Tabelar frete é ilegal e estimula formação de cartel, diz Cade

O Estado de S. Paulo

 

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) enviará hoje ao Supremo Tribunal Federal parecer em que afirma que o tabelamento do frete rodoviário, feito pelo governo federal após acordo com caminhoneiros, cria uma espécie de cartel, tem graves efeitos ao consumidor, prejudica o mercado e representa afronta à livre concorrência, informa Lorenna Rodrigues. Uma das críticas é que a Medida Provisória 832 estabelece fixação de preços com participação de cooperativas e sindicatos de transporte de cargas, que concorrem entre si. A manifestação do Cade foi feita a pedido do ministro Luiz Fux, relator de ações que questionam a constitucionalidade da medida. Sua decisão deve ter forte impacto. Caminhoneiros dizem que, sem o tabelamento, podem voltar a fazer greve.

 

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) enviará hoje ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer em que afirma que o tabelamento do frete rodoviário, feito após um acordo feito pelo governo federal para encerrar a greve dos caminhoneiros, cria uma espécie de cartel, tem graves efeitos ao consumidor, prejudica o mercado e representa uma afronta à livre concorrência.

 

No documento, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso, o Cade faz duras críticas à criação da tabela de preços mínimos pela Medida Provisória 832. A manifestação do Cade foi feita a pedido do ministro do STF Luiz Fux, relator de ações que questionam a constitucionalidade da medida. Na quarta-feira, Fux enviou questionamento à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), ao Ministério da Fazenda, à Advocacia-Geral da União (AGU) e ao Cade, e fixou prazo de 48 horas para o governo se manifestar sobre o preço mínimo dos fretes.

 

A decisão do ministro sobre a MP pode ter um forte impacto para o País. Os caminhoneiros têm dito que, sem o tabelamento do frete, podem até voltar a paralisar as atividades.

 

Na última sexta-feira, a Fazenda enviou posicionamento contrário ao tabelamento. A conclusão foi de que a tabela inibe a concorrência e deve elevar custos. A AGU, por sua vez, defendeu a medida e afirmou que o princípio da livre concorrência não é ferido, porque ele deve ser compreendido em análise conjunta com um trecho da Constituição segundo o qual, quando o poder econômico é exercido de maneira “antissocial”, cabe ao Estado intervir para coibir o abuso.

 

O Cade traz o parecer mais severo sobre a impropriedade da medida. O conselho deixa claro que o tabelamento “não apresenta benefícios ao adequado funcionamento do mercado e ao consumidor final, que arcará com os aumentos de preço decorrentes de tal medida”. E lembra ainda que o entendimento do Cade ao longo dos anos é que o tabelamento de preços é uma infração à ordem econômica, passível de condenação. Problema. O preço mínimo para o frete virou uma armadilha para o governo. Já foram editadas duas versões da tabela. A primeira – que está em vigor – atendeu aos caminhoneiros, mas revoltou o agronegócio, que fala em aumentos de até 150% nos preços. A segunda procurou aliviar

 

o custo aos produtores, mas contrariou os caminhoneiros. O governo a revogou. Uma terceira versão está em discussão. Mas o que o STF está avaliando é a constitucionalidade do tabelamento.

 

Fux exigiu um posicionamento do governo sobre isso, no âmbito de uma ação direta de inconstitucionalidade movida pela Associação do Transporte Rodoviário de Cargas do Brasil (ATR Brasil). A associação alega que a tabela “decreta o fim da livre iniciativa e da concorrência para ‘acalmar’ uma categoria furiosa, e irá, ao fim e ao cabo, liquidar as empresas de transporte rodoviário de ‘commodities’”.

 

O Cade cita decisões em que condenou tabelas de preços, como nos setores de serviços médicos, frete de combustíveis e agências de viagens, e no próprio setor de transporte de carga e logística, tomada este ano. “O Cade já analisou este tipo de situação e afirmou de maneira muito categórica de que há grande possibilidade de esse tipo de tabela gerar prejuízos à sociedade brasileira”, reforça.

 

Uma das críticas é que a MP estabelece que os preços serão fixados com a participação de representantes das cooperativas e de sindicatos de transportes, que concorrem entre si, o que estimula que combinem comportamentos e caracteriza uma espécie de cartel. Outro ponto é que, ao estipular um custo padrão, quem tem preço inferior poderá lucrar com os valores mínimos estabelecidos, já que não poderá cobrar abaixo da tabela. (O Estado de S. Paulo/Lorenna Rodrigues, Lu Aiko Otta, Amanda Pupo, Rafael Moura e Dida Sampaio)