O Estado de S. Paulo
À frente Volkswagen na América Latina desde outubro de 2017, o executivo argentino Pablo Di Si vive hoje seu segundo ciclo de investimentos no Brasil após finalizar os R$ 7 bilhões do programa anterior, lançado justamente no ano em que assumiu o cargo.
O anúncio do valor e do prazo dos novos investimentos só deve ocorrer, no entanto, quando houver maior controle da pandemia de covid-19. A ideia é que a divulgação aconteça em cerimônia com a participação do presidente mundial da empresa, Ralf Brandstätter. “Claro que o anúncio é importante, mas o mais importante é fazer, e já estamos implementando em nossas fábricas o nosso novo ciclo de investimento”, disse Di Si ao programa Olhar de Líder, do Estadão/Broadcast.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
- Quais são os planos de investimento da VW para o Brasil?
O plano de investimentos de R$ 7 bilhões foi finalizado. Estamos agora num novo ciclo. Ainda não anunciamos porque a ideia era convidar o presidente mundial (da montadora) para o anúncio. Mas, pela pandemia, estamos segurando um pouco. O importante é que isso já está acontecendo.
- O investimento é maior do que o ciclo anterior de R$ 7 bilhões?
Não posso falar em valores, mas o ciclo acontece em muitos segmentos. Nos próximos dois anos, o Brasil vai passar por muitas mudanças de legislação, envolvendo uma série de normas prevendo mais segurança e menos emissões. Alguns modelos que hoje existem no Brasil vão deixar de existir em seis meses, um ano ou dois e vai haver uma nova safra de produtos da Volkswagen e de outras montadoras. Esse investimento que estamos fazendo vai complementar nossa linha de produtos atual, melhorar o nível de segurança, de emissões de CO.
- Será um investimento com foco maior em desenvolvimento de produto do que em expansão?
Com certeza. Temos quatro fábricas no Brasil, estamos bem de capacidade.
- Como está o plano de trazer carros elétricos ao Brasil? Temos um plano de seis veículos nos próximos cinco anos, entre elétricos e híbridos. O Brasil não é um país, é um continente, e esses híbridos são uma boa transição até a eletrificação completa do Brasil.
Quem vai determinar a velocidade (de introdução) desses veículos será o consumidor. Hoje, o Brasil tem menos de 1% do mercado em veículos elétricos e híbridos. Se até 2030 vai ser 10%, 5% ou 30%, quem vai definir é o consumidor. Também vai depender de políticas públicas, do custo das baterias. Em relação ao produto, a Volkswagen terá mais de 140 veículos elétricos e híbridos no mundo nos próximos cinco anos. Temos muito conteúdo. Precisamos ver como o mercado vai evoluir no Brasil.
- A Anfavea (entidade que representa as montadoras) disse que as matrizes estão assustadas com a política e a economia do País. Isso afasta investimentos?
Nossa matriz não está assustada. Entende que a América Latina tem volatilidade. Não é um mercado que cresce 1% e cai 1%. É um mercado que sobe 30% e cai 40%; sobe 50%, cai 20%. Essa instabilidade gera tensão às vezes. Mas o importante é o olhar de médio e longo prazos. Ninguém faria os investimentos que fizemos e estamos fazendo se não acreditasse na região no médio e longo prazo. O que temos de ter cuidado é com a competitividade do País. São coisas faladas há mais de 30 anos: reforma tributária, reforma administrativa. Todo o custo de ineficiência que nós temos torna difícil exportar um veículo, por exemplo. Fica mais caro produzir um veículo aqui do que em outro país. Sempre temos uma mochila de 50 quilos nas costas.
- Como a Volkswagen tem conseguido atravessar a crise de abastecimento de peças?
Falta de semicondutores é no mundo, não é só no Brasil. Então, o time da Alemanha está nos ajudando muito. Temos muitos problemas, mas o time gerenciou para não parar um dia por falta de peças. Temos reuniões diárias para entender o que está faltando, onde estão as peças, em qual país, em qual avião. Trabalhamos num nível de detalhe alto.
- Há previsão de paradas por falta de peças na Volkswagen?
Não temos previsão, mas também não me chamaria a atenção se tivermos de parar por dois ou três dias.
- A volta do mercado de veículos a níveis de pré-pandemia deve ser rápida ou lenta?
Acho que vai ser muito rápida. Quando você tem um problema de abastecimento é porque a demanda está maior do que a oferta. Esses problemas existem porque há uma demanda muito aquecida no mundo, incluindo o Brasil. Então, com a vacina disponível, a demanda vai acelerar no segundo semestre. Neste mês, vai chegar uma quantidade enorme de vacinas. Como o sistema do SUS é muito bom, a vacina vai chegar num período curto aos braços das pessoas. Até junho, a vacinação no Brasil deve acelerar muito.
- Como fica o futuro do Brasil diante do plano mundial da Volkswagen de se tornar uma montadora neutra em carbono?
Antes de entrar no tema dos carros elétricos e híbridos, existe a importância da matriz energética de cada país, porque é o que vai alimentar um carro elétrico ou híbrido. O Brasil tem 85% da matriz em fontes renováveis. O mundo só tem 36%. Há países com alta dependência do carvão. Como Volkswagen, vamos olhar a cadeia como um todo, não apenas o veículo. As estratégias podem variar para atingir o mesmo objetivo. Nós, aqui, temos o etanol e o biocombustível. O caminho à neutralidade de carbono não tem retorno, e o Brasil e a região não estão fora. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Laguna)