Salvar a indústria é fazer escolhas

O Estado de S. Paulo

 

Ao tomar posse como ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, anunciou que teria como prioridade as negociações de novos acordos comerciais, destinados a criar acesso aos mercados externos do produto industrial do Brasil.

 

A direção está correta, mas, depois de tanta vacilação dos governos anteriores, os obstáculos ficaram enormes. E, mais do que tudo, a definição de uma política industrial deve preceder um novo esforço de abertura comercial no exterior. Mas isso precisa ser mais bem explicado.

 

Ano após ano, a indústria de transformação do Brasil vai sendo desidratada. Há 30 anos, correspondia a 29% do PIB; hoje, não passa dos 12%.

 

Desde os anos 50, os empresários argumentavam que a indústria precisava de proteção. Obtiveram favores fiscais, barreiras alfandegárias que mantinham a concorrência externa longe dos portos internos, reservas de mercado, créditos a juros favorecidos colocados à disposição pelo BNDES e tantas coisas mais.

 

Desde a década de 70, os dirigentes da indústria repetiam que era preciso garantir mais câmbio (moeda nacional mais desvalorizada em relação ao dólar), para dar competitividade à indústria nacional, e juros mais baixos, de modo a reduzir os custos do crédito. E, no entanto, mesmo enquanto o dólar manteve-se caro e o juro baixo, a indústria não se recuperou. E, claro, tem o altíssimo custo Brasil: impostos altos demais, infraestrutura sucateada, inexistente ou cara demais, excesso de burocracia e por aí vai.

 

Embora tenham de enfrentar essas adversidades, outros setores seguem em franca prosperidade, como acontece com as áreas da mineração e do agronegócio. A diferença é que contam com forte mercado externo, o que mais falta à indústria.

 

Desde a década de 80, o Brasil e todo o Mercosul perderam a oportunidade de batalhar por novos acordos comerciais que abririam mercados para a indústria. Preferiram se fechar como ostras, para se proteger da concorrência externa. Agora, ficou tudo mais difícil porque Estados Unidos, Europa e Japão adotaram políticas protecionistas, em defesa de sua própria indústria.

 

De todo modo, é preciso fazer escolhas. Uma indústria automobilística baseada na queima de combustíveis fósseis, por exemplo, terá um mercado externo restrito. Não há como competir lá fora com produtos dotados de baixa tecnologia. Em compensação, mil portas podem-se abrir para industrializados que contam com mais vantagens comparativas.

 

Alguns exemplos: produção de hidrogênio verde, indústria eletrointensiva baseada em energia limpa, processamento de proteína animal e vegetal, papel e celulose e enriquecimento de minérios.

 

Fazer escolhas implica tirar do foco indústrias de baixa competitividade. É isso que o governo Lula tem de fazer. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming celso)