O Estado de S. Paulo
A redução dos problemas globais com a falta de semicondutores, com números cada vez menores de fábricas paralisando a produção, inclusive no Brasil, não significa que o problema está perto do fim. Setor mais afetado pela escassez do componente desde o fim de 2020, a indústria automobilística continuará enfrentando dificuldades por mais dois a três anos.
Paralelamente, as montadoras buscam alternativas para driblar a crise de abastecimento, fazendo acordos com as fabricantes de chips ou até mesmo avaliando produção própria, em parceria com as empresas do setor.
O desequilíbrio entre oferta e demanda de chips daqui para a frente não será tão crônico e generalizado como ocorreu no ano passado, quando 10,6 milhões de veículos deixaram de ser produzidos em todo o mundo. A previsão para este ano da consultoria Auto Forecast Solutions (AFS) é de uma perda de 4,3 milhões de unidades, e a tendência é de novas reduções.
No Brasil, a perda foi de 378 mil veículos em 2021 e de 182 mil neste ano (até agora). O País importa a totalidade de semicondutores, pois abriga apenas algumas empresas de montagem final. Há alguns meses, montadoras e outros segmentos passaram a defender, junto ao governo federal, um plano para atrair fabricantes de chips ao País.
Uma Medida Provisória já assinada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, com incentivos à produção local, deve ser enviado ao presidente Jair Bolsonaro, e está na lista dos temas a serem discutidos com a equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que assumirá em 1.º de janeiro (leia mais ao lado).
Mais chip no carro
A manutenção do choque de demanda por mais dois a três anos é corroborada por estudos de várias consultorias internacionais. O mais recente deles, feito pelo Boston Consulting Group (BCG), aponta como uma das justificativas o aumento da demanda por chips automotivos.
Hoje, a participação do setor automotivo nas vendas mundiais de semicondutores é de 8%, e deverá aumentar para 11% em 2026, enquanto outros segmentos, como smartphones e PCS, devem reduzir suas fatias (ver quadro). O mercado total atualmente é de cerca de US$ 670 bilhões e deve chegar a US$ 1 trilhão em 2030.
Mesmo com a inauguração de 29 novas fábricas de chips a partir deste ano e a desaceleração global das vendas de automóveis, ainda faltará produtos no mercado.
“Os novos automóveis terão, em média, o dobro de semicondutores que os modelos atuais por causa da introdução de novas tecnologias de segurança, conectividade e, em especial, pela eletrificação”, afirma Masao Ukon, diretor de Automotive & Mobility do BCG.
De acordo com o estudo da consultoria internacional, concluído em outubro, em 2021 cada automóvel continha o equivalente a US$ 640 em chips, valor que este ano está em US$ 710. Em 2030 chegará a US$ 1.170, prevê o BCG.
“O conteúdo embarcado nos automóveis vai aumentar muito, principalmente em mercados como China, Europa e Estados Unidos, onde haverá maior participação de veículos elétricos”, diz Ukon.
Segundo ele, os chips se tornaram cruciais para os novos veículos e seu uso maior vai continuar causando desequilíbrio entre oferta e demanda pelo menos nos próximos dois a três anos, mas a falta será focada nos componentes usados em tecnologias mais avançadas.
Mesmo no Brasil, onde a eletrificação está um passo atrás em relação a outros países, a demanda por semicondutores vai crescer, pois os carros locais também estão cada vez mais sofisticados. Uma vantagem é que talvez o País precisará de alguns tipos de chips que vão sobrar lá fora, como os usados nos modelos a combustão.
Geopolítica
A dependência de fabricantes da Ásia, como China e Taiwan, também vai continuar, ainda que EUA e Europa aumentem a produção com os bilionários investimentos que vêm fazendo. Hoje, metade da produção global de semicondutores é feita na China Continental (33%) e em Taiwan (16%). Das 29 novas fábricas anunciadas, 16 são nessas duas regiões.
Lições pós-covid
O diretor do BCG destaca que a crise dos chips, que foi induzida pela pandemia de covid, trouxe lições importantes sobre como as montadoras gerenciam suas cadeias de suprimento, antes baseadas no just-in-time.
O sistema de manter estoques baixos e adquirir componentes e matéria-prima de acordo com a necessidade significava grande economia de custos, mas deu certo enquanto as cadeias globais de suprimento funcionavam.
Com o lockdown e paradas de produção em quase todos os países, especialmente na China, onde o vírus da covid surgiu, somado a eventos extraordinários – como seca em Taiwan e Malásia (água é essencial na produção de chips), incêndio em uma fábrica no Japão, fortes nevascas no Alasca (onde estão várias fábricas americanas), bloqueio do Canal de Suez e falta de navios e contêineres para transporte –, ficou claro que mudanças de estratégia são necessárias.
“Muita coisa tem evoluído no setor, com várias ações adotadas pelas empresas”, ressalta Ukon. Elas estão buscando se posicionar, se proteger e participar de forma mais ativa da cadeia produtiva e não ficar apenas dependendo de fornecimento ‘spot’ (operações concretizadas na hora).
Desde meados de 2021 ocorreram vários anúncios de parcerias, cooperação com fabricantes de semicondutores ou desenvolvimento de tecnologia própria, tentando um engajamento mais ativo na cadeia produtiva, com acordos diretos com fornecedores, buscando também diversificar a dependência de uma região, de um fornecedor, afirma Ukon.
A BMW assinou, há um ano, contrato de garantia de fornecimento direto com o desenvolvedor de microchips de alta tecnologia Inova Semiconductors e com a fabricante de semicondutores Globalfoundries (GF). Andreas Wendt, responsável pela Rede de Compras e Fornecedores da BMW global, disse que “o acordo pioneiro marca o próximo passo lógico para garantir suprimentos de maneira mais proativa”.
Parcerias
A americana General Motors fez acordo estratégico com a fabricante de chip Wolfspeed em outubro de 2021, que desenvolverá soluções de dispositivos para os futuros veículos elétricos da montadora.
Um mês depois, a GM também informou que está trabalhando com sete fornecedores de chips em três novas famílias de microcontroladores que reduzirão o número de chips exclusivos em 95% dos novos veículos da marca. Entre as parceiras estão Qualcomm, Renesas e Infineon.
Em junho do ano passado, a francesa Renault e a Stmicroelectronics anunciaram cooperação na concepção, desenvolvimento, produção e fornecimento de sistemas para conjuntos eletrônicos usados em veículos à bateria e híbridos.
“Esta parceria garante o futuro abastecimento de componentes chave e vai nos ajudar a concretizar nossa ambição de democratizar os veículos elétricos, para que sejam acessíveis e rentáveis”, disse o CEO da Renault, Luca de Meo.
A fabricante de peças automotivas Denso, pertencente à japonesa Toyota, se juntou em fevereiro ao projeto da Taiwan Semiconductor Manufacturing Co. (TMSC) de construção de sua primeira fábrica de chips no Japão. O grupo já tinha parceria com a Sony e receberá US$ 350 milhões em investimentos da Denso.
Também há parcerias e acordos estratégicos entre a Ford e a GF, BMW e Mercedes-Benz com a Qualcomm e a Nvidia, Volkswagen com a ST Microeletronics e a TSMC, e Stellantis com a Foxconn e a Waymoara.
Já a Tesla (em parceria com a TSMC e a Samsung), a Hyundai e a BYD, com divisões próprias, pretendem produzir seus semicondutores.
Pandemia
Além dos carros, chips são usados em computadores, eletroeletrônicos, maquinários, em sistemas de IA (inteligência artificial), na tecnologia 5G, entre outros.
A crise de desabastecimento começou no fim de 2020, quando fábricas no mundo inteiro suspenderam a produção para evitar aumento de contaminações.
Nesse período, ocorreu um boom de consumo de PCS, celulares e até eletrodomésticos pela população que ficou trancada em casa.
A volta das atividades de vários setores, como o de carros, ocorreu em ritmo mais acelerado do que se esperava. As fábricas de chip não deram conta da demanda que já vinha crescendo antes da covid. E seguem sem dar conta. •
O projeto Luz, que prevê a integração dos principais museus no bairro (Pinacoteca, Museu de Arte Sacra, Museu da Língua Portuguesa), continua sendo uma ideia, mas um passo para essa definitiva integração será dado no dia 25 de janeiro de 2023, quando a Pinacoteca do Estado inaugura seu terceiro edifício além da sede original (Pina Luz) e da Pina Estação: a Pinacoteca Contemporânea. Pelo menos lá a integração vai sair do papel: o novo museu será totalmente aberto para o Parque da Luz e já começa com duas grandes mostras, uma coletiva com obras do acervo do museu (na Grande Galeria) e uma individual da artista coreana Haegue Yang.
Além de Haegue Yang, a Pinacoteca divulgou sua programação para o próximo ano, revelando que vai abrir uma mostra panorâmica da artista Maria Leontina (1917-1984) nas galerias temporárias da Pina Luz. Não era sem tempo. Eclipsada pelo marido Milton Dacosta (1915-1988), também pintor, a paulistana Maria Leontina passou grande parte de sua vida no Rio, onde frequentou o ateliê do escultor Bruno Giorgi, após aprender pintura com Waldemar da Costa em São Paulo. Ao contrário do marido, não fez concessões estilísticas: foi uma grande pintora de tendência construtiva (nos anos 1950/60) e orientou, ao lado de Dacosta, um ateliê de pintura para doentes mentais no Hospital Psiquiátrico do Juqueri.
Híbrida
O novo espaço da Pinacoteca “complementa os outros dois edifícios do museu por meio de uma arquitetura permeável e acolhedora, e reflete o espírito de integração social dos programas desenvolvidos pelo museu”, reflete Jochen Volz, diretor-geral da Pinacoteca, que, no próximo ano, optou por uma programação híbrida que contempla modernos e contemporâneos brasileiros, a arte indígena e a asiática, representada por Haegue Yang, primeira sul-coreana a expor na Pinacoteca.
Ela vai montar uma grande instalação composta de esculturas feitas com persianas industriais que pendem do teto, como móbiles, combinadas a outras obras tridimensionais instaladas sobre o piso. Aos 51 anos, formada em Seul, suas instalações combinam múltiplas ferramentas (eletrônicas, inclusive) para provocar uma sensação de estranhamento no espectador. Dividindo seu tempo entre a Coreia do Sul e a Alemanha, Haegue Yang adota o nomadismo como tema frequente em sua obra.
Entre os brasileiros, a Pinacoteca selecionou alguns dos artistas disputados pelo circuito para suas mostras em 2023. Já em março, a Pina Luz recebe a maior exposição individual do artista indígena Chico da Silva (1910-1985), reunindo obras (muitas inéditas) de coleções públicas e particulares em um recorte que vai de 1943 a 1984. Outro artista indígena contemplado é Denilson Baniwa, que mostra novo trabalho no Octógono, espaço do museu para projetos site-specific.
Mulheres
Na Pina Estação, o ano é das mulheres. Revisitando obras de artistas brasileiros em exposições monográficas, a Pina Estação vai promover uma exposição sobre a carreira de Elisa Bracher, em abril. Ainda no primeiro semestre, no mesmo local, mas no segundo andar, Regina Parra vai ocupar o prédio ao lado da Sala São Paulo.
Voltando ao museu vizinho, a Pina Luz abre no segundo semestre uma retrospectiva da artista argentina Marta Minujín com projetos imersivos em que combina cor, som e movimento. A retrospectiva comemora os 80 anos da artista conceitual que herdou da escola pop o gosto por um cromatismo forte e lisérgico. No fim da ditadura argentina, Marta criou sua obra mais forte, El Partenón de Libros, reprodução do edifício grego que virou símbolo da democracia.
Na Pina Contemporânea estão previstas exposições do brasileiro Antonio Obá (em junho) e da chinesa Cao Fei (em setembro). No final de 2023, Alex Cerveny ocupa o segundo andar da Pina Estação com 23 desenhos e gravuras do acervo da Pinacoteca, apresentados pela primeira vez em conjunto. No quarto andar do mesmo edifício, será realizada uma retrospectiva dos 30 anos de trabalho do artista carioca Jarbas Lopes. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)