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Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), Ministério da Economia (ME) e montadoras associadas à Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) podem ser responsabilizados por danos ambientais causados por veículos que serão colocados em circulação no país nos próximos meses.
Na semana passada, procuradores regionais do Ministério Público Federal (MPF) denunciaram ilegalidade em ação do Ibama que prorrogou a validade de licenças para veículos fora dos novos limites de emissões do Proconve (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores).
Atendendo a pedidos da indústria automobilística – que há pelo menos dois anos tenta mudar o calendário do programa -, o Ibama publicou, no dia 30 de dezembro do ano passado, uma Instrução Normativa prorrogando em três meses o prazo da adequação de veículos leves de passageiros e comerciais à tecnologia Proconve L7.
Pela Resolução 492 de 2018 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a data-limite para as montadoras se adequarem era 31 de dezembro de 2021;
Agora, terão até 31 de março de 2022 para produzir e importar veículos L6, e até 30 de junho para comercializar;
A nova fase do Proconve estabelece limites de emissão mais rigorosos em comparação à fase L6, adotada até então.
“Na prática permitiu-se que carros não adequados aos novos padrões fossem produzidos e vendidos até junho de 2022, quando o limite era março”, comenta o advogado Hélio Wicher Neto, consultor do Instituto Saúde e Sustentabilidade.
A representação do MPF pede que a norma do Ibama seja anulada, e que os carros vendidos sejam mapeados para contabilizar os danos ao meio ambiente, com posterior cobrança dos responsáveis – no caso, Ibama, União Federal (já que o pedido formal de prorrogação veio da Economia) e fabricantes de veículos.
Segundo o advogado, a ação do MPF é uma forma também de pressionar as montadoras e evitar que um movimento semelhante aconteça no final deste ano, quando está prevista a mudança de fase para os veículos pesados – de P7 para P8.
“Três meses pode parecer pouco, mas esses carros vão ficar em circulação por cerca de 30 anos, com motores que deveriam estar limpos e que continuam com o modelo antigo, ou seja, mais poluentes”, completa.
Montadoras poderiam ter se antecipado, diz procurador
Depois de tentativas no Ministério do Meio Ambiente e no próprio MPF, as montadoras recorreram à Economia para prorrogação do chamado período de passagem, alegando “motivo de força maior decorrente da desestabilização das cadeias de fornecimento de componentes para o setor automotivo brasileiro” provocada pela pandemia de covid-19.
O MPF, no entanto, entende que “tal situação nunca constituiu um obstáculo intransponível” ou “motivo de força maior”.
Além disso, as montadoras não teriam comprovado a relação da falta de componentes com o sistema de emissões dos motores, nem a extensão, para cada fabricante, do impacto na produção.
“A informação segundo a qual os estoques de veículos L6 não finalizados até o final de 2021 chegariam a cerca de 20 mil unidades, conforme divulgou na mídia a Anfavea – e que foi aceita, sem qualquer questionamento, pelo Ministério da Economia e pelo Ibama (…) não discrimina, por exemplo, qual a parcela desse total de veículos que se atribui a cada uma das fabricantes”, destaca o documento.
Para o procurador José Leonidas Bellem de Lima, um dos autores da representação e coordenador do Grupo de Trabalho Qualidade do Ar (4CCR/MPF), as fabricantes poderiam ter ajustado seu fluxo de produção, já que a falta de insumos se arrastava desde o primeiro semestre de 2021.
“Ao invés de ter esses 20 mil carros na fase antiga, eles poderiam ter 20 mil carros na fase nova”, disse à epbr.
Desvio de finalidade
A representação agora está na primeira instância e pode ser transformada em um inquérito ou uma ação civil pública.
“A questão jurídica vai além do dano à saúde e ao meio ambiente. Há também uma série de erros cometidos pelo Ibama. Por exemplo, a falta de competência para aumentar o prazo e o desvio de finalidade, uma vez que a atribuição do Ibama é fazer medidas complementares, mas em consonância com o calendário estabelecido pelo Conama”, explica Lima.
O procurador afirma que apenas o Conama poderia alterar o calendário, e mesmo assim, não deveria, por ser um retrocesso ambiental.
“Celeridade incomum”
A publicação da instrução do Ibama ocorreu dois dias antes da data prevista para a entrada em vigor da nova etapa para veículos leves.
O MPF aponta que a celeridade incomum na tramitação dentro do Ibama – 30 horas entre o encaminhamento do pedido do ME e a edição da instrução normativa – não foi um “senso de urgência”, mas uma ação premeditada.
“A tramitação a jato – incluindo a elaboração de duas notas técnicas e um parecer jurídico em questão de poucas horas – sugere muito mais o caráter premeditado e previamente ajustado dos atos ali encadeados, todos eles praticados somente para conferir à medida final (a edição Instrução Normativa nº 23/2021) uma aparência de fundamentação e procedimentalidade”.
Procurada, a Anfavea disse, via assessoria de imprensa, não ter comentários sobre a manifestação do MPF.
Em nota, a associação do setor automotivo garante que todas as montadoras já produzem veículos L7 desde o final do ano passado e que não houve adiamento do Proconve.
“Desde o dia 1º de janeiro, só podem ser produzidos automóveis e comerciais leves que se enquadrem na regra L7, exceção feita a algumas unidades L6 que terminaram o ano incompletas por falta de determinados componentes eletrônicos. As autoridades competentes têm uma lista de unidades por montadora nessa condição, e só elas poderão ser completadas até o final de março (não julho)”.
Diz ainda que não há possibilidade de pedir mais prazo além desses três meses.
Sobre uma eventual postergação da fase P8, a Anfavea afirma que “a mudança de regra para pesados é só no ano que vem, e provavelmente essa crise global dos semicondutores estará praticamente solucionada até lá”.
O Ministério da Economia respondeu que a solicitação de comentários deveria ser encaminhada à Conjur do Ministério do Meio Ambiente (MMA). MMA e Ibama não responderam até o fechamento desta edição. (Portal EPBR/Nayara Machado)