O Estado de S. Paulo/The New York Times
A dúvida sobre quem substituiria Sergio Marchionne estava no ar havia mais de um ano, desde que o principal executivo da Fiat Chrysler Automobiles (FCA) anunciou que deixaria o cargo em 2019. Mas a forma como chegou a resposta foi chocante e triste. A morte de Marchionne, aos 66 anos, foi confirmada ontem, resultado de complicações após uma cirurgia. O estado crítico de saúde do executivo havia levado a Fiat a anunciar, no último sábado, Mike Manley, chefe da Jeep e da Ram, como o novo líder do grupo.
Manley teve pouco tempo para se preparar. Ontem, ele abriu a apresentação dos resultados do segundo trimestre da FCA com uma homenagem ao antecessor, um “homem especial e único”. Embora tivesse de explicar a queda na receita e lucros e uma redução nas previsões para 2018, Manley pôde confirmar que a empresa estava finalmente livre de dívidas, uma das principais metas de Marchionne. O ex-CEO conseguiu se livrar de uma pilha de US$ 13 bilhões em débitos.
Marchionne é considerado uma das maiores estrelas de todos os tempos na indústria automobilística, tendo resgatado a Fiat da quase falência em 2004 e repetido o truque na Chrysler, em 2009. Trabalhando duro até para os padrões de altos executivos, ele alegou que seu traje habitual, um suéter preto, o poupava de perder tempo escolhendo um terno. Ele podia ser brusco, mas também era erudito e franco em uma época em que os chefes se tornaram cada vez mais cautelosos.
A formação de contador o ajudou a ter uma visão clara sobre as deficiências da empresa. Por isso, ele propôs megafusões para dividir custos. Outros executivos de indústrias automobilísticas compartilhavam de seu diagnóstico, mas preferiram alianças vagas, que geram economias, mas não na escala de uma fusão. Marchionne foi um dos poucos que conseguiram êxito ao unir gigantes. E estava sempre à procura de oportunidades – alguns analistas sugeriram que ele estaria elaborando uma última grande transação antes de morrer.
Qualquer negócio desse tipo será agora com Manley. A FCA sempre prometeu que o sucessor de Marchionne viria de dentro. Manley, britânico e ex-vendedor de carros, subiu na empresa chegando a liderar a divisão Jeep. Esteve fortemente envolvido no mais recente plano de cinco anos, que fala em grandes saltos em vendas e lucratividade.
Manley não terá tarefa tão difícil quanto a de Marchionne. Além de cortar gastos e unir Fiat e Chrysler, o executivo morto ontem desmembrou empresas como a CNH, o braço industrial da Fiat, e a Ferrari, fabricante de carros esportivos. E preparava o negócio de peças da empresa, para uma vida própria. Além disso, investiu em SUVs populares e lucrativos nos EUA antes da Ford e da General Motors. E redirecionou fábricas na Itália para marcas premium como Alfa Romeo e Maserati.
Isso não significa que o trabalho de Manley será fácil. O plano de cinco anos prevê a venda de mais caminhonetes Jeep e Ram, que já geram dois terços das receitas. Manley também terá de lidar com a ameaça de uma guerra comercial, a emergência dos carros elétricos, veículos autônomos e dos serviços de mobilidade. Fará isso sem ajuda de Alfredo Altavilla, executivo rival na disputa pelo cargo de Marchionne, que deixou a FCA na segunda-feira.
A escolha de Manley foi decisão de John Elkann, presidente da Exor, holding a família Agnelli, controladora do grupo. Agora, terão de enfrentar os novos desafios de mercado enquanto a concorrência para a Fiat – hoje a sétima montadora do mundo – não para de crescer. O feito de Marchionne é que ele construiu um grupo que, por enquanto, é forte para se manter sozinho, caso seja necessário. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Laura Mcdermott, tradução de Cláudia Bozzo)