Indústria de máquinas agrícolas sobe preço no Brasil para reduzir custos com câmbio

Agro em Dia

 

Montadoras de máquinas agrícolas estão reajustando preços para repassar o aumento de gastos com peças importadas encarecidas pela alta do dólar e devem ter a seu favor a boa rentabilidade de produtores de grãos do Brasil, um dos poucos setores que, também pelo câmbio, obteve margens positivas neste momento de crise histórica.

 

O movimento, disseram executivos das principais companhias que atuam no Brasil, incluindo multinacionais, visa mitigar custos maiores com o câmbio, uma vez que o dólar chegou a acumular alta de mais de 47% ante o real na máxima do ano, em maio. Ainda que recentemente a moeda brasileira tenha se valorizado, a divisa americana segue com avanço de mais de 20% no acumulado de 2020.

 

Após um primeiro semestre de negócios mais mornos em meio a incertezas relacionadas à pandemia do coronavírus, o setor de máquinas agrícolas também espera uma movimentação maior dos agricultores no segundo semestre, quando é semeada a safra de soja, a principal do país, conforme executivos ouvidos pela Reuters.

 

Devido à alta tecnologia embarcada nas máquinas, o uso de componentes importados faz com que as despesas com insumos em dólar fiquem entre 25% e 50%, a depender do equipamento.

 

“Estamos subindo preços para diminuir o impacto do aumento de custo que veio com a elevação do câmbio”, disse à Reuters o presidente da AGCO América do Sul, Luis Felli.

 

Na mesma linha, o vice-presidente da New Holland Agriculture para a América do Sul, Rafael Miotto, afirmou que a companhia já realizou repasses “bem importantes”.

 

“A gente não repassou 100% do aumento na despesa porque acreditamos que de seis meses a um ano o cenário melhore”, acrescentou.

 

“Temos um nível de 30% a 50% de importação (de peças) dependendo do produto. O aumento de custo (com câmbio no Brasil foi) de 15% a 30%, e os repasses foram realizados de acordo com cada produto também”, disse Miotto.

 

Na brasileira Jacto, o presidente da companhia, Fernando Gonçalves, conta que 25% das despesas é com importação.

 

“Sofremos um aumento de custo muito significativo, que subiu bastante com o dólar alto. É difícil fazer toda essa reposição, temos reajustes para serem feitos conforme for possível o mercado absorver”, declarou Gonçalves.

 

O executivo da New Holland, onde o reajuste já foi integralmente aplicado, disse que ainda não foi possível identificar a resposta do produtor rural para a medida, mas ele acredita que os agricultores sabem que por mais avançada que seja a indústria brasileira, muitos componentes não podem ser encontrados no país.

 

“O agricultor entende e (muitos) já esperavam pelo reajuste.”

 

Cautela

 

Algumas companhias resistem ao repasse de custos para evitar eventuais perdas de vendas em meio à pandemia.

 

Na unidade brasileira da norte-americana Deere, por exemplo, ainda há resistência em adotar este tipo de estratégia, considerando o cenário adverso do setor em meio à crise da covid-19.

 

“Por enquanto não aplicamos (repasses), estamos avaliando isso, queremos segurar o máximo de mercado”, disse o diretor de Assuntos Corporativos da John Deere para a América Latina, Alfredo Miguel Neto.

 

“Não tem uma resposta mais assertiva, estamos em fase de análise”, acrescentou.

 

Ele concorda que o produtor rural que exporta sobretudo grãos está mais capitalizado, porém, “muito pela pandemia”, a companhia espera uma queda entre 10% e 15% para as vendas de máquinas agrícolas na América do Sul.

 

“O exportador de grãos está muito bem. Os grandes agricultores quando veem uma oportunidade gigantesca como a que o dólar alto proporcionou para a exportação, ele consegue crédito e vai investir (em máquinas)… o pequeno produtor vê a situação política e econômica do país e se retrai, enquanto o médio pode ir tanto para o lado do grande quanto do pequeno”, disse Miguel Neto, que também representa o setor na Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

 

Dados da associação indicam que as vendas internas de máquinas agrícolas e rodoviárias – da indústria para concessionários – subiram ligeiramente em 0,9% de janeiro a maio, para 15,7 mil unidades.

 

Já a produção caiu 22,5% no período, para outras 15,7 mil unidades, pressionada pelo fechamento de diversas fábricas devido à falta de peças durante a pandemia.

 

“No final de março começamos a sofrer com falta de peças. Na média, as nossas plantas pararam por 20 dias, nesse período conseguimos restabelecer a cadeia de produção e restabelecemos nossas fábricas no final de abril”, lembrou Felli, da AGCO.

 

Para Miotto, da New Holland, a ausência de componentes na cadeia ainda não foi recomposta totalmente.

 

“Temos atraso na produção por esse motivo… Estamos acompanhando com muita atenção o efeito do coronavírus, mas de uma hora para outra podemos ter fornecedores fechados novamente. Se houver mais uma disrupção, pode vir um efeito importante aqui”, alertou.

 

Projeções

 

Oficialmente, a Anfavea ainda não fez projeções para a área de máquinas agrícolas em 2020, considerando os efeitos da pandemia, pois pretende aguardar a divulgação do Plano Safra 2020/21, marcada para o próximo dia 15 pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina.

 

“Ainda não foi feita uma projeção para o ano porque ela depende da divulgação e operacionalização do Plano Safra… Se virão juros menores e também o volume de recursos, porque não adianta ter juros lá embaixo e crédito que não atenda o período todo”, afirmou a Anfavea na última sexta-feira, ao divulgar o balanço de maio.

 

Quanto a isso, o presidente da Jacto ressaltou que, de acordo com declarações da ministra, o volume de recursos para subvenção será o mesmo. “E, se será o mesmo, significa que não será suficiente para atender o setor. O Moderfrota acabou em maio”, disse ele, em referência ao volume de recursos do programa de financiamento de máquinas.

 

Gonçalves disse que, atualmente, o faturamento da Jacto acumulado no ano está 5% inferior ao de 2019.

 

Mas a expectativa é de uma retomada no segundo semestre capaz de fazer com que a empresa feche 2020 em alta de 5% a 10%. Na companhia, a área de grãos responde por 80% da demanda.

 

“Com certeza o setor de máquinas está mais dependente da área de grãos. Produtores tinham feito negócios bons de algodão, mas são cuidadosos no investimento agora e na cultura da cana, com certeza a demanda está mais retraída, porém pode se recuperar antes do esperado”, avaliou o executivo da New Holland.

 

Miotto, da New Holland, disse que a expectativa é de que as vendas da empresa recuem de 5% a 10% em 2020. “Estamos melhorando nossa estimativa. Há três meses falávamos em queda de 20%, espero que a projeção continue melhorando ainda mais.”

 

Na AGCO, a perspectiva para as vendas no setor de máquinas também indica redução de 5% a 10% em relação ao ano passado, embora a visão do cenário para o segundo semestre seja otimista.

 

“A pandemia trouxe incertezas, mas possivelmente os juros menores do Plano Safra podem alavancar o mercado. Ainda temos um câmbio favorável para quem exporta… E achamos que o segundo semestre será positivo para a área de máquinas”, disse Felli, da AGCO. (Agro em Dia)