consome, ficaremos de fora do mercado. Hoje, dentre as rotas tecnológicas, foi a elétrica a bateria que venceu. A Europa definiu que, até 2035, já não serão mais vendidos carros a combustão. Em 2030, os Estados Unidos deverão ter, pelo menos, 50% do mercado eletrificado. temos cerca de 3% do mercado global, que está muito mais imbuído de tecnologia; não faz sentido o Brasil seguir outro caminho. (O Estado de S. Paulo/Mobilidade/Ju Cabrini)