Impasse do Rota 2030 pode levar ao congelamento de novos investimentos, dizem montadoras

Auto Esporte

 

A demora do governo em colocar em prática o novo regime automotivo, chamado de Rota 2030 está causando uma onda de incertezas na indústria automotiva. Isso porque, após o fim do último regime, o Inovar-Auto, uma série de questões ficou sem resolução.

 

É o caso de metas para redução no consumo de combustível e emissões de poluentes, redução de impostos para veículos produzidos no país e, principalmente, incentivo a investimentos em pesquisa e desenvolvimento no país.

 

Como as fabricantes trabalham com grandes investimentos em prazos mais longos – em média um carro leva de 3 a 4 anos para ser projetado –, uma possível consequência da indefinição deverá ser vista só nos próximos anos.

 

Congelamento de novos projetos

 

Nas empresas, o discurso é de que uma demora pode causar congelamento e até mesmo cancelamento de investimentos importantes para o país.

 

A opinião é compartilhada por Fabrício Biondo, vice-presidente de relações externas da PSA, dona das marcas Peugeot e Citroën. O grupo anunciou recentemente que produziria o Citroën C4 Cactus no país.

 

Mesmo assim, de acordo com as empresas, futuros projetos estão sob risco de atrasarem ou mesmo de não saírem do papel.

 

“Existem dois momentos. Um em que você pode parar e não investir mais. Outro em que não dá mais para parar de investir porque ficaria muito mais caro. Tem bastante coisa chegando ao momento de se tomar uma decisão”, completou Biondo.

 

Concorrência de outros países

 

Outra consequência é o Brasil perder investimentos e a produção de modelos futuros para países vizinhos.

 

Na América Latina, a PSA tem fábricas em Porto Real (RJ) e na Argentina. A empresa estuda a produção de veículos sobre uma nova plataforma, que atenderia todos os critérios de segurança exigidos até 2023, assim como uma nova família de motores.

 

Perguntado se existe a possibilidade de investimentos migrarem do Brasil para a unidade do país vizinho, Biondo foi enfático:

 

A Renault lançou recentemente uma nova geração do Duster na Europa. É praticamente certo que o modelo seja vendido no Brasil a partir do ano que vem. No entanto, a produção em São José dos Pinhais (PR), como acontece hoje, pode estar ameaçada.

 

Isso porque a Renault colombiana também produz o SUV atual, e pode largar na frente para fazer a próxima geração. Caso a filial brasileira demore demais na decisão de desenvolver e produzir o modelo, a solução seria importar o novo Duster do país vizinho.

 

“Essa indefinição me coloca em uma posição de desvantagem frente à minha competição com os outros países. Como não existe uma definição, a gente fica um pouco em “stand-by”, esperando para ver o que vai acontecer”, diz Pedrucci.

 

Aliás, a fábrica do Paraná perdeu as exportações do Duster atual para a Argentina. A medida não tem relação com o Rota 2030, mas sim com menores custos de produção dos colombianos diante dos brasileiros. De acordo com Pedrucci, 15 mil unidades do modelo deixarão de ser exportadas.

 

Já a Toyota investiu R$ 100 milhões para abrir seu primeiro centro de pesquisa e desenvolvimento no Brasil. Tudo para cumprir metas estabelecidas pelo Inovar-Auto. Agora, sem uma clareza do que pode acontecer, a marca cogita outras possibilidades.

 

Linhas defasadas

 

Com investimentos em novos produtos congelados ou cancelados, uma saída para quem fabrica no Brasil é esticar ao máximo o ciclo de vida dos produtos vendidos por aqui.

 

“A vida útil deve ser a maior possível. A vida média de um modelo é de 6 a 7 anos. Dependendo de quando sair o Rota 20130, veremos quais dos nossos produtos combinam com a necessidade do mercado”, afirma o presidente da Audi.

 

No caso da PSA, a fabricante pode trocar um novo motor pela manutenção de um já existente. “Podemos atrasar o desenvolvimento desse novo motor. Ainda podemos trabalhar no 1.6 que existe aqui”, diz Biondo.

 

Tornar novas gerações de produtos mais simples também é uma opção. Um possível exemplo é o novo Corolla. No exterior, ele deve focar em opções híbridas. Por aqui, tudo depende das regras do jogo.

 

“Qual Corolla [será produzido], aí vai depender da previsibilidade. O que pode acontecer é adequar o projeto à realidade do Brasil. Se há metas de eficiência arrojadas, obviamente vamos produzir aqui o que temos de melhor para competir com os concorrentes em condição de igualdade”, conclui Bastos.

 

Atrasos consecutivos

 

Inicialmente, o Rota 2030 entraria em vigor em janeiro e abrangeria todos os pontos da indústria automotiva, como tributação, incentivos a pesquisa e desenvolvimento, segurança veicular e regras para carros híbridos e elétricos. Foram mais de 100 reuniões entre governo, fabricantes de veículos e autopeças, mas o projeto acabou não entrando em vigor.

 

No início de março, a Casa Civil informou que o texto ainda estava sendo finalizado, para o presidente Michel Temer assinar.

 

Antonio Megale, presidente da Anfavea, a associação das fabricantes, diz que conversou com Temer recentemente. “Ele disse que estão trabalhando internamente e que em breve teríamos novidade. E garantiu que o programa vai sair”. (Auto Esporte/André Paixão e Peter Fussy)