O carro elétrico lá fora e aqui

O Estado de S. Paulo

 

Recebido com ceticismo há sete anos, o carro elétrico veio para ficar e tomar o lugar dos veículos convencionais. A Agência Internacional de Energia informa que, em 2016, foram vendidos no mundo 750 mil veículos elétricos, novo recorde para o modelo.

 

Sua principal contraindicação parece superada. Não fazia sentido substituir as emissões de gás carbônico através dos canos dos escapamentos pelas das chaminés das termoelétricas, origem predominante de energia elétrica no Ocidente. Mas a matriz energética mundial está em rápida transformação. As opções limpas, especialmente de fontes solar e eólica, tendem a substituir a energia suja.

 

O que ainda segura apostas firmes das montadoras são as limitações técnicas da bateria. Ainda é cara demais (entre 30% e 40% do preço do veículo), pesada demais (cerca de 500 kg) e de autonomia ainda baixa (entre 100 e 300 km) nos modelos mais acessíveis.

 

Mas os avanços são significativos. Fundamentalmente a mesma usada nos celulares, tende a ficar mais barata, tanto pelo aumento da escala de produção quanto pela atual corrida à mineração do lítio que deve expandir a oferta. O relatório New Energy Finance de 2017, da Bloomberg, calcula que até 2030, quando 10% da frota mundial será de carros elétricos ou híbridos, o custo dessas baterias terá despencado em 73%. Cinco ou sete anos antes disso, os preços dos veículos elétricos terão se equiparado aos dos atuais modelos a combustão.

 

Até lá, quem deve ganhar mais espaço nas ruas é o híbrido. Mais barato, por não precisar de bateria com grande autonomia – que consiga percorrer cerca de 700 km até a recarga seguinte –, o modelo vai nortear por alguns anos o investimento das montadoras, já que o consumidor ainda precisa se adaptar ao cenário de carros 100% elétricos, com as mudanças no padrão de consumo que eles trazem.

 

O ponto de virada talvez seja o início do funcionamento da supermontadora da Tesla, em Reno, Estado de Nevada (Estados Unidos). Lá deve ser fabricado o Tesla Model 3, cujo preço de venda está em US$ 35 mil. Já há mais de 400 mil encomendas firmes. Os governos da França e do Reino Unido anunciaram que, até 2040, carros com motores movidos a combustível fóssil não poderão mais ser vendidos. A China também estuda proibição equivalente.

 

A Volkswagen acaba de anunciar investimentos de ¤ 20 bilhões para que todos os modelos do grupo já venham com opções a energia limpa. A Smart avisou que pretende produzir apenas carros elétricos a partir de 2020. Até 2022, a RenaultNissan planeja vender 12 novos modelos 100% elétricos. A BMW está mais adiantada. Desde 2013 tem marca própria para elétricos e híbridos. Aqui no Brasil, as coisas parecem emperradas. Quando começou a ser preparado, o programa Rota 2030, a nova política para o setor, pretendia centrar benefícios fiscais na eficiência energética dos carros. Mas, por pressão das montadoras, o novo programa deve incluir os veículos convencionais – na contramão do que acontece no resto do mundo. Apesar disso, as chinesas BYD e Chery anunciaram intenção de produzir carros elétricos no Brasil e a Toyota tem projetos para o Prius.

 

No estágio atual do segmento, preço e aumento na oferta tendem a evoluir favoravelmente. Mas o problema do peso e da autonomia da bateria avançam mais devagar. O objetivo é melhorar a densidade energética – para carregar mais e aumentar a autonomia – sem elevar o peso das baterias. A recompensa para quem chegar à frente é muito alta. “A bateria já avançou muito, mas a fronteira dela ainda não foi alcançada”, observa a especialista da FGV Energia Tatiana Bruce.

 

Outra questão à espera de equacionamento é a provável sobrecarga no sistema elétrico quando a frota ganhar densidade. Mas há quem não veja problema nisso. Estudo da Companhia Paulista de Força e Luz calcula que o consumo adicional de energia ficará entre 0,6% e 1,6%, se o número de elétricos no Brasil atingir entre 4% e 10% do total até 2030. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming)