Avanços e solavancos

O Estado de S. Paulo

 

Arrancos, freadas e solavancos marcam a fase inicial da recuperação brasileira, num ambiente de consumo ainda moderado, vendas externas em crescimento e segmentos industriais com ritmos de atividade bem diferenciados. O setor automobilístico é quase uma síntese desse quadro. A produção de abril, de 191,1 mil veículos, foi 18,8% menor que a de março, mas 11,4% maior que a de um ano antes. Os números acumulados no ano deixam clara a manutenção de um rumo. O total produzido de janeiro até o mês passado, de 801,6 mil unidades, superou por 20,9% o dos primeiros quatro meses de 2016. A comparação dos últimos 12 meses com os 12 imediatamente anteriores mostra avanço de 4,1%. Tem havido, portanto, uma evidente aceleração, apesar dos solavancos e da perda de impulso em alguns momentos.

 

Dois fatos valem atenção especial, quando se examina em detalhes o desempenho das montadoras. O primeiro é a expansão do valor das exportações. De janeiro a abril as vendas externas proporcionaram faturamento de US$ 4,6 bilhões, 52,6% superior ao do mesmo período de 2016. A atenção ao mercado externo vem facilitando a reativação do setor automobilístico e de outros segmentos industriais.

 

Mas o comércio exterior continua pouco explorado pela maior parte do setor produtivo brasileiro. Uma participação mais intensa nas trocas internacionais e nas cadeias globais de valor daria maior vitalidade à economia nacional e favoreceria a manutenção e a criação de empregos. Para isso seria preciso depender menos de protecionismo e dar mais atenção aos ganhos de produtividade e à inovação. A nova política econômica, espera-se, dará maior ênfase a esses pontos.

 

Outro detalhe saliente é o aumento das vendas de máquinas agrícolas e rodoviárias. O total vendido às concessionárias no primeiro quadrimestre (13,2 mil unidades) foi 33,1% maior que o de janeiro-abril de 2016. Essa evolução é explicável principalmente pelo bom desempenho do agronegócio, o setor mais eficiente e mais competitivo da economia nacional. Esse bom desempenho é atribuível à ampla integração do setor no mercado internacional. Pesquisa, mudança tecnológica e alta competitividade são os principais componentes dessa história de sucesso.

 

Outro segmento em recuperação tem sido o eletroeletrônico. Sua produção no primeiro trimestre foi 4,3% maior que a do período janeiro-março de 2016, de acordo com números divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e agregados pela associação das empresas do setor, a Abinee. Também neste caso houve um tropeço, embora o rumo da recuperação se tenha mantido. A produção de março foi 2,6% menor que a de fevereiro, mas 5,5% maior que a de um ano antes. Mas em 12 meses o balanço continua em vermelho, com a produção 3,1% menor que a do período anterior.

 

Além disso, os dois componentes do setor têm apresentado resultados divergentes. No primeiro trimestre, o segmento eletrônico produziu 17,3% mais que um ano antes, enquanto a indústria elétrica fabricou 4,4% menos que em janeiro-março do ano passado.

 

Os números das montadoras de veículos e do setor eletroeletrônico exemplificam bem a diversidade mostrada pelo IBGE no relatório sobre a indústria nos primeiros meses. Mas confirmam também a tendência dominante de melhora em relação ao desempenho de um ano atrás. Se essa tendência se mantiver, 2017 marcará de fato o início da recuperação e o crescimento poderá ser mais veloz em 2018, como tem anunciado o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

 

Por algum tempo a economia poderá crescer sem grande investimento, porque há ampla capacidade ociosa. Mas depois a expansão dependerá de maiores gastos em obras, máquinas e equipamentos. No primeiro trimestre, esse gasto foi 2,1% menor que o de um ano antes, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Avanço nos ajustes e reformas e dinamismo nas concessões de infraestrutura serão essenciais. A Praça dos Três Poderes é o local para se cuidar desses desafios. (O Estado de S. Paulo)