O Estado de S. Paulo/Notas & Informações
Mexer com o dólar e outras moedas será mais fácil para exportadores, importadores e o chamado cidadão comum, se for aprovada a Nova Lei Cambial, desenhada pelo Banco Central (BC) e enviada nesta semana ao Congresso. As operações ficarão mais simples e mais contas em dólar poderão ser autorizadas no País. Hoje alguns tipos de companhias – de turismo, por exemplo – têm permissão para mantê-las. O número poderá crescer. Contas empresariais no exterior poderão ser usadas mais livremente. Hoje são utilizáveis só para a cobertura de despesas. Desemperrar o mercado cambial é um passo na direção de um objetivo mais complicado, a conversibilidade do real, explicou o diretor de Regulação do BC, Otávio Damaso, na apresentação do projeto.
A Nova Lei Cambial só deverá entrar em vigor um ano depois de aprovado o projeto, se prevalecer o atual planejamento. Haverá, portanto, um razoável período para o mercado se ajustar ao novo sistema e, talvez, para se encaminhar com segurança ao regime seguinte, o da conversibilidade.
Tornar conversível a moeda brasileira, conferindo-lhe cidadania internacional, foi a meta mais ambiciosa anunciada pelo presidente da instituição, Roberto Campos Neto, ao chegar ao posto no começo do ano. Esse objetivo foi reafirmado quando o banco apresentou sua nova agenda estrutural.
Em maio, o presidente do BC havia indicado o roteiro. Primeiro viriam medidas de simplificação. Mais tarde, num prazo de dois a três anos, o País poderia chegar à conversibilidade. Para simplificar, seria preciso rever, reorganizar e depurar uma legislação velha, em grande parte formulada entre as décadas de 1920 e de 1950. São mais de 420 artigos espalhados em cerca de 4o dispositivos legais. O projeto enviado ao Congresso reduz esse emaranhado a 27 artigos.
Além de limitar o manejo do câmbio, o regime ainda em vigor complica a operação das empresas com enorme burocracia. A exigência de informações é excessiva e os dados entregues a vários órgãos podem ser redundantes, comentou o diretor Otávio Damaso.
Complicação excessiva consome tempo, desperdiça trabalho e onera inutilmente a atividade empresarial. É parte do famigerado custo Brasil, um dos principais empecilhos à competitividade brasileira. Isso bastaria para justificar qualquer iniciativa de simplificação do câmbio ou, mais amplamente, de eliminação de conhecidos entraves ao bom funcionamento dos negócios.
Implantado o novo regime, mais operadoras poderão participar do mercado, tornando-o mais competitivo. O BC poderá autorizar o funcionamento de fintechs, empresas de tecnologia do setor financeiro, na área cambial, sem depender, como hoje, de vinculação a uma corretora ou a um banco.
Se for atingida a conversibilidade, o real poderá ser usado mais amplamente em vários tipos de operações, a entrada e saída de investimentos se tornará mais fácil, e a economia poderá operar com flexibilidade maior e custos menores. O real conversível, comentou há alguns meses o presidente do BC, poderá tornar-se moeda regional. Em cidades próximas da fronteira com o Brasil, já havia na ocasião, segundo acrescentou, demanda de abertura de contas em reais. Mas isso dependerá, observou o presidente do BC na mesma declaração, do avanço no cumprimento da pauta de reformas.
Essa observação é particularmente importante. Tem pouco sentido prático manter moeda conversível num país com graves desequilíbrios nas contas oficiais, dívida pública mal controlada, juros acima do padrão internacional e, talvez, vulnerabilidade externa. O País poderá ficar exposto a todos os componentes desse conjunto de riscos, em anos próximos, se a agenda de ajustes e reformas ficar emperrada. Evitar esse perigo dependerá da competência da equipe econômica – no planejamento e na execução de suas ações – e da habilidade política do Executivo e de sua base.
O BC tem feito sua parte, com a execução de uma agenda bem concebida e ordenada. Mas nem o corte de juros o BC poderá sustentar, se a pauta do Executivo ficar emperrada. (O Estado de S. Paulo/Notas & Informações)