Correio Braziliense
Insumo estratégico para várias cadeias produtivas, o aço sofreu reajuste de tal magnitude que levou a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) a pedir ao governo para zerar o imposto de importação do produto, a fim de equilibrar o valor no mercado interno e evitar o desabastecimento. No entanto, nesta terça-feira (30/3), o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, negou que falte produto para fornecimento. Ele explicou que as siderúrgicas também sentiram o aumento nos preços dos insumos e das matérias-primas para fabricação de laminados planos, que abastecem a indústria automobilística, e de vergalhões, fornecidos para a construção civil.
Lopes ressaltou que o mundo vive um novo ciclo de commodities, com alta nos valores em cadeia. “Na comparação de fevereiro de 2020 com fevereiro de 2021, o insumo da sucata subiu 150% e é estratégico para nós”, disse. Outras matérias-primas também tiveram alta: o minério, 130%; o gusa (ferro que é retirado do alto-forno), de 93%; o níquel, de 81,7%; o zinco, 61,4%; o carvão mineral; 40,5%. “Isso teve um impacto efetivo de aumento (na mesma comparação) de 65,5% no vergalhão e de 82,9% na bobina de aços planos. Mas houve um aumento global. A variação em dólar foi de 49,7% na Europa, 46,5% na Rússia, 43% no México e 38,8% no Brasil. Não existe especulação”, sustentou.
Três setores responsáveis por 82,2% do consumo do aço no Brasil: 37,6% vão para a construção civil; 20,5%, para bens de capital; e, 24,1%, para o setor automotivo. “Há uma guerra de narrativas”, sustentou. Segundo ele, o país é o nono maior produtor de aço do mundo, mas o mercado interno está com desempenho abaixo do necessário para as usinas operarem com grau de utilização razoável de sua capacidade. “De 2013 a 2020, o consumo caiu 24,2%. Foram dois anos de recessão profunda da economia brasileira e momentos importantes, como a greve de caminhoneiros em 2018 e o rompimento da barragem de Brumadinho em 2019. Tudo isso afetou o setor”, afirmou.
Baixa utilização
Por uma razão ou outra, de acordo com Lopes, as cadeias não consomem aço suficiente para a siderurgia trabalhar com grau razoável da capacidade instalada. “Começamos 2020 com 63,7% de utilização. Com a pandemia, tivemos uma crise de demanda, a utilização caiu para 45%”, assinalou. O executivo, que também é coordenador da Coalizão Indústria, que tem representação de 13 setores da indústria da transformação e da construção civil, informou que, no auge da pandemia, em abril do ano passado, o setor automotivo fechou 65 plantas e 5,2 mil concessionários e 47% das empresas de máquinas e equipamentos pararam a produção.
“A construção civil também cancelou pedidos de fornecimento de aço. Caímos para o menor índice de utilização da capacidade (45%) da história da siderurgia brasileira. Quem tinha material produzido, cancelou as entregas. Nós fomos obrigados a desligar equipamentos”, explicou. A fotografia do setor em abril de 2020 foi de 14 fornos abafados, sendo que seis foram paralisados antes da pandemia. Das aciarias (unidade de uma usina siderúrgica onde existem máquinas e equipamentos voltados para o processo de transformar o ferro gusa em diferentes tipos de aço), 13 pararam e quatro já estavam paralisadas.
“Quando a retomada da economia veio mais forte, religamos tudo. Em dezembro, só cinco fornos permaneciam desligados e voltamos com 13 aciarias. Estamos produzindo e ofertando mais no mercado, tanto que, em janeiro de 2021 ante janeiro de 2020, houve crescimento de 25% nas vendas de produtos longos (vergalhões)”, pontuou. Na comparação do primeiro bimestre com igual período do ano passado, a alta é de 23%. “Colocamos mais no mercado interno do que antes da pandemia”, destacou.
Enquanto isso, houve queda nas exportações do produto, continuou Lopes. “No primeiro bimestre comparado com a média de 2018, a redução foi de 56%. Em relação à média de 2019, recuo de 55%. E sobre 2020, -33%”, detalhou. Para o presidente do Aço Brasil, a pesquisa realizada pela CBIC, que o Correio publicou na edição de segunda-feira e mostra desabastecimento e atrasos nas entregas, não tem impacto. “É uma amostra de pouco mais de 200 empresas num universo de 20 mil indústrias cadastradas nas usinas como clientes”, justificou.
“Se existir desabastecimento, eu mesmo vou junto ao governo pedir para zerar imposto”, prometeu. Conforme ele, a demanda adicional está relacionada à reposição de estoques. “Ou é especulativo, com gente na distribuição guardando material para vender depois. Ou ainda o construtor fazendo estoque por questão da volatilidade do preço”, cogitou. (Correio Braziliense/Simone Kafruni)