Setor automobilístico vai levar três anos para se recuperar

Estado de Minas

 

O que estava ruim, com o fechamento de fábricas de fornecedores chineses em janeiro e fevereiro, ficou pior com a paralisação das linhas de montagem de automóveis no Brasil desde o começo de março. Segundo o Sindipeças, sindicato que congrega as empresas do setor, a pandemia da COVID-19 contaminou os fornecedores e derrubou a produção.

 

“A intensidade da crise será notada em abril, quando a cadeia automotiva se manteve isolada, com poucas empresas operando em cerca de 20% a 30% da sua plena capacidade”, afirmou a entidade, em nota. Na primeira semana de abril, as vendas de automóveis desabaram 80% – e a perspectiva é de continuidade da queda nos próximos meses.

 

Alguns especialistas no setor, no entanto, calculam que o impacto na cadeia de fornecimento é muito maior. Para o consultor Paulo Cardamone, diretor da Bright Consulting, os efeitos da pandemia no setor automobilístico indicam que o mercado vai demorar três anos para retomar os níveis de vendas do ano passado, quando foram negociadas 2.665.583 unidades. A previsão do consultor é que, em 2020, as vendas não passem de 2,3 milhões de unidades, subindo para 2,547 milhões em 2021 e 2,738 milhões em 2022.

 

Em abril, segundo dados da agência Auto Informe, a previsão é que apenas 43 mil unidades sejam vendidas. No segundo trimestre, 341,3 mil, o que representaria queda de 37% em relação ao período anterior. Paulo Cardamone vê com preocupação a “aniquilação” de pequenas e médias empresas e, consequentemente, a postergação das compras de veículos com a perda de renda das famílias e a menor utilização de seus veículos durante o período de quarentena.

 

A queda das vendas no primeiro semestre, pelas contas de Carmone, deve acarretar redução de aproximadamente 10 mil empregos nas montadoras e de 20 mil posições nas autopeças. Isso sem falar na rede de distribuição: estima-se que 30% das concessionárias não consigam se sustentar por mais de 30 dias inativos sem substancial ajuda das montadoras.

 

Assim como no mercado interno, as exportações recuaram em março – 20,3% –, totalizando US$ 528 milhões, o que vai na contramão da série histórica da indústria brasileira de autopeças. “Em 2019, por exemplo, as exportações cresceram 11,3% nesse comparativo. Logo, a queda observada parece sinalizar a influência da COVID-19 no fechamento de certos mercados e nas dificuldades impostas às operações logísticas”, destaca o Sindipeças.

 

Os impactos na cadeia automobilística são conhecidos no jargão econômico como efeito dominó. Menos vendas de carros, menos produção de peças e mais problemas indiretos. Só em março, o número de emplacamentos recuou 11,7%, seguindo a retração de 21,8% na produção de carros na comparação com o mesmo período do ano passado.

 

Em março, as vendas de automóveis tiveram o pior desempenho em 14 anos: os emplacamentos acumularam 155.810 unidades, recuo de 21% sobre igual mês em 2019, segundo a Fenabrave, entidade que reúne as concessionárias. Em relação a fevereiro, o índice negativo atingiu 18,6%. Nos acumulados janeiro a março, o vermelho chegou a 8,2%. Entre caminhões e ônibus, a queda ficou em 19,3%. Isoladamente, os ônibus despencaram 35%.

 

Sem projeção

 

O presidente da Fenabrave, Alarico Assumpção Júnior, atribuiu o resultado registrado em março à pandemia do coronavírus. “Representamos 4,5% do PIB e geramos mais de 315 mil empregos diretos em 7,3 mil concessionárias. Praticamente paramos em consequência da quarentena”, lamenta.

 

Outro termômetro do estrago da paralisação do setor automotivo é o segmento de pneus. No mês passado, foram comercializadas 4.474.381 unidades, segundo a Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (Anip). “O impacto começou no momento em que paralisaram a produção de veículos”, diz Klaus Curt, presidente da entidade, que enxerga no setor automobilístico uma situação que remete ao pânico. “Agora, só nos resta esperar o retorno das atividades. Não há como projetar nada, mas espero que tudo se normalize o mais depressa possível”. (Estado de Minas/Nelson Cilo)