Excedente das montadoras chega a 2.920 trabalhadores

Diário do Grande ABC

 

O volume de excedentes nas montadoras do Grande ABC chega a 2.920 trabalhadores, o que equivale a 10% do efetivo de 29,3 mil profissionais que atuam nas cinco fabricantes. Isso significa que, diante das dificuldades trazidas ao setor pela pandemia do novo coronavírus, há mais operários do que demanda pelos veículos.

 

Na tentativa de contornar o alto volume de funcionários frente à queda de produção –, as montadoras têm deixado em casa 1.900 profissionais, por meio do lay-off (suspensão temporária do contrato de trabalho), o que representa 6,5% do quadro total de empregados.

 

Além disso, quatro das cinco companhias abriram PDVs (Programas de Demissão Voluntária) – um deles, inclusive, foi reaberto diante da baixa adesão.

 

Por empresa

 

O maior volume de excedentes está na Volkswagen: 1.900. A estimativa, fornecida pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, corresponde a 22% do efetivo da planta de São Bernardo, que hoje gira em torno de 8.600 funcionários.

 

Embora a empresa não admita quantos empregados quer atingir com o PDV, como incentivo oferece até 35 salários adicionais à tabela base, além da rescisão, ou seja, considerando o maior rendimento dos horistas e indiretos (que trabalham na produção), de R$ 11.230, e tempo de casa acima de 30 anos, o valor pode chegar a R$ 393,050 mil. Para quem está na companhia há até dez anos e recebe o piso de R$ 5.730, o bônus é de R$ 143.750, considerando 25 salários a mais.

 

A companhia possui em torno de 1.000 trabalhadores em lay-off, cujo retorno é previsto para o dia 26.

 

A Mercedes-Benz encerrou o prazo para adesão ao PDV em 30 de setembro e, segundo o sindicato, o volume superou as expectativas. Conforme a empresa admitiu, a ideia era a de conquistar 400 trabalhadores. Caso tenha alcançado sua meta, haverá redução de quase 5% em seu efetivo, de 8.500 profissionais em São Bernardo. A companhia não divulgou o que foi oferecido para estimular a demissão voluntária.

 

A montadora tem 400 operários em lay-off, que retornam ao trabalho em 2 de novembro. Até então, a ideia era a de revezar esse grupo com outro de 400, mas, conforme o sindicato, não será mais preciso. Questionada, a montadora disse que a mudança não tem a ver com o PDV.

 

Reabertura

 

Diante da baixa adesão ao programa de demissão voluntária encerrado em agosto, que contou com 293 profissionais, a GM (General Motors) reabriu o PDV em São Caetano dia 30 de setembro e o estendeu até o dia 15, quinta-feira. São ofertados de 3,5 a sete salários adicionais, a partir de quatro anos de casa, e de um a dois anos extras de plano de saúde – além dos valores devidos pela rescisão contratual. Como bônus, para os profissionais que tiverem mais de 11 anos de firma será disponibilizado também um Onix Joy Black, que custa R$ 55.990.

 

A companhia mira a adesão de 500 trabalhadores e avisa que, caso não consiga atingir a meta, terá de efetuar o desligamento involuntário, segundo o Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano. Hoje, a planta da região emprega 8.000 colaboradores, e o corte de 500 deles significa redução de 6,25% do efetivo.

 

Outra ferramenta a qual a montadora lançou mão para adequar o efetivo à queda da produção foi a prorrogação do lay-off de setembro para dezembro. Havia 700 funcionários afastados e, com a extensão, o número baixou para 500.

 

Mudança

 

A Toyota anunciou no mês passado a mudança da sede administrativa e do Centro de Pesquisa Aplicada de São Bernardo para Sorocaba, no Interior. Com isso, foi aberto PDV, no qual a empresa pretende atingir 120 trabalhadores, que receberão até 12 salários adicionais e a manutenção do plano de saúde por um ano.

 

Além disso, a empresa propôs a transferência de endereço a 490 profissionais. Sendo assim, o efetivo na região, hoje de 1.700 trabalhadores, será reduzido em 35,8%. Não há lay-off atualmente na unidade.

 

Embora o diretor de assuntos governamentais da montadora, Roberto Braun, tenha descartado, por ora, a mudança de toda a fábrica de São Bernardo, polo exportador e onde são fabricados componentes e motores, ele foi claro que a posição da companhia é concentrar a operação na sua maior unidade do País. “Vamos levar a área administrativa mais perto da nossa maior produção, onde temos um terreno maior e, consequentemente, maior possibilidade de expansão”, disse Braun, referindo-se a Sorocaba. Inaugurada em 2012, a planta é a mais moderna da marca, onde são fabricados os modelos Etios e Yaris e empregadas 2.000 pessoas – volume que será ampliado em janeiro do ano que vem com as mudanças.

 

Scania diminui o volume exportado de 65% para 35%

 

A Scania é a única montadora do Grande ABC que não possui, no momento, PDV aberto nem lay-off em andamento. A fabricante de caminhões e chassis de ônibus emprega 2.500 profissionais em São Bernardo e destina boa parte de sua produção ao Exterior. No entanto, o volume embarcado, que já foi de 70% dos veículos fabricados e, no fim do ano passado, era de 65%, hoje, segundo a montadora, é de 30% a 35%.

 

“Para atravessar esta crise global sem precedente, a Scania lançou mão do acordo coletivo de flexibilidade, firmado com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ferramenta que permite adaptabilidade importante em momentos difíceis como este vivido agora. Destaca-se, porém, que a retomada ainda é lenta com a produção aumentando gradativamente de acordo com a recuperação dos mercados, com atenção total à segunda onda da pandemia que aparece na Europa – estamos também acompanhando de perto os desdobramentos da Covid-19 no Brasil”, assinalou a empresa.

 

Segundo o sindicato, foi aprovado acordo por dois anos. Em 2020, não haverá reajuste pela inflação e, no lugar, terá abono de R$ 4.000. Em 2021, o INPC será pago de forma integral, além da antecipação do 13° salário.

 

Até o fim do ano é esperada a construção de novo centro logístico no bairro Demarchi, que consumiu investimento de R$ 200 milhões e deve gerar 400 empregos.

 

Produção e vendas atravessam forte crise

 

A tentativa de enxugar o quadro de empregados reflete a projeção realizada pela Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) de que o setor deve encolher neste ano 35% na comparação com 2019. Com isso, devem sair das esteiras 1,915 milhão de unidades, o que faz com que o segmento retroceda ao patamar de 2003. A venda de veículos zero-quilômetro também deverá ter marca negativa, com redução de 31%, para 1,925 milhão de exemplares, o pior resultado desde 2005.

 

Além do mercado interno retraído pela crise econômica desencadeada pela Covid-19, o comércio exterior também não vai bem, e deverá encerrar 2020 com tombo de 34% e 284 mil unidades embarcadas a outros países, o que leva a atividade ao nível mais baixo desde 1999, o pior desempenho do século.

 

Para aliviar os caixas das montadoras, também foram firmados acordos coletivos, por intermédio dos sindicatos dos metalúrgicos, de não reajustar salários neste ano e, em 2021, corrigir os vencimentos só pela inflação – a categoria, vale lembrar, é uma das que historicamente mais conquistaram benefícios e ganhos reais, acima do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que já chegou a 10%.

 

Ameaça

 

O cenário, já complicado, ganhou na semana passada mais um adversário. O Senado Federal aprovou a MP (Medida Provisória) 987, que prorroga incentivo fiscal a empresas do setor automotivo instaladas nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste do País. As companhias usufruem de crédito presumido do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) conforme apresentarem projetos de novos produtos. Decisão é vista como ameaça à sobrevivência do segmento no Grande ABC por criar concorrência desleal e desestimular companhias a desenvolverem veículos na região e, consequentemente, a gerar empregos.

 

A Toyota vem encabeçando movimento contra a MP, que conta com o apoio do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Conforme exemplifica o diretor de assuntos governamentais da montadora japonesa, Roberto Braun, um veículo de R$ 100 mil, com o benefício, pode ser vendido por R$ 79 mil, já que o incentivo equivale a R$ 21 mil. “Como explicar para o morador do Grande ABC que lá tem incentivo e aqui não?”, questionou.

 

Segundo o vice-presidente do sindicato, Aroaldo Oliveira da Silva, a entidade vai pressionar o governo federal e marcar agenda com o estadual, para o qual a aposta está no programa IncentivAuto, que prevê desconto de até 25% no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre novos produtos para montadoras. Para ter acesso ao benefício, porém, é preciso investir ao menos R$ 1 bilhão e gerar ao menos 400 empregos. “Não podemos esperar o desmonte. Desmonte esse que já vem acontecendo”, disse. (Diário do Grande ABC/Soraia Abreu Pedrozo)