Empresas miram longo prazo, mas riscos preocupam

O Estado de S. Paulo

 

Os últimos 12 meses foram uma montanha-russa para as operações da Tronox no Brasil, um grupo industrial americano com 7 mil funcionários no mundo e especializado na fabricação de dióxido de titânio, insumo químico usado na pigmentação de tintas e plásticos. No ano passado, a demanda pelo produto despencou durante a fase mais crítica da pandemia, e o faturamento líquido da empresa no País chegou a cair pela metade no segundo trimestre, para R$ 78 milhões.

 

Nos meses seguintes, porém, a fábrica da empresa, localizada em Camaçari (BA), verificou uma retomada repentina, puxada pela demanda da construção civil e pela necessidade de reposição de estoques. O faturamento deu um salto: chegou a bater R$ 281 milhões no quarto trimestre e se manteve em R$ 226 milhões nos primeiros três meses de 2021.

 

Com a melhora do mercado, a matriz nos EUA decidiu colocar em prática um plano de investimentos de R$ 137 milhões no Brasil, que era preparado desde outubro de 2019. Os recursos serão usados para modernizar a fábrica em Camaçari, automatizando processos industriais. Também está no radar o lançamento de novo um produto para o segmento de tintas.

 

A palavra de ordem, segundo o diretor-presidente, Roberto Garcia, é a “diferenciação” para obter uma margem de lucro maior e competir com concorrentes estrangeiros. “Existe muita concorrência chinesa. Mas a diferenciação do produto e a proximidade com o cliente podem ser decisivos. E já têm feito a diferença agora”, diz.

 

O caso da americana Tronox não é isolado. Nos últimos meses, aumentou o número de multinacionais que decidiram realizar novos investimentos no Brasil, de olho na recuperação da atividade econômica.

 

Um outro exemplo é o do grupo português EDP, do setor elétrico, que anunciou recentemente investimentos de R$ 10 bilhões até 2025. Eles serão aplicados em três frentes, de acordo com o presidente da operação brasileira, João Marques da Cruz. A primeira delas é na melhoria do serviço de fornecimento de energia elétrica nos municípios atendidos por ela, no Espírito Santo e em São Paulo.

 

O plano inclui atualizar equipamentos, construir novas subestações para evitar a interrupção de energia e substituir sistemas de controle para reduzir as perdas. Cerca de R$ 6 bilhões devem ser investidos apenas nesses projetos. Os demais recursos serão usados na construção de linhas de transmissão e na geração de energia solar. No momento em que há o temor de uma crise energética, a empresa quer elevar a produção de energia solar dos atuais 50 megawatts para 1 gigawatt em 2025, um aumento de 20 vezes.

 

“Entendemos que é nesse momento que se deve apostar. Temos confiança de que os fundamentos da economia brasileira vão permanecer. E acreditamos que a economia vai crescer e vai precisar de infraestrutura de energia no longo prazo”, afirma Marques da Cruz.

 

É também de olho no longo prazo que a montadora Renault anunciou em março um plano de investimentos de R$ 1,1 bilhão para este ano e 2022. Segundo Ricardo Gondo, presidente da empresa no Brasil, o montante deve ser investido principalmente na renovação da linha de automóveis, com o lançamento do novo modelo Capitu e de um novo motor turbo flex, além da chegada de dois novos elétricos, entre eles o Zoe E-Tech.

 

Com a retomada da atividade econômica e o crescimento das vendas de veículos, a empresa planejou um novo ciclo de investimento. Segundo Gondo, a expectativa é de que o mercado brasileiro de veículos de passeio e comerciais leves deve chegar a 2,3 milhões de unidades vendidas este ano (18% mais sobre 2020) e a 2,7 milhões em 2022.

 

O que impede uma recuperação mais acelerada, segundo ele, são as incertezas sobre o ritmo da vacinação, a falta de peças que tem prejudicado o setor automotivo, além de uma dúvida sobre a agenda de reformas econômicas. “O Brasil tem de priorizar as reformas, que ainda não aconteceram – a reforma tributária, a reforma administrativa. O que precisamos é ter segurança jurídica. Precisamos ter previsibilidade. São investimentos enormes e de longo prazo. É isso que vai assegurar futuros investimentos no País”, diz. (O Estado de S. Paulo/Filipe Serrano)