O Estado de S. Paulo/Notas&Informações
Com mais lojas abertas e o consumidor menos recluso, as vendas do comércio varejista ganharam impulso e cresceram por dois meses consecutivos: 4,9% em abril e 1,4% em maio. Em março, haviam despencado 3%, depois de um desempenho oscilante e inseguro nos quatro meses anteriores. Com o último resultado, o volume de vendas superou por 3,9% o patamar pré-pandemia, mas ficou 1,3% abaixo do recorde alcançado em outubro. O varejo saiu do buraco onde havia afundado no começo da crise de saúde. Os números podem ser mais impressionantes quando a base de comparação é o pior período, com aumento de 16% em relação ao dado de maio de 2020 e de 6,8% na comparação dos números de janeiro-maio deste ano e do ano passado.
O balanço continua positivo quando se acrescentam dois segmentos, o de veículos e componentes e o de materiais de construção. Nesse conjunto maior, conhecido como varejo ampliado, o volume vendido em maio foi 3,8% maior que o de abril e 26,2% superior ao comercializado um ano antes. Mas, apesar desses números favoráveis, talvez seja cedo para seguir o ministro da Economia, Paulo Guedes, em seu entusiasmo. Segundo ele, o Brasil surpreende o mundo e a economia “bombou” mesmo quando o auxílio emergencial ficou suspenso.
O ministro parece haver esquecido os 14,8 milhões de desempregados, 14,7% da força de trabalho, no trimestre fevereiro-abril, quando a atividade segundo ele, estava bombando. Além disso, parece haver menosprezado o desempenho da indústria, ainda muito fraco. O aumento da produção industrial em maio (1,4% sobre o volume de abril) ocorreu depois de três meses de queda. Com esse resultado, o setor voltou ao nível pré-pandemia, mas continuou 16,7% abaixo do pico atingido em maio de 2011.
A indústria já andava mal, em 2019, no início do mandato do presidente Jair Bolsonaro. Continuou piorando até chegar a pandemia, afundou mais em 2020 e afinal voltou à superfície. Mas nada se fez em Brasília, nos últimos dois anos e meio, para reverter, ou pelo menos deter, a desindustrialização do País.
Falar em economia bombando, mesmo diante da recuperação do varejo, fica estranho quando se observam os números da indústria de transformação. Em maio, as vendas de veículos, motos, partes e peças foram 1% maiores que as de abril. No período janeiro-maio foram 26,3% superiores às de um ano antes. Mas o setor continua abaixo dos níveis pré-pandemia. Neste ano, até junho, as montadoras produziram 1,148 milhão de veículos, 57,5% mais que no primeiro semestre de 2020. Segundo a direção da Anfavea, a associação nacional das fabricantes, o setor deixou de produzir entre 100 mil e 120 mil unidades por causa da escassez de semicondutores.
Com mais 120 mil, no entanto, a produção teria chegado a 1,268 milhão, número inferior ao de janeiro a junho de 2018, quando o total chegou a 1,435 milhão. Em 2019, antes da pandemia, foram montados 1,214 milhão de veículos na primeira metade do ano.
Nesse período de 2020, com o Brasil já assolado pela covid, o número ficou em 729,3 mil unidades. Quase paralisadas, em abril do ano passado as montadoras fabricaram 1.800 veículos.
A comparação com o período pré-pandemia mostra mais claramente a perda de ritmo do setor. O número de empregados também diminuiu nesse período. Em junho de 2018 as montadoras empregavam 112,7 mil trabalhadores. O contingente diminuiu ano a ano e em junho de 2021 chegou a 102,7 mil.
A desindustrialização do País começou bem antes do mandato do presidente Jair Bolsonaro. Sinais de fraqueza já eram visíveis, na indústria, em 2012-2013. Não basta, no entanto, a atual administração se isentar de responsabilidade por todo o processo. Um governo com visão dos problemas, metas e programas teria cuidado, desde o início, de trabalhar pela recuperação da indústria. No entanto, nenhum diagnóstico foi exposto e nenhum propósito de modernização e de revigoramento do setor foi mencionado pelo presidente ou por sua equipe. Mas a economia, segundo o ministro Paulo Guedes, está bombando. Bombando e sem rumo? (O Estado de S. Paulo/Notas&Informações)