Cadê a política industrial?

O Estado de S. Paulo

 

Já sabemos que o futuro vice-presidente, Geraldo Alckmin, também vai ser o ministro que vai comandar o desenvolvimento da indústria, mas não sabemos qual será a política industrial.

 

O PT não sabe o que quer. O relatório final do governo de transição é vago quando trata sobre a indústria. Fala em reverter o processo de desindustrialização, explorar investimentos em ações coordenadas entre os setores público-privado, “promover o engajamento da indústria na transição tecnológica” para uma economia verde e limpa e mais competitiva no mercado externo, porém são palavras vazias porque não estão acompanhadas de ações concretas.

 

Zona Franca de Manaus sente alta de investimentos em abertura de novas unidades ou em expansão de projetos já existentes; conceito de cadeias globais de fornecimento foi posto à prova pela pandemia e pela guerra entre Rússia e Ucrânia

 

A indústria brasileira é excessivamente protegida, conta com as tarifas alfandegárias que estão entre as seis mais elevadas do planeta, com mecanismos de reserva de mercado interno, com subsídios e renúncias tributárias e tem à sua disposição um bancão de desenvolvimento, o BNDES, que poucos países têm. E, no entanto, a indústria de transformação vai se desidratando a cada ano.

 

A velha desculpa de que enfrenta excessivo custo Brasil, infraestrutura sucateada ou não existente, câmbio baixo demais e juros altos não explica sua baixa competitividade. Outros setores que dependem até mais da infraestrutura, do câmbio mais desvalorizado e do juro alto, como o agronegócio, vão muito bem, porque têm mercado externo.

 

As “diretrizes” do PT ainda sugerem que o governo Lula adote o investimento público e a redução do custo do crédito para fortalecer a indústria nacional. E, no entanto, não há investimento público quando o Tesouro está espremido como bagaço de laranja e quando os juros estão lá em cima, porque têm de combater a inflação produzida pela deterioração das contas públicas.

 

A ideia de derrubar a Taxa de Longo Prazo (TLP) cobrada pelo BNDES exigiria suprimentos de capitais (funding) abundantes e também mais baratos, que não estão disponíveis por aí, ou ainda mais subsídios, que o Tesouro não pode proporcionar.

 

Sim, é preciso acordos comerciais, para abrir mercado externo para o produto industrial. No entanto, sem abrir mão do protecionismo não há como avançar em acordos comerciais. As exportações da indústria de veículos, por exemplo, estão travadas até mesmo para a Argentina. Sem desenvolvimento de modelos elétricos, será difícil obter mercado lá fora, que enfrenta prazos cada vez mais rígidos de proibição das vendas de veículos movidos a combustíveis fósseis.

 

O Brasil não tem problemas geopolíticos, é grande exportador de commodities – o que hoje é vantagem –, mas tem contra a indústria a questão fiscal mal resolvida (ou não resolvida), o desrespeito das regras do jogo e falta de estratégia. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming)