Confiança baixa, PIB travado

O Estado de S. Paulo

 

A semana começa marcada por insegurança política e temor de desastre na economia.

 

Atenção se manteve no fim de semana, sem trégua, e a segunda-feira já começou marcada pela insegurança política e pelo temor de mais um desastre na economia, com estagnação na indústria, investidores assustados e desemprego elevado até o fim do ano. É preciso haver menos barulho em Brasília, disse logo cedo o presidente da bolsa paulista, a B3, Gilson Finkelsztain. O mercado de ações até se animou, mas o dólar voltou a subir, passando de novo de R$ 4,10, e a semana se abriu com novas previsões sombrias sobre o crescimento econômico, agora estimado em apenas 1,24%, e sobre o desempenho da indústria.

 

Ainda de manhã o presidente Jair Bolsonaro anunciou a intenção de enviar ao Congresso, logo depois de aprovada a reforma da Previdência, uma proposta de revisão do sistema tributário. Mas o dólar só recuou quando ele negou haver briga entre Poderes. Se Câmara e Senado têm uma “proposta melhor” para a Previdência, concedeu, “ponham em votação”.

 

Conflitos com o Congresso já foram negados em outros momentos, mas a ação real do governo está refletida na incerteza quanto a ajustes e reformas, no baixo nível de atividade e na piora das expectativas.

 

A mediana das projeções do mercado para este ano aponta crescimento de apenas 1,24% para o Produto Interno Bruto

 

(PIB). É pouco mais que a taxa de crescimento – 1,1% – contabilizada em cada um dos dois anos anteriores. Não se descarta, nesta altura, o risco de nova recessão. Na mesma pesquisa, a mediana das estimativas para a produção industrial acaba de recuar de 1,70% para 1,47%. Os números são da Focus, a consulta semanal do Banco Central a cerca de cem entidades financeiras e consultorias.

 

A indústria tem puxado para baixo o nível geral dos negócios. A produção industrial afeta uma teia muito ampla de atividades. Além disso, o setor é a principal fonte, no Brasil, dos empregos internacionalmente classificados como “decentes” – com carteira assinada, salários no mínimo razoáveis e benefícios indiretos, como acesso facilitado a planos de saúde.

 

A crise na Argentina, importante cliente, e o desastre da mineradora Vale em Brumadinho têm afetado os indicadores da indústria, mas o setor estaria em má situação mesmo sem esses fatores, como assinalam relatórios do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

 

Os números continuam ruins quando se exclui o segmento minerador e se considera apenas a indústria de transformação. O volume produzido no primeiro trimestre ainda é 1,9% inferior ao dos três meses finais de 2018 e 1,4% menor que o de janeiro a março do ano passado. Além disso, 20 dos 26 segmentos industriais identificados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentaram recuo no primeiro trimestre. A queda de vendas para a Argentina é, portanto, apenas parte de um quadro negativo muito mais amplo.

 

Sem surpresa, o Índice de Confiança do Empresário Industrial caiu 1,9 ponto em maio, para 56,5 pontos. Com quatro quedas consecutivas, o indicador baixou 8,2 pontos em quatro meses. Esse período corresponde a quase todo o mandato do presidente Jair Bolsonaro até agora. Se há algo surpreendente, é a permanência do índice acima de 50 pontos, na parte positiva, portanto, do cenário pesquisado mensalmente pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

 

Apesar da estagnação do setor neste começo de governo, empresários apostam em tempos melhores. Como ocorre frequentemente, as expectativas em relação à própria empresa são melhores que as avaliações do quadro geral da economia nos seis meses seguintes. Mas nem isso basta, como pesquisas têm mostrado, para estimular o investimento produtivo ou a acumulação de estoques. De toda forma, alguma boa disposição permanece e o governo cometerá mais um erro se desperdiçar esse fator.

 

Menos barulho em Brasília e mais articulação política são condições para o País funcionar e para animar investidores, lembrou o presidente da B3. Não se trata só da bolsa, mas do País. Falta o presidente absorver esse ponto. (O Estado de S. Paulo)