Uso da capacidade das fábricas volta ao normal em 52,4% dos setores industriais

O Estado de S. Paulo

 

Apesar da recuperação lenta da economia, a indústria começa a desatar um nó importante para a volta dos investimentos. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que 52,4% dos setores da indústria de transformação já voltaram ou estão perto de voltar ao padrão histórico de ocupação da capacidade das fábricas.

 

A ocupação das linhas de produção vem acontecendo de forma gradual e ainda há pesos-pesados, como as indústrias de automóveis e metalúrgica, entre os retardatários do processo. Mas, desde novembro, a indústria vem usando por volta de 78% de sua capacidade produtiva, um nível de aproveitamento que não era visto havia 20 meses. Apesar de mostrar muita oscilação, o dado engatou trajetória de alta quando, no começo do ano passado, o consumo dos produtos no Brasil começou a sair do buraco e se encontrou com o crescimento das exportações, até então a válvula de escape das empresas diante da falta de demanda interna.

 

Com isso, alguns setores já voltaram a operar dentro de um nível considerado normal de utilização da capacidade produtiva. Números calculados pela CNI a pedido do Estadão/Broadcast mostram que, entre novembro e fevereiro, cinco dos 21 ramos da indústria de transformação operaram em patamar parecido ou até acima da média histórica de uso da capacidade instalada – entre eles, as indústrias de papel e celulose e farmacêutica.

 

Outros seis setores – numa lista que inclui as fábricas de produtos têxteis, de vestuário e de móveis – estão perto de voltar à normalidade, apresentando uma ociosidade inferior a 1% em relação à média histórica. As fábricas, vale observar, costumam preservar uma folga em relação ao potencial máximo de produção para não serem surpreendidas por momentos de superaquecimento de demanda. “Alguns setores já estão conseguindo colocar o nariz para fora d’água”, disse Marcelo Azevedo, economista da CNI.

 

Distância

 

Abaixo dessa “linha d’água”, dez atividades estão mais longe de resolver a questão da ociosidade deixada pela crise. Esse grupo inclui setores de grande peso na atividade industrial, casos das indústrias automobilística, metalúrgica e de produtos químicos, assim como os fabricantes de alimentos e bebidas. Somados à indústria de máquinas e equipamentos, e a outros ramos também presentes nessa lista, representam 41% do PIB industrial.

 

“Ninguém quer administrar novamente uma situação de excesso de estoque nos pátios das fábricas porque isso significa grande prejuízo. Para religar máquinas e contratar mais, as empresas precisam ter certeza sobre o que vem pela frente”, disse o economista da CNI. “De qualquer forma, isso está ficando cada vez mais viável.”

 

Ociosidade menor abre espaço para investimento

 

A queda da ociosidade na indústria, mesmo que em um ritmo considerado abaixo do esperado, reforça as previsões positivas sobre os investimentos no Brasil, que devem interromper em 2018 quatro anos seguidos de encolhimento. Pelos cálculos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os investimentos líquidos – aqueles que adicionam capacidade produtiva na economia – voltarão a crescer num ritmo anual próximo de 20% neste e no próximo ano.

 

Mesmo que ainda haja ociosidade na indústria – a produção segue 17,8% abaixo do pico registrado em junho de 2013 – e que a economia continue crescendo menos do que o seu potencial até o ano que vem, o coordenador do grupo de estudos de conjuntura do Ipea, José Ronaldo de Souza Júnior, diz que o atual estágio da recuperação econômica demanda mais investimentos em modernização de processos, bem como em linhas de novos produtos. “Além disso, há setores, como o da indústria extrativa mineral e de infraestrutura, que precisam ampliar a capacidade instalada”, acrescenta o pesquisador. Cenário. Não por acaso, se as previsões da maioria dos economistas estiverem corretas, o consumo das famílias e a Formação Bruta de Capital Fixo, sinônimo de investimentos, serão os motores do crescimento econômico de 2018, estimado em 2,8% pelo mercado.

 

A leitura dos economistas é que, depois de um período de cortes nos investimentos, as empresas voltarão a investir porque vivem hoje uma situação de maior equilíbrio financeiro, após os programas de redução de dívidas e de reestruturação executados durante a crise. Além disso, os cortes na taxa básica de juros (Selic) sugerem alívio no custo dos financiamentos, ainda que eles não tenham sido totalmente repassados aos tomadores finais de crédito.

 

Essa maior propensão a investir foi capturada em pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) que apurou que a intenção de investimentos chegou, no primeiro trimestre, ao nível mais alto desde o fim de 2013. A FGV constatou que o total de indústrias dispostas a elevar investimentos nos próximos 12 meses voltou a ser maior do que o número que planeja reduzir.

 

Sinais de que os investimentos estão saindo do estado de letargia também são dados pelas importações de bens de capital – com alta de 14,5% no primeiro trimestre, frente ao mesmo período do ano passado – e pelo crescimento de 3,8%, ainda no comparativo com o ano anterior, dos investimentos no último trimestre de 2017. Foi a primeira alta desse componente do PIB no comparativo ano a ano em quase quatro anos.

 

“Em tese, os setores que estão mais próximos de resolver o problema da ociosidade devem ser os primeiros a retomar os investimentos em expansão industrial”, disse Marcelo Azevedo, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI). (O Estado de S. Paulo/Eduardo Laguna)