O Estado de S. Paulo
A alta dos juros para conter a escalada da inflação em 2021 terá impacto também na dívida pública, que fechou em 90% do PIB em fevereiro. Considerando a atual composição dos títulos no estoque da dívida, a elevação da taxa básica de juros, a Selic, pode levar a um aumento de cerca de R$ 100 bilhões no endividamento público até o fim deste ano, segundo cálculos do economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito.
Ele faz a ressalva de que o Tesouro pode optar por mudanças na estratégia de emissões de papéis para suavizar o impacto nos próximos meses. A dívida pública é emitida para pagar despesas que ficam acima da arrecadação com impostos e tributos.
“Esse aumento dos juros no Brasil, sem dúvida, vai trazer um custo financeiro para o Estado, e não tem como pensar diferente. Mas o que estamos comprando com esse custo é uma forma de evitar que a estrutura de preços no Brasil se degringole, o que teria um custo ainda maior”, diz Perfeito.
A maior parte dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional para financiar o endividamento público remunera os investidores com base na Selic e na variação do índice oficial de inflação (IPCA). Do estoque total de R$ 5,198 trilhões em papéis nas mãos dos investidores no fim de fevereiro, quase 35% eram corrigidos pela Selic e outros 26% pela inflação.
Neste contexto, de acordo com o Banco Central, para cada 1 ponto porcentual de aumento na Selic mantido por 12 meses, há um acréscimo de 0,42 ponto porcentual na dívida bruta, ou R$ 31,4 bilhões em valores nominais. Para cada 1 ponto porcentual de aumento na inflação pelo mesmo período, a dívida cresce 0,16 ponto, o que equivale a R$ 11,8 bilhões.
O problema para o governo é que as expectativas tanto para a alta de preços em 2021 quanto para o patamar da Selic ao fim deste ano vêm sendo reajustadas para cima semanalmente pelo mercado.
No fim de janeiro, quando o Tesouro divulgou o Plano Anual de Financiamento (PAF) de 2021, as projeções dos analistas ouvidos pelo BC no Relatório Focus apontavam para um IPCA acumulado de 3,50% neste ano, com uma taxa básica de juros também de 3,50% ao fim de dezembro. Agora, dois meses depois, o mercado já espera uma inflação bem superior, de 4,81%. E o próprio BC já coloca o IPCA em 5,0% ao fim do ano.
Embora reconheça o impacto da escalada dos juros e da inflação no endividamento brasileiro, o subsecretário da Dívida Pública do Tesouro, José Franco de Morais, explica que esse efeito não significa necessariamente um aumento da despesa de curto prazo do órgão, já que a maior parte dos papéis remunerados pela Selic não paga cupons semestrais aos investidores.
Atualmente, o Tesouro emite títulos corrigidos pela Selic com prazos de vencimento de 1 e 7 anos, que carregam a Selic média deste período. “A manutenção da inflação sob controle é a principal política que o BC pode fazer para auxiliar a gestão da dívida pública”. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Rodrigue e Fabrício de Castro)