Indústria em busca da virada

O Estado de S. Paulo

 

Reconquistar o vigor de oito anos atrás é o primeiro desafio para a indústria brasileira, depois de uma crise longa e devastadora. Será um longo caminho de volta. Em agosto, a produção industrial ficou 17,3% abaixo do pico alcançado em maio de 2011. Mas esse é o cenário visto de cima para baixo. De baixo para cima, será necessário um avanço de 20,96% para alcançar aquele ponto. Para esclarecer a diferença: de 100 para 80 há uma queda de 20%, mas de 80 para 100 a subida é de 25%. As dificuldades também são visíveis quando as comparações envolvem períodos curtos. O volume produzido cresceu 0,8% em agosto. É resultado bem-vindo, num ano de muita complicação, mas surgiu depois de uma queda de 0,9% acumulada nos três meses anteriores. Além disso, a produção foi 2,3% menor que a de um ano antes. Em 12 meses a queda foi de 1,7%, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 

Agosto foi o fundo do poço, disse no mês passado o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida. O crescimento, acrescentou, recomeçaria em setembro. A fraqueza da indústria pode ter confirmado a primeira parte desse comentário. Falta verificar a segunda, embora alguns sinais positivos já tenham sido notados.

 

O Brasil é um raríssimo caso de país emergente em desindustrialização. A produção industrial brasileira diminuiu 15% a partir de 2014, enquanto a do resto do mundo cresceu 10%, segundo estudos comparativos citados em reportagem do Estado. Mas a deterioração da indústria brasileira começou bem antes e já foi assinalada em 2012 pelo IBGE.

 

Embora faltem estudos amplos sobre o assunto, algumas causas do declínio são facilmente identificáveis: protecionismo anacrônico, estagnação do Mercosul, pouca inserção global, baixo investimento público e privado, incentivos mal dirigidos, financiamento inadequado, prioridades mal escolhidas pelo governo federal, infraestrutura deficiente, tributação disfuncional, escassez de capital humano e insegurança num ambiente de erosão dos fundamentos da economia.

 

A crise do setor industrial começou bem antes, portanto, da recessão prenunciada em 2014 e desencadeada plenamente nos dois anos seguintes. A partir da recuperação, em 2017, houve alguma oscilação no desempenho, mas até 2018 as comparações entre dados com intervalo de um ano mostraram uma firme tendência de melhora. No segundo semestre de 2018, esse padrão começou a mudar.

 

Entre janeiro e agosto do ano passado, só em maio o desempenho foi pior que o de um ano antes. Isso é explicável pela crise do transporte rodoviário. Entre janeiro e agosto de 2019, comparações com o ano anterior foram negativas em seis meses. Isso mostra de forma inequívoca um novo enfraquecimento do setor.

 

O declínio de longo prazo, assinalado a partir de 2012, é sem dúvida atribuível a erros da administração petista. A perda de vigor na segunda metade do ano passado é explicável em boa parte pela incerteza associada às eleições e à mudança de governo. Mas o agravamento do quadro, a partir do início deste ano, reflete claramente um novo problema. O governo iniciado em janeiro foi incapaz de atender à expectativa, registrada em várias pesquisas, de melhor desempenho da economia a partir da mudança presidencial.

 

Durante o primeiro semestre o novo governo simplesmente se recusou a considerar qualquer medida de estímulo à atividade. Menosprezou o desemprego de mais de 12 milhões de pessoas, tratando-o como questão menor.

 

Só depois, e sem explicar por que decidiu assumir uma nova atitude, o governo admitiu alguma iniciativa para facilitar o consumo – a liberação, iniciada apenas em setembro, de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do PIS-Pasep.

 

O presidente da República e seus auxiliares atribuem as dificuldades econômicas a governos passados, especialmente aos do PT. Erros petistas são inegáveis, mas o drama de 2019 tem a marca do novo governo, indiferente aos problemas de 25 milhões de desocupados, subempregados, desalentados e seus muitos milhões de familiares. (O Estado de S. Paulo)