O Estado de S. Paulo
Nas últimas três semanas consolidou-se a percepção de que a economia está se recuperando da mais profunda recessão da história recente do Brasil. Esta Coluna trata dos sinais dessa recuperação e o quanto esperar que seja consistente.
As Contas Nacionais do segundo trimestre já apontaram para um crescimento do PIB de 0,2%. Não se concentra no show do agronegócio, mas se estende para os serviços, o setor de maior peso na economia (70% da renda nacional).
Ainda que a recuperação da indústria não venha apontada no PIB, dados recentes mostram nova energia. Em julho, a indústria paulista teve avanço de 1,0% sobre junho, com mesmo crescimento, em média, entre abril e julho.
Enquanto isso, o IBGE acusou para a indústria do País crescimento de 0,8% tanto em junho quanto no acumulado nos sete primeiros meses do ano. E o setor de veículos celebrou aumento de produção em agosto de nada menos de 45,7%, ante mesmo mês de 2016, e projeção de atingir no ano adição de 25,2%.
Por trás dessa recuperação ainda não se vê o aumento dos investimentos, mas, sim, claros avanços no consumo. Mais do que os R$ 44 bilhões em recursos das contas inativas do Fundo de Garantia, concorreu para isso o forte recuo da inflação, para 2,46% nos 12 meses terminados em agosto.
Inflação tão baixa, que não se via desde 1999, é fator que concorre para a preservação do poder aquisitivo e de melhores condições das famílias para pagamento das dívidas, portanto, também para a recuperação do crédito e da produção. O mergulho da inflação deve ser visto como fator de recuperação da economia. Convém lembrar que, ainda em fevereiro de 2016, os preços galopavam à velocidade de 10,36% ao ano.
Com o recuo veio também a vertigem dos juros. Em apenas 11 meses, os juros básicos (Selic) caíram de 14,25% ao ano para os atuais 8,25%, devem fechar 2017 ao redor dos 7,0% e deixarão o crédito mais barato.
Mesmo nos tempos mais difíceis, as contas externas já vinham se comportando como setor de muita saúde da economia (veja o gráfico). Agora, passaram ao estágio da exuberância, especialmente com o excelente desempenho da balança comercial, que poderá apresentar em 2017 saldo positivo próximo dos US$ 80 bilhões. Junto com as reservas de US$ 370 bilhões, operam como fator de estabilidade do câmbio.
Ainda é cedo para dizer que o desemprego esteja em franco recuo, mas também aí há progressos. E, não dá para deixar de repetir, o agronegócio vem dando o show do ano: crescimento da produção de grãos estimado em 30% e de 15% na renda do primeiro semestre de 2017.
O flanco vulnerável é o das contas públicas. O rombo continua pulverizando as metas e a arrecadação mergulha mês a mês. Mas, também, aí há pontos positivos. O primeiro deles é o de que, desta vez, ninguém está enganando ninguém. O governo não recorre mais nem a contabilidades criativas nem a pedaladas fiscais para varrer os rombos para debaixo do tapete. O outro ponto favorável é que a necessidade de equilibrar as contas públicas não é mais vista como jogo de ortodoxos destituídos de sensibilidade social. Parece definitivamente compreendido que, se tudo ficar como está, o Brasil inteiro se converterá num enorme Rio de Janeiro, hoje destroçado, incapaz de pagar salários e aposentadorias.
Duas são as maiores dúvidas a respeito da consistência da recuperação. A primeira continua sendo o lado fiscal. Não há garantia de que o equilíbrio esteja próximo. Apenas as despesas com Previdência Social correspondem hoje a 56% de tudo quanto o governo federal gasta (fora os juros). Se essa bomba não for desarmada por reforma corajosa, em apenas 10 anos essas despesas saltarão para 80% do Orçamento.
A segunda grande dúvida paira sobre a atividade política. A velha ordem já morreu e a que vem aí é uma incógnita. E o tempo vai escoando. Há apenas mais 20 dias para que sejam definidas as regras sob as quais se realizarão as eleições de 2018. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming)