O Estado de S. Paulo
Pé na estrada. Companhia alemã, que tem valor de mercado de mais de US$ 3 bilhões, vai investir cerca de R$ 500 milhões em sua operação de intermediação de viagens rodoviárias no Brasil; para especialistas, novo concorrente deve provocar guerra de preços no setor
As estradas brasileiras estão prestes a receber mais um competidor no ramo de ônibus interestaduais. O unicórnio alemão Flixbus, que é uma espécie de Uber dos ônibus, está pronto para iniciar a operação no País, esperando apenas a liberação de órgãos reguladores, como a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Concorrente direta da brasileira Buser, a empresa separou US$ 100 milhões (cerca de R$ 507 milhões no câmbio atual) para investimentos por aqui.
“O Brasil é um dos maiores mercados do mundo e estamos à espera apenas de licenças, pois em todos os lugares do mundo operamos de maneira regular”, diz Edson Lopes, diretor-geral da Flixbus no País.
Estima-se que o mercado brasileiro de viagens interestaduais por via rodoviária seja próximo de 50 milhões de operações por ano. Em 2020, por causa da pandemia, o número caiu 54%, mas neste ano já há uma recuperação. Lopes calcula que também com as viagens intermunicipais, o mercado é de 80 milhões de viagens por ano.
Por isso, no longo prazo, ele acredita que é possível que a Flixbus se torne líder de mercado e com uma fatia acima de 10 milhões de passageiros. Para que esse número seja possível, a startup vai entrar no País com promoções agressivas, como aconteceu em outros mercados em que ela estreou. Recentemente, a companhia estreou no Reino Unido com viagens por menos de ¤ 1.
Além de viagens mais baratas, a companhia vai apostar em um segmento premium, com ônibus mais confortáveis e com possibilidade de oferecer mais viagens em ônibus com acomodações leito e semileito. Para isso, a companhia tem feito parceria com montadoras e empresas financeiras para oferecer financiamentos para interessados.
“Isso está em discussão e queremos utilizar a nossa escala e marca para facilitar as operações”, afirma Lopes.
A companhia também está em negociação para ocupar espaços em terminais rodoviários e quer ter também guichês para vendas físicas de passagem para democratizar o acesso. Os ônibus da Flixbus, apesar de serem de propriedade de terceiros, serão inteiramente adesivados com a logomarca da empresa para potencializar a estratégia de marketing.
Concorrência
Rival da Flixbus já em operação, a Buser inaugurou esse mercado em 2016 e de lá para cá amealhou mais de 1 milhão de passageiros, mas também sofreu com processos na Justiça por falta de regulação específica. É por isso que a Flixbus decidiu esperar a liberação desse tipo de serviço pela ANTT.
Assim como a Uber quando começou a operar no Brasil, a companhia mexeu em um mercado regulado e diversas empresas do setor reprovaram a entrada de uma concorrente que sequer tinha um ônibus e, segundo eles, não cumpria as normas estabelecidas pela ANTT. A Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati), por exemplo, moveu ações para barrar o funcionamento da Buser, mas desistiu delas em abril de 2021.
O mercado avalia que esse tipo de serviço vai ser uma realidade em breve. Em junho, a Buser recebeu aportes de R$ 700 milhões e afirmou que queria crescer dez vezes em dois anos com mais de R$ 1 bilhão em investimentos.
A Flixbus vai entrar em um mercado que já está mais acostumado com esse tipo de serviço. E vem com bastante dinheiro por trás. Os US$ 100 milhões que serão investidos por aqui virão de um aporte de US$ 650 milhões recebidos no mês passado. Agora, a companhia tem um valor de mercado de US$ 3 bilhões.
Para Renato Mendes, sócio da F5 Business Growth, especializada em inovação, a entrada da Flixbus pode representar uma guerra de preços. Ele compara o negócio exatamente com os aplicativos de transporte, onde houve diversos entrantes e poucos sobreviventes, como Uber e 99. “Vai ter uma grande perda de rentabilidade do setor e virará uma briga de cachorro grande. Para as empresas se manterem competitivas, terão de investir muito dinheiro”, afirma. (O Estado de S. Paulo/André Jankavski)