DCI
As fortes incertezas que permeiam o atual cenário político brasileiro devem adiar ainda mais a recuperação da indústria. Após frágeis sinais de retomada no primeiro trimestre, agora os industriais podem sangrar por pelo menos mais um ano.
Na avaliação do economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin, a indústria pode amargar mais um ano de recessão.
“Até o momento, projetávamos um crescimento baixo para a indústria, abaixo de 1%. Mas, hoje, claramente o viés é de queda para 2017”, destacou o economista em entrevista ao DCI.
De acordo com o economista associado da Pezco Microanalysis, João Costa, qualquer desdobramento que possa ocorrer com a denúncia que envolve o presidente Michel Temer deve impactar o mercado negativamente. “Inevitavelmente o investidor vai tirar o pé do acelerador.”
O professor de economia do Ibmec/MG, Sérgio Guerra, aponta como um dos principais riscos para o aprofundamento da crise da indústria a postura que deve ser adotada pelo Banco Central em relação à queda da taxa básica de juros. Isso porque, segundo ele, os industriais contavam com a redução da Selic para diminuir a alavancagem e obter financiamentos.
“A equipe econômica do governo vinha sinalizando que o corte da taxa de juros depende da aprovação das reformas trabalhista e da previdência”, explica. “Agora, o risco dessas pautas não avançarem no Congresso é grande”, pontua.
Segmentos
Com o aprofundamento da crise política no País, os segmentos da indústria que devem ter o desempenho mais decepcionante são os de bens de capital e bens de consumo duráveis, amplamente dependentes de crédito. “Estes mercados são muito ligados à confiança, que deve ficar ainda mais abalada”, estima o economista do Iedi.
Em nota, a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) declarou que “independentemente do momento atual vivido no Brasil, o Poder Legislativo precisa dar continuidade à agenda de reformas previdenciária, trabalhista, tributária e da medida provisória que trata do Programa de Recuperação Tributária (Refis).”
Cagnin lembra que, de janeiro a março, a indústria de bens de capital cresceu 4,3% na comparação anual e, a de bens de consumo duráveis, 10,6%. Neste sentido, o professor do Ibmec explica que, ao longo do primeiro trimestre, o prognóstico para estas indústrias foi positivo. “Agora, estes segmentos tendem a ser fortemente impactados com a crise política”, esclarece.
O economista do Iedi ressalta ainda que qualquer resultado da indústria considera uma base extremamente fraca. “O setor vinha saindo do vermelho, mas isso não quer dizer que a recuperação vem logo em seguida. Podemos andar de lado por muito tempo.”
A contenção de gastos e a recuperação da demanda, que estavam fragilmente melhorando, agora devem voltar à pauta dos industriais. “Até ontem, prevíamos um ano de estabilidade, ainda que sobre uma base fraca. Agora é difícil enxergar um cenário de melhora no curto prazo”, pondera o economista do Iedi.
Ele acredita que o câmbio deve voltar a um movimento de forte oscilação e os bancos provavelmente vão ser mais cautelosos ao repassarem o custo de captação. “O spread bancário pode voltar a subir.”
Costa, da Pezco, pontua que diferentemente do comércio e de serviços, a indústria vem reduzindo seu quadro de funcionários já há algum tempo.
“Os outros setores da economia ainda possuem um pouco de gordura para queimar, mas os industriais não têm mais onde cortar”, comenta. Costa acrescenta que é bem possível que a indústria apresente contração novamente em 2017. “Resta saber por quanto tempo e qual será a intensidade dessa recessão. A indústria ainda vai sangrar por um tempo”. (Juliana Estigarríbia/Juliana Estigarríbia)