AutoIndústria
Há mais de vinte anos Fiat e General Motors disputavam a honra de ter o primeiro carro nacional com airbag: Tipo ou Vectra? A primeira argumentava que lançara o carro antes, a segunda que faturara seu produto ao cliente final primeiro – a GM chegou inclusive a enviar cópia da nota fiscal para a imprensa como prova de seu pioneirismo.
Passadas duas décadas, a montadora italiana, por pouco, não se envolve em nova disputa do gênero. Nesta terça-feira, 27, a empresa revelou que em 5 de novembro abriu as portas de sua primeira concessionária digital no Brasil. Coincidência ou não, a concorrente Volkswagen divulgou também na terça-feira que terá solução semelhante a partir de dezembro.
Desta vez, porém, não há dúvidas: a Fiat saiu na frente, ainda que por um mês. A primeira loja do gênero da marca pertence ao Grupo Amazonas e está localizada na avenida Pacaembu, ponto nobre da cidade de São Paulo. E em apenas duas semanas, já negociou quatorze veículos.
Trata-se de adaptação de casarão típico dos anos 40 e 50 – tão comum no bairro planejado e depois tombado. São 300 m² que abrigam não mais do que três carros expostos em sua “sala de estar” com ar-condicionado e outros quatro posicionados na parte externa e destinados a teste-drives.
Muito diferente das atuais e convencionais megalojas, com estrutura ampla de pós-vendas, oficinas e dezenas de pessoas circulando por área de até 5 mil m². Não há nem mesmo balcão de recepção ou guichês. Só dois ou três consultores de vendas para, somente quando solicitados, auxiliarem o cliente a, por exemplo, manusear os configuradores de carros ou de acessórios.
A própria comunicação visual externa da concessionária, diferenciada da rede convencional, sugere que ali o processo de consulta e compra de um automóvel foge do modo consagrado nos últimos cem anos. “O comportamento do consumidor mudou. Ninguém compra um carro sem antes interagir muito virtualmente com a marca. Por isso, temos que entregar no ambiente físico a continuidade do que ele encontrou no virtual”, pondera Herlander Zola, diretor da marca Fiat para a América Latina e diretor comercial da Fiat para o Brasil.
Assim, além de configuradores em grandes telas, o consumidor pode se valer de óculos de realidade virtual para “entrar” no carro que rigorosamente escolheu e que poderá ser comprado lá mesmo sem a impressão de uma única folha de papel. E, a menos que o consumidor deseje, nem para receber o carro novo será necessário voltar à revenda. O diretor da Fiat garante que o veículo será entregue na casa do cliente, sem qualquer custo adicional.
O ambiente é absolutamente distinto, com, por exemplo, tabletes para diversão das crianças, café, vestuário, espaço pets e vagas para bicicletas. Estacionamento? Para dois ou três carros apenas. “O atendimento na concessionária digital é customizado, a interação é mais fácil e direta”, ilustra Zola.
Ao ingressar na loja, o visitante encontra um totem de autoatendimento e pode inserir nele nome, email e telefone para gerar um QR code que impresso ou via SMS para identificá-lo em eventuais outras etapas da interação ou mesmo trazer informações de consultas prévias que o cliente tenha feito pela internet.
Há recursos ainda como câmera de reconhecimento facial na entrada e sensores que monitoram os deslocamentos dos clientes dentro da loja e definem um mapa de calor. Com isso, o concessionário pode reestudar o posicionamento dos carros e o layout da loja de forma a destacar mais um produto ou serviço em área mais procurada. É artifício já utilizado em muitos sites, que determinam onde estará uma oferta em função do maior índice de visualização.
Esse novo modelo de lojas, exclusivo ainda na Fiat em todo o mundo, tem, claro, outros ganhos para os concessionários e para a marca. Com ele, é possível ter representações em pontos onde hoje o custo do metro quadrado inviabiliza o investimento em grandes estruturas.
Caso o consumidor necessite de serviços de oficinas ou mesmo fazer a manutenção programada, basta que agende na concessionária digital a entrega e retirada do veículo que será encaminhado para a revenda convencional que necessariamente não estará tão distante.
A Fiat pretende ter cerca de 130 casas do gênero até o fim do ano que vem espalhadas em grandes cidades do Estado de São Paulo e capitais como Belo Horizonte, Recife, Rio de Janeiro e dos estados do Sul. A grande maioria, 110 delas, será fruto da transformação dos atuais showroons convencionais. “Com isso, os concessionários poderão aumentar, por exemplo, as áreas de oficinas”, afirma Tai Kawasaki, diretor de desenvolvimento de rede da FCA.
As demais vinte casas seguirão o padrão da primeira Amazonas, podendo inclusive ter área ainda menor. Os locais, claro, serão prioritariamente bairros nobres onde a Fiat não tem uma revenda convencional.
Zola aposta alto na nova proposta. Calcula que estes 130 pontos digitais – de um universo de 521 concessionárias – já devem responder por cerca de 30% das vendas da marca no Brasil em 2020. Ele admite que a empresa trabalha, contudo, simultaneamente no desenvolvimento de outras fórmulas, com a venda integralmente on-line. Hoje, negócios pela rede de computadores esbarram em dois aspectos: os 60% de carros financiados e os até 50% de veículos usados que servem como entrada.
Mas até isso deve mudar rapidamente, no entender do executivo. “Já se consegue aprovar crédito por meio do nosso site e já estamos estudando a avaliação virtual, por meio de fotos em posições determinadas e alguns outros parâmetros como quilometragem. É uma solução que existe no exterior e que podemos adotar aqui em breve”. (AutoIndústria/George Guimarães)