Grandes montadoras já oferecem caminhão que quase anda sozinho

Correio Braziliense

 

Quatro anos atrás, na cidade alemã de Hannover, a Mercedes-Benz apresentou ao mundo, em um evento para milhares de convidados, o mais ambicioso e revolucionário projeto da história da companhia: o Future Truck 2025. Assim que as cortinas se abriram, foi revelado o protótipo de um caminhão completamente autônomo, que dispensava o motorista para acelerar, frear, fazer curvas de qualquer ângulo e percorrer mais de 12 horas pelas estradas europeias sem qualquer parada.

 

“O caminhão do futuro é a resposta para dezenas de desafios da indústria global de logística, desde a questão do aumento da produtividade até o da segurança viária”, afirmou o Georg Stefan Hageman, executivo que chefiou o time de engenheiros e projetistas do caminhão do futuro. “Acredito que em dez anos, com o lançamento comercial do nosso caminhão, toda a indústria vai se transformar e colocar em circulação seus caminhões autônomos”.

 

Ao olhar no retrovisor, é possível afirmar que Hageman quase acertou – pelo menos no cálculo. Isso porque, mesmo no Brasil, os veículos autônomos já são uma realidade. A própria subsidiária brasileira da Mercedes-Benz tem apostado cada vez mais na condução autônoma.

 

“Quando os clientes pedirem e o mercado estiver suficientemente maduro para operar com caminhões e ônibus elétricos e autônomos, estaremos prontos para atender todas as demandas, com produtos e serviços que assegurem eficiência, produtividade, custo operacional adequado e a rentabilidade desejada”, diz Roberto Leoncini, vice-presidente da divisão de caminhões e ônibus da Mercedes-Benz do Brasil. “Pela facilidade de recarga das baterias nas cidades, acreditamos que os primeiros veículos elétricos serão do segmento de leves em aplicações de distribuição urbana, e isso igualmente acontece com os ônibus elétricos, que também vão operar inicialmente no transporte coletivo urbano.”

 

A disputa nesse segmento promete ser acirrada. No início deste mês, a sueca Volvo entregou sete unidades de seu caminhão com tecnologia autônoma para o Grupo Usaçúcar, de Maringá, no Paraná. Sem abrir mão do motorista, os veículos andarão sozinhos apenas quando estiverem em áreas restritas, sem trânsito, dentro das lavouras de cana de açúcar. A altíssima precisão de direção (2,5 cm) reduz perdas por pisoteio de mudas.

 

“Dissemos que esse seria o primeiro caminhão com tecnologia autônoma comercialmente viável do mercado. Agora provamos isso com a entrega de um lote de veículos já para a colheita de cana-de-açúcar de 2018”, afirma Wilson Lirmann, presidente da Volvo na América Latina. O veículo foi desenvolvido pela área de engenharia avançada no Brasil, com apoio da matriz na Suécia. Com o negócio, a Volvo se tornou a primeira marca a fazer a entrega comercial de um caminhão com tecnologia autônoma no mundo.

 

Assim como os caminhões, a Volvo aposta na direção autônoma para sua divisão Volvo Bus, Volvo Equipamentos de Construção e Volvo Penta, voltado a veículos marítimos. No caso do agronegócio, o sistema funciona por comando de satélite. Depois de inserir o mapa do canavial no computador de bordo, a solução reconhece fielmente as linhas na plantação.

 

Os engenheiros da marca em Curitiba se dedicaram a desenvolver o Volvo VM especialmente para o setor sucroalcooleiro. Especialistas da fabricante na Suécia colaboram no projeto. Eles aplicam tecnologias, inéditas no Brasil, já disponibilizadas pela Volvo lá fora. Entre as muitas vantagens pesquisadas, a operação autônoma garante benefícios ambientais. A economia de combustível usado nas máquinas baixa o volume de emissões de CO2 e particulados. As equipes que supervisionam o processo todo permanecem confortavelmente instaladas a quilômetros de distância para visualizar a sequência da operacionalidade.

 

Realidade

 

Assim como Volvo e Mercedes-Benz, algumas empresas já começam a enxergar a tecnologia autônoma como uma realidade. A mineradora Vale é um exemplo. Tanto é que o volume de minérios carregados na jazida de Brucutu, em Minas Gerais, aumentou 26% graças aos caminhões autônomos guiados através do GPS.

 

A companhia colocou em prática um sistema que permite à central de comando a distância o mais rígido controle sobre os enormes veículos. O procedimento dispensa completamente a interferência do homem no transporte do minério de ferro. No entanto, utiliza mineradores da Caterpillar, que se uniu à Vale para desenvolver ágeis mecanismos compostos de GPS, radar e inteligência artificial.

 

Além de ampliar os itens de segurança, a empresa elevou em 15% os limites de vida útil dos equipamentos. A Vale pretende atingir o total de 13 caminhões até 2019. Até agora os investimentos chegam a US$ 62 milhões na estrutura de automação dos veículos, que medem 13 metros de comprimento e podem conduzir 240 toneladas de minérios.

 

No caso de Brucutu, os operadores foram deslocados para outras funções na própria mina ou em diferentes unidades pertencentes à Vale. Alguns passaram a trabalhar na gestão e controle dos equipamentos autônomos. Antes, submeteram-se a cursos de capacitação, que podem durar até dois anos.

 

A tendência é que a Vale crie oportunidades a profissionais de alta qualificação nas áreas técnicas e de engenharia de automação, robótica, além de tecnologia da informação. “As tecnologias para a implementação dos veículos já existem e estão nos centros de pesquisas das principais montadoras do mundo, mas questões de segurança, infraestrutura e legislação ainda precisam ser aprimoradas para que a novidade se consolide como uma realidade”, diz Antonio Megale, presidente da Anfavea, a associação das montadoras.

 

Graus de autonomia

 

Conheça os estágios de autonomia que hoje existem nos veículos (em uma escala de 0 a 5)

 

Nível 0: todos os principais sistemas são controlados por seres humanos

Nível 1: certos sistemas, como o controle de velocidade de cruzeiro ou a frenagem automática podem ser controlados pelo veículo, um de cada vez

Nível 2: o veículo oferece pelo menos duas funções automáticas simultâneas, como aceleração e direção, mas requer seres humanos para a operação segura

Nível 3: o veículo pode gerenciar todas as funções críticas de segurança sob certas condições, mas o motorista deverá assumir quando alertado

Nível 4: o veículo é totalmente autônomo em alguns cenários de condução, embora não todos

Nível 5: veículo é completamente capaz de autonomia em todas as situações

(Correio Braziliense/Nelson Cilo)