Sem peças importadas, indústria busca produção local, mas esbarra em custo

O Estado de S. Paulo

 

Com a falta de produtos importados, especialmente os da Ásia, a indústria brasileira viu a necessidade de nacionalizar parte dos itens que vêm de fora. Esse movimento, porém, encontra obstáculos num ambiente de incertezas econômicas e políticas e pelo fato de que produzir no Brasil é mais caro. Empresários cobram menos impostos e burocracia. O País perde importância na cadeia de produção global.

 

Fábricas

 

Preocupadas com o desabastecimento de componentes importados, como chips para carros, empresas procuram governo para a criação de uma política que reduza a dependência de produtos essenciais vindos do exterior, mas fabricantes hesitam em investir

 

A falta generalizada de produtos importados especialmente da Ásia levou a indústria brasileira ao consenso da necessidade de nacionalizar parte dos itens que vêm de fora. No entanto, esse movimento, que resultaria em desenvolvimento de tecnologias locais e empregos, encontra dificuldades em se concretizar em razão do cenário de incertezas econômicas e políticas e do fato de que produzir no Brasil é mais caro do que em vários outros países.

 

A escassez de produtos como máscaras e respiradores, que marcou o início da pandemia, depois se estendeu a semicondutores, insumos e autopeças e se agravou com o aumento dos preços desses itens e do frete, além da indisponibilidade de contêineres e de navios para entregas.

 

Desde 2020, várias associações de classe criaram grupos envolvendo as cadeias produtivas e o governo para avaliar a criação de uma política de nacionalização de produtos essenciais ao País. Entre elas estão as indústrias automotiva, química, calçados e da construção. Ainda não há ações concretas, mas algumas iniciativas individuais para escapar da dependência de poucos fornecedores externos.

 

Entre elas está a da Thermoval, fabricante de válvulas para as áreas agrícola, automotiva, de energia, saneamento, mineração e alimentos e bebidas, entre outras. O diretor-geral, Rodolfo Garcia, diz que o aumento do custo do frete e do tempo de entrega levou o grupo a desistir de importar peças da China.

 

“Antes o prazo máximo de entrega era de 90 dias e agora chega a 270 dias para alguns itens.” Garcia fez parceria com uma empresa brasileira para a produção de 20% dos itens forjados e importa o restante. Em 2022, a empresa terá uma linha própria para o processo e fará 100% das peças em Cravinhos (SP), onde está sua sede.

 

O pesquisador associado do FGV/Ibre, Livio Ribeiro, afirma que houve um repique de substituição de produtos importados no fim de 2020 e início deste ano, mas não teve vida longa. “O Brasil é pouco competitivo para produzir qualquer coisa, e me parece pouco provável, com a estrutura de riscos que temos, que se retome um processo sustentado de nacionalização.”

 

Ribeiro lembra que a indústria vem há muito tempo num processo de redução de tamanho porque a produtividade no Brasil é baixa, o custo de acessórios é alto, o imposto é elevado e o sistema tributário é complexo. E tem agora a crise hídrica.

 

Marcelo Azevedo, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), pondera que, apesar da reversão de expectativas de crescimento da economia, a intenção de investimento por parte da indústria está alta desde o início da pandemia. “Há muitas coisas atrapalhando essa intenção. A pandemia está trazendo incertezas para investimentos, seja por conta do cenário ou do câmbio”, diz. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)