Rombo fiscal volta a ameaçar Estados após redução do ICMS

O Estado de S. Paulo

 

A “lua de mel” dos governadores que assumem em janeiro deve ser mais curta do que de costume. Isso porque eles chegam com o desafio de equilibrar caixas esvaziados pela redução da alíquota do ICMS, principal tributo arrecadatório dos Estados. Lei sancionada em julho por Jair Bolsonaro impôs limite entre 17% e 18% para a cobrança da alíquota – antes disso, ela podia superar 30%. Levantamento da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado mostra que a arrecadação com o imposto no terceiro trimestre deste ano caiu 6,5%, na comparação com o mesmo período de 2021. Uma reestruturação fiscal nas contas estaduais já é dada como certa para 2023, e o custo do ajuste deve chegar a R$ 70 bilhões. Estados já falam em rever investimentos, caso do Rio Grande do Sul, que perdeu R$ 2 bilhões.

 

Novos governadores assumem com o desafio de reduzir gastos e equilibrar Orçamento, esvaziado pela redução de alíquotas do ICMS; Itaú estima ajuste em até R$ 70 bilhões

 

Sem um ajuste fiscal no próximo mandato, as contas dos Estados correm o risco de voltar para o vermelho. Os governadores reeleitos e os novos que tomam posse em 1.º de janeiro vão assumir com uma incerteza grande em relação ao desempenho da arrecadação, sobretudo depois da lei que estipulou um teto para a cobrança do ICMS sobre itens considerados essenciais, como telecomunicação, combustível e energia elétrica.

 

O ICMS é o principal tributo dos Estados. Em julho, uma lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro impôs um limite entre 17% e 18% para a cobrança da alíquota – antes, chegava a superar 30%, dependendo do Estado e produto. Governadores questionam a medida e trabalham por uma compensação no caso de queda na receita. Um grupo criado no Supremo Tribunal Federal (STF) tenta um acordo sobre o tema, mas ainda não houve avanços. Segundo o Comitê Nacional de Secretários da Fazenda dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz), a perda pode chegar a R$ 125 bilhões em 12 meses.

 

Em 2023, uma reestruturação fiscal nas contas estaduais, com corte de gastos, já é dada como certa. Nas projeções do Itaú, o custo do ajuste deve chegar a R$ 70 bilhões, para que o resultado primário (aquele que não leva em conta o pagamento de juros) dos Estados fique em 0% do Produto Interno Bruto (PIB). Se nada for feito, os Estados podem ter um déficit de 0,7%. Em 2022, a previsão é de um superávit de 0,5%.

 

“Os Estados vão perder receita pelo desempenho das commodities, pela desaceleração do crescimento econômico, pela lei do ICMS”, diz Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco. “Com certeza, alguns Estados vão sofrer mais do que outros.”

 

O futuro das finanças estaduais preocupa porque, não faz muito tempo, boa parte dos Estados enfrentou uma crise fiscal severa. Salários de servidores foram atrasados, pagamentos de fornecedores, suspensos, e obras deixaram de ser concluídas. Serviços públicos também foram afetados.

 

“É possível que no início de mandato, chamado de ‘lua de mel’, haja uma tentativa por parte dos governos estaduais de recompor a sua receita de ICMS, seja por meio de novos tributos ou pela revisão de regimes especiais”, afirma Juliana Damasceno, economista da consultoria Tendências.

 

Um levantamento da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado mostra que a arrecadação com o tributo somou R$ 174,061 bilhões no terceiro trimestre deste ano, uma queda de 6,5% na comparação com o mesmo período do ano passado. “Não é uma situação dramática como a gente observou na última eleição, com vários Estados com dificuldade de pagamento, mas é um cenário que traz uma preocupação se nada for feito”, diz Vilma Pinto, diretora da IFI. (O Estado de S. Paulo/Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira)