O Estado de S. Paulo
Atão esperada reforma do serviço de ônibus da capital – de acordo com os critérios e exigências contidos no edital de licitação para a contratação das concessionárias, publicado terça-feira passada – prevê mudanças que podem resultar em benefícios para os passageiros, tanto no tempo de deslocamento como no conforto. Como o pretendido aumento da concorrência será limitado – a maior parte das empresas vencedoras certamente será constituída por aquelas que há muito dominam esse mercado –, o êxito da reforma vai depender numa boa medida do rigor da fiscalização no cumprimento dos contratos.
O serviço vai operar com três sistemas, um a mais do que atualmente: um que funcionará dentro dos bairros, com ônibus menores; outro com veículos de médio porte que ligarão os bairros aos grandes corredores; e o terceiro com ônibus grandes que utilizarão avenidas e corredores no acesso ao centro. Numa aposta ousada, o plano reduzirá o número de ônibus de 13.591 para 12.945. Isso deve ser compensado por mais ônibus de grande porte. E também pela racionalização do serviço, que terá como um de seus itens principais a reformulação das linhas, uma medida há muito reclamada por especialistas.
As linhas serão reduzidas de 1.334 para 1.193, com o que se pretende eliminar sobreposições com trajetos idênticos, que tornam o sistema mais caro, porém sem nenhum benefício para o usuário. Hoje há áreas em que existe superoferta de ônibus. Além da economia, isso tornará o sistema mais eficiente. A Prefeitura garante que a reforma permitirá tanto aumentar de 4.680 km para 5.100 km a extensão coberta pelas linhas de ônibus como oferecer um número maior de vagas. Tanto é assim que se prevê a atração de 952 mil novos passageiros/dia.
Para isso terão papel importante também dois avanços dados como certos pelo secretário municipal de Mobilidade e Transporte, João Octaviano. Um é o aumento da velocidade média do sistema, que hoje oscila entre 18 km/h e 20 km/h e deve chegar a 25 km/h. Outro são as melhorias exigidas para dar maior conforto aos passageiros, principalmente a substituição progressiva dos ônibus atuais por outros com ar condicionado, Wi-Fi, tomadas USB, câmeras de vigilância e rampas de acessibilidade.
Um dos itens principais da reforma, porque mexe num ponto sensível para as poderosas empresas que há muito controlam o setor, é a sua nova forma de remuneração. Hoje, ela é calculada tomando por base os custos fixos para operar uma linha com número determinado de partidas por hora. Esse valor é em seguida dividido pelo número estimado de passageiros. Pelo novo contrato, as empresas só receberão a remuneração completa, apurada dessa forma, se pesquisas de satisfação dos usuários mostrarem aprovação da linha, e se os índices de qualidade – entre os quais se inclui a diminuição de acidentes – atingirem grau de excelência. O conjunto das medidas previstas pela reforma deve, de acordo com Octaviano, reduzir o lucro das empresas, considerado alto: “A taxa de retorno delas vai cair de 14% para 9,8%”.
O tempo dirá se os ambiciosos objetivos fixados para os contratos com as novas concessionárias – com duração de 20 anos, no valor de R$ 67,5 bilhões – serão de fato atingidos. Só o aumento tímido da concorrência – de 22 para 29 empresas, com fatal maioria formada pelas já presentes no mercado – certamente não será suficiente para eliminar certa tendência verificada nesse meio de encontrar formas de burlar as regras. Os resultados de duas auditorias do Tribunal de Contas do Município, divulgados no ano passado, mostrando irregularidades cometidas por três consórcios de empresas, que acarretaram prejuízo de quase R$ 2 bilhões ao Município, não deixam dúvida com relação a esse risco.
Para que a reforma dê certo será indispensável maior rigor na fiscalização das novas regras. Os milhões de paulistanos que utilizam o serviço de ônibus e por ela esperam há tanto tempo merecem esse esforço da Prefeitura. (O Estado de S. Paulo)