Guedes “dobra” Bolsonaro e Petrobrás reajusta diesel

O Estado de S. Paulo

 

A posição da equipe econômica se sobrepôs à vontade de Jair Bolsonaro para a política de preços da Petrobrás. Quase uma semana depois de o presidente barrar aumento de 5,7% no preço do diesel, a empresa anunciou ontem reajuste de R$ 0,10 por litro, alta de 4,8% na média. Segundo o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, Bolsonaro não foi avisado da decisão de ontem, costurada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que pediu estudos para possíveis mudanças na tributação dos combustíveis. Castello Branco afirmou que não tem planos de mexer na política de preços, mas deixou aberta a possibilidade de mudar a periodicidade. Ele creditou o reajuste menor à queda no custo com frete para importar o combustível.

 

Seis dias após suspender o reajuste de 5,7% no preço do diesel a pedido do presidente Jair Bolsonaro, a Petrobrás anunciou ontem um aumento de R$ 0,10 por litro, uma alta 4,8% na média. O novo valor, que começa a valer hoje, levará o preço a R$ 2,247 nas refinarias. A manutenção da atual política de reajustes de preços da petroleira foi considerada na Esplanada uma vitória da política liberal defendida pelo ministro da Economia Paulo Guedes sobre o impulso intervencionista do presidente.

 

Segundo fontes que acompanharam a reunião de Bolsonaro, na terça-feira, com Guedes, o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, e outros ministros, foi uma “conversa franca, sincera e compreendida”, em que o presidente insistiu que não gostaria de aumentar o preço do diesel, mas terminou por entender por que os preços precisavam subir.

 

“Estou aqui pra escutar”, afirmou o presidente ao abrir o encontro. Depois de ser apresentado à metodologia do reajuste, deu carta branca à estatal: “Eu não quero saber quanto e quando vai ser dado (o reajuste)”, teria afirmado.

 

Horas antes do anúncio oficial do aumento do preço, o assunto era tratado no grupo de WhatsApp “Equipe Econômica”, do qual participam pesos pesados do ministério, incluindo presidentes de bancos públicos. O Estado flagrou Guedes conversando sobre o tema durante a “Cantata de Páscoa” no

 

Palácio do Planalto, promovida por Bolsonaro. O presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, defendeu no grupo a privatização irrestrita para evitar situações como essa. “Se a Petrobrás fosse privada, em um ambiente de competição, toda esta celeuma em torno do preço do diesel não aconteceria”, afirmou. Ele disse que encaminhou a mesma mensagem a Bolsonaro. “Ele precisa perceber que a vida dele seria bem melhor se privatizasse tudo em um ambiente competitivo”. No grupo do WhatsApp, Novaes foi além e incluiu na defesa o próprio banco que administra. “Vale também para o BB, obviamente, pois é constante a choradeira nos ouvidos do presidente por questões relacionadas ao banco”. Bolsonaro já se manifestou contrário a privatização do BB e da Petrobrás.

 

Ontem, o presidente da petroleira criticou, em entrevista coletiva, o monopólio de mercado da Petrobrás no refino. Castello Branco afirmou que irá apresentar a proposta de venda de refinarias à diretoria executiva e depois ao conselho. “A venda das refinarias vai mostrar que a companhia não vai ter interferência externa”, disse. Costura. A “solução de mercado” para o impasse na Petrobrás foi costurada por Guedes. O ministro tenta encontrar alternativas para aliviar o preço dos combustíveis mudando a tributação, que representa 46% no valor do diesel. Ele também avalia que é preciso melhorar os mecanismos de reajustes da petroleira, mas esse trabalho deve ser conduzido pela empresa.

 

Castello Branco garantiu ontem não ter planos de mexer na política de formação de preços da Petrobrás. Segundo ele, a intenção é sempre buscar a paridade com os preços internacionais, embora a possibilidade de mudar a periodicidade não esteja descartada.

 

Guedes já manifestou que apoia a ideia de reajustar os valores mensalmente considerando uma média móvel de um determinado período.

 

Greve

 

A determinação de Bolsonaro para sustar o reajuste foi uma tentativa de evitar uma nova greve dos caminhoneiros, que no ano passado paralisou o País. Segundo Castello Branco, a companhia nada perdeu com o adiamento do reajuste, em função do uso de mecanismos de “hedge” – instrumentos financeiros que protegem as empresas de variações de custos.

 

O executivo creditou a magnitude menor do reajuste dado ontem em comparação à queda no custo com frete para importar o combustível. “O frete marítimo caiu e, por isso, o aumento foi menor do que o anunciado (na semana passada), de 5,7%”.

 

“Esse acontecimento teve final feliz: foi reafirmada a independência da Petrobrás para estabelecer os preços de seus combustíveis”, presidente da Petrobrás. (O Estado de S. Paulo/Denise Luna, Dida Sampaio, Tânia Monteiro, Adriana Fernandes, Naira Trindade e Vinicius Neder)