Se mercado for aberto, indústria automotiva pode quebrar, diz Mercedes-Benz

O Estado de S. Paulo

 

O presidente da Mercedes-Benz para o Brasil e América Latina, Phillip Schiemer, afirmou nesta terça-feira, 28, em São Paulo, durante evento na escola de negócios Insper, que, caso ocorra uma abertura do mercado automotivo, com redução de alíquotas de importações, como sugere relatório do Banco Mundial divulgado na semana passada, quase todas as indústrias fecharão. “Sem dúvida, se amanhã abrirmos o mercado, as portas de quase todas as indústrias aqui podem se fechar.”

 

A sugestão para a redução de incentivos à indústria automotiva consta de um retrato do Banco Mundial sobre o Brasil: um País que gasta muito e mal e que terá de fazer escolhas duras para ajustar suas contas, além de se abrir para o mercado global.

 

Divulgado no último dia 21, o estudo havia sido encomendado em 2015 – pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy – para propor medidas que reduzissem os gastos do setor público. O resultado foi um receituário liberal, com propostas que vão desde o congelamento do salário dos servidores ao fim do ensino superior gratuito.

 

O estudo também cita especificamente o Inovar-Auto, direcionado ao setor automotivo. Condenado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), o Inovar-Auto teve resultados “questionáveis” sobre a produção, a produtividade e o emprego, afirmou o Banco Mundial.

 

O estudo compara o desempenho das fábricas de automóveis, beneficiados com o programa, como a de máquinas agrícolas, que não foi atendida – e diz que os dados são semelhantes.

 

Instabilidade

 

Na opinião do executivo da montadora alemã, no entanto, o estudo ignora o cenário de falta de previsibilidade que as multinacionais vivem no País. “Amanhã vamos abrir o País, ótimo. E daqui a dois anos, vamos fechar o País de novo? Então o maior problema do Brasil para a indústria automobilística é a falta de previsibilidade”, disse.

 

A indústria, ressaltou o presidente da Mercedes, precisa de uma previsão do que vai acontecer nos próximos 20 ou 30 anos. “Os ciclos de investimentos (são longos) – para automóveis se fala de 5 a sete 7 e, para caminhões e ônibus, de 15 anos. Então precisamos de uma previsibilidade”, disse.

 

Outra questão a ser considerada é a produtividade e competitividade relativas da indústria brasileira, na visão do executivo. “Se eu olho a nossa indústria, a nossa fábrica por dentro, as coisas estão funcionando bem. A questão é o quanto estamos competitivos como país e como podíamos trabalhar aqui”, disse.

 

Falando especificamente sobre as críticas diretas ao Inovar-Auto, Schiemer defendeu que as montadoras tenham tempo para se adaptar ao fim do programa. “Não podemos achar que daqui a seis meses pode mudar todo o nosso modelo”, disse.

 

Nova política

 

Participando do mesmo evento, o assessor especial do Ministério da Fazenda para reforma microeconômica, João Manoel de Pinho Mello, discordou do presidente da companhia alemã, no que se refere ao Inovar-Auto.

 

Segundo ele, o governo federal gostaria de transitar com suavidade, mas infelizmente terá de “trocar o pneu” com o carro andando. “No que se refere ao Inovar-Auto e possivelmente à política que o substituirá, eu acho melhor não fazermos o substituto sem que tenhamos uma ideia precisa do que a gente quer com isso e como transitar”, disse Pinho Mello.

 

O assessor lembrou ainda que o programa de incentivo a montadoras foi considerado ilegal pela OMC – o que elevaria a pressão por uma saída alternativa ao Inovar-Auto. (O Estado de S. Paulo/Francisco Carlos de Assis)