Carros elétricos ameaçam o coração da economia da Alemanha

O Estado de S. Paulo/The New York Times

 

Öhringen está localizada no coração da região dos automóveis, a terra da maior indústria da Alemanha. Pelas aparências, ali a vida é bela. A taxa de desemprego em Öhringen é de apenas 2,3%. A prefeitura usa suas abundantes receitas na construção de uma nova escola para o curso secundário e um hospital. Entretanto, há indícios de que o crescimento econômico que alimentou esta fantasia começa a falhar.

 

Uma fábrica que produz filtros de ar está fechando, e demitirá 240 funcionários. A fabricante de peças de automóveis sediada na vizinha Stuttgart, é vítima de forças que estão revolucionando toda a indústria automotiva e ameaçando as bases da economia alemã. As vendas mundiais de automóveis começam a declinar e as companhias investem bilhões de dólares em novas tecnologias como direção automática e carros elétricos, mais fáceis de montar, e que exigem um numero menor de funcionários e de peças.

 

Fabricantes como a Daimler e a divisão Audi da Volkswagen, além de fornecedoras como Continental e Bosch, anunciaram recentemente dezenas de milhares de demissões. Em 2019 e 2020, a produção alemã de carros será a menor dos últimos 22 anos, segundo os cálculos de Ferdinando Dudenhöffer, professor da Universidade de Duisburg-Essen.

 

Há uma sensação constante de que algo mais fundamental irá ocorrer na poderosa indústria automotiva da Alemanha, que emprega 835 mil pessoas, do que apenas mais um ciclo econômico. De fato, a crescente popularidade dos veículos elétricos poderá forçar uma mudança no equilíbrio de poder da indústria mundial de automóveis com consequências a longo prazo.

 

Até o momento, as vendas de carros elétricos representam uma pequena parcela do mercado automotivo geral, mas estão crescendo rapidamente. Em outubro, os carros movidos a bateria e os híbridos representaram quase 10% das novas licenças de automóveis na Europa, segundo a JATO, uma empresa de pesquisa de mercado. As vendas destes carros subiram 40% na Europa, em relação ao ano anterior em um mercado em geral estagnado.

 

Bernhard Mattes, presidente da Associação da Indústria Automotiva Alemã, citou estudos segundo os quais, até 2030, a mudança para os carros elétricos poderá custar 70 mil empregos na Alemanha. Os efeitos destes cortes serão sentidos de maneira mais aguda em comunidades como Öhringen. Na rodovia que passa por Öhringen está a Ziehl-Abegg, fabricante de ventiladores industriais que tem mais de quatro mil funcionários no mundo todo.

 

Ela é uma das companhias que tentam se adequar à mudança da tecnologia automotiva utilizando sua experiência em motores elétricos. Ela decidiu vender uma unidade de propulsão para ônibus na qual está embutido o acionamento elétrico no interior da roda. A Ziehl-Abegg afirma que o chamado módulo de acionamento por eixo economiza energia porque não há necessidade de uma caixa de câmbio, o que reduz o atrito.

 

O módulo de acionamento por eixo da Ziehl-Abegg é usado por companhias que fabricam ônibus de turismo, transfer para o aeroporto e outros veículos especializados. Mas Ralf Arnold, diretor gerente da divisão automotiva da companhia, disse que tem sido difícil competir com importantes fabricantes de ônibus como a Daimler ou a MAN, unidade da Volkswagen.

 

O acionamento por eixo mostra também o perigo que a tecnologia elétrica representa para a indústria automotiva alemã. Mais de um século de experiência em motores a combustão interna e em transmissões poderá tornar-se irrelevante. As companhias automotivas alemãs constroem seus próprios motores, mas quase todas as células de bateria da Europa, que representam uma grande parcela do custo de um automóvel elétrico, são importadas da Ásia. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Jack Ewing, com tradução de Anna Capovilla)