Superficialidade de Haddad e Bolsonaro faz setor automotivo prever pé no freio em 2019

Gazeta do Povo

 

A indústria automobilística brasileira prevê uma desaceleração do crescimento do mercado de automóveis e comerciais leves em 2019. Neste ano, as vendas devem crescer 13%, para 2,46 milhões de unidades. No próximo, a alta deve ficar entre 5% e 10%. A previsão é resultado das incertezas econômicas e políticas que rondam o país.

 

Ainda assim, essa melhora vai depender da manutenção de fatores econômicos como continuidade da redução de juros, da inadimplência, da retomada da confiança de consumidores e da queda no nível de desemprego – além da aprovação do Programa Rota 2030, a nova política industrial do setor publicada via MP e que seria apreciada após o primeiro turno das eleições, mas ainda não saiu do lugar.

 

Também há incertezas na área política, como sobre a capacidade de governabilidade e de obter apoio do Congresso para aprovação de medidas do próximo presidente da República – independente de quem for eleito. Os níveis de investimento estrangeiro também caíram em razão de todo esse cenário. Segundo dados da Conferência da ONU para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), o país caiu, no primeiro semestre, do 6.º para o 9.º lugar entre os principais destinos de investimentos. De janeiro a junho, foram enviados para cá US$ 25,5 bilhões, uma queda de 22% ante os US$ 32,6 bilhões do mesmo período de 2017.

 

“É muito difícil prever o ano que vem sem ter um horizonte de política econômica”, disse o vice-presidente da Ford, Rogelio Golfarb. Segundo ele, ainda há pouca clareza sobre como os dois candidatos pretendem recuperar a economia e lidar com a indústria.

 

“A questão não é se será A ou B, mas o que A ou B vai fazer quando sentar na cadeira. O setor produtivo espera essa definição”, disse Golfarb. Ele e vários executivos do setor participaram ontem, em São Paulo, de seminário para debater as previsões para 2019, promovido pela editora AutoData.

 

Para o presidente da Volkswagen, Pablo Di Si, “o ritmo de crescimento vai desacelerar, mas não é desprezível”. Ele ressaltou que as fábricas de carros no ABC paulista, em Taubaté (SP) e no Paraná, além da unidade de motores em São Carlos (SP) operam com baixa ociosidade e fizeram contratações recentes.

 

Apesar disso, mais de 3 mil trabalhadores do grupo, segundo sindicatos de metalúrgicos, estão em férias coletivas. O motivo, explicou o executivo, é a queda de exportações para a Argentina, principal cliente da marca.

 

No início do próximo ano, a empresa deve anunciar novo investimento extra para a produção de um carro compacto que está sendo desenvolvido no País. Hoje, a montadora segue um plano de R$ 7 bilhões a serem aplicados até 2020, montante que inclui 20 lançamentos, dos quais 11 foram lançados nos últimos 12 meses.

 

A dificuldade em se conseguir aval e novos investimentos das matrizes

 

O presidente da FCA Fiat Chryler, Antonio Filosa, esteve em Londres, na Inglaterra, para discutir com acionistas da empresa aportes para um novo automóvel a ser produzido no Brasil (na fábrica da Jeep, em Pernambuco, ou da Fiat, em Minas Gerais).

 

O novo carro está inserido no plano de R$ 14 bilhões anunciado recentemente pelo grupo até 2023 – que inclui 25 lançamentos no Brasil e na Argentina, entre modernização de modelos e carros inéditos, sendo que dois deles já foram aprovados. Apesar do plano já aprovado, a filial brasileira “não tem cheque em branco com liberdade total de gastar”, por isso precisa falar com os acionistas para aprovar cada projeto.

 

Filosa disse que levará todas as projeções positivas que a companhia tem sobre a economia brasileira para o próximo ano. “Não é fácil explicar sobre o Brasil, ma nosso acionista não vai desistir pois tem confiança no País”, afirmou, ressaltando que, na maior crise local o grupo investiu em uma fábrica nova (a unidade da marca Jeep, em Pernambuco, inaugurada em 2015), e que opera em três turnos.

 

Apesar dos números apresentados pelo setor automotivo neste ano, de crescimento de 14% das vendas totais até setembro, num total de 1,846 milhão de unidades, Golfarb, da Ford, ressaltou que a maior parte dessa alta vem das chamadas vendas diretas.

 

São negócios fechados diretamente pelas fábricas com clientes como locadoras e frotistas, feitas com elevados descontos. Em outubro, 42% das vendas foram nessas condições, ação considerada não saudável para os resultados financeiros das empresas. Em 2013, por exemplo, essa participação era de 24%.

 

O presidente da filial brasileira da Mercedes-Benz, Philipp Schiemer, também relata dificuldades semelhantes. Segundo ele, está difícil convencer a matriz da empresa na Alemanha a trazer novos investimentos para o Brasil, em meio a tantas incertezas em relação ao futuro do país, e os executivos globais se sentem mais inclinados a investir nos mercados asiáticos.

 

Schiemer garantiu que o atual plano de investimentos da montadora, de R$ 2,4 bilhões até 2022, não está em risco. No entanto, contou que teme pelos anos seguintes. “O ciclo de investimento é de longo prazo, então, uma vez tomada a decisão, não se muda. Mas, quando estamos discutindo investimentos para 2023 e 2024, eu fico preocupado”, disse o executivo. O presidente da Mercedes lamentou que o segundo turno da eleição presidencial esteja sendo disputado por dois candidatos que ele considera serem “extremos”, mas ressaltou que terá de aceitar o resultado e garantiu que vai trabalhar com qualquer um deles.

 

Exportações para Argentina também preocupam

 

Outra preocupação para 2019 é a continuidade da queda de exportações para a Argentina, que devem ficar igual ou inferior às previstas para este ano, que já serão 8% menores que os números de 2017, segundo informou Antonio Megale, presidente da Anfavea, a associação dos fabricantes de veículos no País.

 

O setor de veículos pesados, que deve crescer 35% neste ano, com vendas de 86 mil unidades e produção de 120 mil, mantém ociosidade de 75%. “Em 2019 deveremos ter crescimento de dois dígitos, porém baixos”, disse Roberto Cortes, presidente da Volkswagen Caminhões e Ônibus. “É difícil ter rentabilidade mínima nessas condições”. (Gazeta do Povo)