AutoIndústria
Os números de abril, naturalmente, não estão fechados, mas com a quase totalidade das fábricas e concessionárias fora de atividade desde o fim de março, as vendas de automóveis no Brasil devem registrar seu pior resultado mensal nas últimas de décadas, algo abaixo de 50 mil unidades, contra os 221,3 mil emplacamentos registrados no mesmo mês do ano passado.
A Jeep, claro, não fugirá desse tombo histórico, mas, a exemplo de outras marcas, tem buscado alternativas para manter algum nível de vendas e, principalmente, ajudar sua rede de 199 concessionárias a atravessar esse período de caixa vazio com o mesmo nível de custos.
Nesta entrevista, Tânia Silvestri, responsável pelas operações comerciais da Jeep na América Latina, fala sobre as dificuldades momentâneas do mercado brasileiro e também o que esperar para os negócios no curto prazo, imediatamente após o controle da pandemia.
“O mercado vai mudar bastante, o consumidor também”, tem certeza a executiva, que diz que o setor está no escuro com relação às vendas em abril, com alguns Detrans, inclusive o de São Paulo, responsável por cerca de um terço das vendas nacionais, fora de atividade.
Como estão as vendas de veículos em abril?
Na verdade, o setor está às escuras, já que muitos veículos estão sendo vendidos, mas não emplacados por conta da paralisação de alguns Detrans. É o caso do Ceará, Rio Grande do Norte e principalmente de São Paulo, estado que responde por cerca de um terço das vendas nacionais. Temos informações de nossos concessionários, que integram grupos multimarcas. Hoje somente 40% dos nossos showrooms estão abertos, mas todas as concessionárias têm buscado negócios por meio do digital, de forma remota. Para isso, levam o carro até o cliente para um test-drive, por exemplo, ou o entregam o veículo adquirido na casa do novo proprietário.
Qual participação as vendas online representavam no total de veículos negociados pela Jeep antes da pandemia e como será essa relação depois dela, na chamada nova normalidade?
Prefiro dizer que são vendas remotas, que misturam o digital e o físico. Antes elas respondiam por 2% somente, mas agora uns 80% dos negócios são iniciados a partir das consultas online. Acho que, passado este período da pandemia, podem ficar em 15% a 20% do total. Neste momento, estou muito tranquila com relação a esse quadro. A crise, muitas vezes, agiliza mudanças que já estavam em andamento, como o crescimento dos negócios online.
A rede Jeep foi constituída em um período de vendas ascendentes da marca e quando a concorrência para seus produtos não era tão grande, especialmente do Renegade. Como fica essa rede em um mercado que deve cair até 40% em 2020 e levar pelo menos três anos para retornar a 2019? É possível manter o atual número de pontos e as operações saudáveis?
Para ser sincera, acredito até que tínhamos uma rede subdimensionada para a demanda. Talvez com o novo veículo nacional, que será lançado a partir de 2021, estaremos no tamanho adequado. A rede Jeep é uma das que apresentam os maiores índices de rentabilidade, mas nosso papel é mantê-la sempre saudável, ainda mais em um momento como este, quando o fluxo de caixa é a maior dificuldade para todos, e em todo o mundo. Por isso estamos adotando medidas para ajudar os revendedores.
Que tipo de ajuda?
Por exemplo, subsidiando taxas de juros, postergando pagamentos que a rede deveria fazer agora e, por outro lado, antecipando repasses que deveríamos fazer para os concessionários apenas lá na frente.
E vencida esta fase?
O mercado vai mudar, o consumidor também. Precisamos fazer essa leitura, e rapidamente, do que esse novo cliente deseja e o que podemos e precisamos oferecer.
Qual o impacto da valorização do dólar nas vendas dos importados da marca e até quando será possível evitar o repasse para o preço final?
É claro que o mercado para os importados não está favorável [risos]. Mas, na verdade, no momento fica até difícil falar sobre os preços que devemos praticar ou qual o impacto que o dólar terá nas vendas. Fala-se em dólar a R$ 4,60 no fim do ano…
Antonio Filosa, presidente da FCA, afirmou que as versões híbridas do Renegade e Compass, que seriam importadas no fim de 2020, foram adiadas para o ano que vem. O previsto recuo de até 40% do mercado interno implicará em outras alterações no cronograma de lançamentos ou até cancelamentos de produtos?
Nada foi cancelado, é bom destacar. Algumas ações foram adiadas. O lançamento de um terceiro modelo nacional está confirmado a partir de 2021, assim como a atualização dos modelos já existentes mais para frente e da linha de motores.
Nos últimos anos Renegade e Compass garantiram a liderança e vice-liderança tranquilas entre os SUVs, algumas vezes até se alternando. No primeiro trimestre, porém, o Compass apareceu apenas na 4ª colocação, ultrapassado por VW T-Cross e Nissan Kicks. O que aconteceu?
O Compass não compete no mesmo subsegmento que esses outros veículos. Ele é líder entre os chamados C-SUVs e continua nessa posição, com 60% de participação. Acontece que os B-SUV, caso do Renegade e desses concorrentes, cresceram muito. Antes representavam de 12% a 13% do mercado de automóveis e já estão em 17%. Acredito até que chegarão a 22% em breve.
O T-Cross acabou de completar um ano de mercado e vendeu apenas 1 mil unidades a menos do que o Renegade no primeiro trimestre. O modelo da VW tem roubado vendas da Jeep?
Modelos como T-Cross ou o Chevrolet Tracker, na verdade, ajudaram a aumentar o subsegmento, com expliquei. Mas é natural que quem está na frente, vende mais, perca alguma coisa. A Jeep é líder entre os SUVs no Brasil há quatro anos, com mais de 20% de participação, o mesmo índice que temos em 2020. (AutoIndústria/George Guimarães)