Motorhomes e trailers caem no gosto do brasileiro

Jornal do Carro

 

O casal Jean Paulo Strauch, de 47 anos, e Adriana, de 43, posa para foto em São Francisco do Sul (SC). Eles são exemplos de um público que, para fugir de aeroportos, aviões e hotéis na pandemia, descobriu o prazer de viajar pelo País em trailers e motorhomes. O mercado está tão aquecido que em alguns fabricantes a fila para a compra de um veículo chega a sete meses. E o preço de um trailer passa facilmente dos R$ 100 mil.

 

Quem pretende encomendar um trailer ou motorhome na Apolo Trailer só receberá o veículo na metade do ano que vem. Dono da empresa localizada em Campo Alegre (SC), Alisson Paulo Ramos diz que, com o aumento do número de pedidos, a fila de espera gira em torno de sete meses. A alta na demanda registrada pela fabricante que, segundo Ramos, é a maior do setor no País, não é um caso isolado. O aquecimento desse mercado está ligado à pandemia. Muita gente vem trocando as viagens de lazer internacionais pelo turismo doméstico. E, por receio de aglomerações, vem fugindo do transporte coletivo, como ônibus e aviões, e evitado ficar em hotéis e pousadas.

 

Diretor do Grupo Fun, que também fabrica esse tipo de veículo, Leônidas José Fleith afirma que a demanda disparou a partir de maio, após uma parada geral em abril. Ele diz que está vendendo três trailers e três motorhomes por mês.

 

O atual ritmo de produção da empresa localizada em Timbó, em Santa Catarina, é muito superior ao do ano passado. Em 2019, a Fun não chegava a fazer dois motorhomes por mês, e ainda não montava trailers.

 

Ramos afirma que, até o ano passado, a Apolo Trailer vendia “entre 60 e 70” unidades. De acordo com ele, a empresa deve fechar 2020 com cerca de 100 modelos comercializados.

 

O empresário avalia que parte desse crescimento foi motivada pelo “fechamento de fronteiras”, que impediu viagens internacionais. Segundo Ramos, isso tem motivado as pessoas a “viajarem com a própria casa”. A prática, comum nos Estados Unidos e na Europa, começa a decolar no Brasil.

 

Segundo Fleith, o perfil do consumidor também está mudando. “Cerca de 60 a 70% dos clientes estão comprando pela primeira vez (trailer e motorhome)”, diz. E a faixa etária diminuiu bastante. “Antes, a maioria do público era formada por aposentados. Hoje, há casais na faixa dos 30, 40 e 50 anos”, diz.

 

Público jovem. Adriana, de 43 anos, e Jean Paulo Strauch, de 47, enquadram-se nessa nova tendência. Em julho eles receberam seu primeiro trailer. Desde então, o casal, que é de Blumenau (SC), já viajou para lugares como São Francisco do Sul, Bombinhas e Itapoá, todos no litoral catarinense. Agora, planejam viajar para Mato Grosso do Sul no fim do ano.

 

Adriana é professora e conta que a meta do casal é fazer uma viagem por mês. Ela diz que recentemente foi de carro para Campos do Jordão, em São Paulo, e sentiu falta do trailer.

 

“Com ele, você tem a sua comida, usa o seu banheiro. Não sinto falta de hotel”, garante.

 

Apesar de a experiência com trailer ser recente, Adriana diz que acampa “há mais ou menos 20 anos”. A professora, inclusive, publica dicas e experiências de viagem no canal “Livres, leves e soltos”, no Youtube.

 

Ela afirma que o trailer é estável e não compromete a dirigibilidade de seu Toyota SW4. Mas alerta que a velocidade deve ser reduzida e o consumo de diesel aumenta. “Com o trailer, não passamos de cerca de 100 km/h, e a média, que seria de 12 km/l, baixa para 9 km/l.”

 

Para puxar trailers e motorhomes de até 6.500 kg, não é preciso carteira de habilitação profissional. A do tipo “B” basta.

 

O casal encomendou o trailer em março. Um pouco antes, portanto, da pandemia do novo coronavírus. Isso reforça outra tendência apontada pelos fabricantes. Mesmo antes da explosão do número de casos de covid-19, a procura já vinha crescendo. A doença só fez com que os clientes – a maioria interessada em turismo ligado à natureza – concretizassem a compra.

 

Tradicionalmente, boa parte da clientela é do Sul do País. Ivete Evaristo Meyer, da área comercial do Grupo Fun, diz que há cada vez mais interessados de São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso. “Estamos subindo aos poucos”, brinca.

 

Esse aumento do número de clientes também vem atraindo mais empresas para o setor. É o caso da Estrella Mobil, que fica em Santa Branca, no Vale do Paraíba (SP), e lançou o motorhome em 2018.

 

Diretor da fabricante, Julio Henrique Lemos conta que trabalhava com montagem de veículos, como carretas para eventos e hospitais móveis. Segundo ele, esses segmentos entraram em declínio em 2017.

 

Como já havia percebido o aumento da procura por motorhomes, Lemos decidiu entrar no ramo. E vem colhendo bons resultados. Segundo ele, faltando dois meses para o fim de 2020 a Estrella Mobil já superou o volume do ano passado, quando foram vendidas nove unidades.

 

Quintal imenso

 

Segundo Lemos, as viagens de motorhome “proporcionam experiências” únicas. “Você não fica amarrado a roteiros prontos”, diz.

 

O professor Francisco Albano, de Curitiba (PR), concorda. Ele viaja de motorhome há cerca de 18 anos e afirma que “é sempre uma aventura”. A bordo de sua Karmann Ghia Safari ano 85, Albano garante que faz amizades por onde passa.

 

E conta que em uma das viagens, parou em Maresias, no litoral norte de São Paulo, para reparar os freios. Acabou ficando 15 dias, “num estacionamento de frente para o mar”.

 

Há um ano, o professor montou um grupo no Facebook que reúne pessoas com as mesmas afinidades. Segundo ele, os cerca de 30 mil participantes usam o espaço para trocar informações e experiências.

 

Albano afirma que atualmente há muitos espaços, como campings, onde é possível ficar. E diz que é possível pernoitar em estradas nos estacionamentos de grandes redes de postos de serviço, com todas as comodidades e segurança. Segundo ele, vários aplicativos têm pontos de apoio catalogados. “Saio com o roteiro pronto”, conta.

 

O grupo criado por Albano também virou uma plataforma para interessados em comprar e vender. Segundo ele, dependendo do estado de conservação e “da vontade de vender e de comprar”, nas palavras do professor, para um trailer como o dele os preços podem variar de R$ 70 mil a R$ 120 mil. A média fica na faixa dos R$ 85 mil.

 

A Karmann Ghia montou a Kombi Touring de 1977 a 1979. Em 1979, lançou a Safari, que permaneceu em linha até 1995.

 

O trailer novo, como o do casal Adriana e Jean Paulo, custa cerca de R$ 130 mil. Já um motorhome, normalmente feito sobre o chassi do Mercedes Sprinter e do Iveco Daily, começa na faixa dos R$ 300 mil e pode ultrapassar os R$ 700 mil. Isso depende da marca, tamanho e equipamentos, por exemplo. “O céu é o limite”, diz Lemos.

 

Segundo postagens feitas no grupo criado por Albano, em comum há sempre “uma pequena casa com um quintal imenso”. (Jornal do Carro/Hairton Ponciano)