Quem vai dirigir o seu automóvel?

O Estado de S. Paulo

 

Graças ao sucesso do teste com táxis-robôs que fez em Pittsburgh, há duas semanas, o Uber dominou as manchetes sobre carros autônomos nos últimos dias. Nos bastidores, porém, o que se vê é uma disputa acirrada entre três grupos de empresas: as gigantes de tecnologia, como o próprio Uber, as montadoras e as fabricantes de autopeças. O troféu que todas buscam é o desenvolvimento dos equipamentos e softwares que compõem o intricado sistema que permite que os carros circulem sem motorista.

 

Até poucos anos atrás, as companhias de tecnologia lideravam essa corrida com folga. Nos últimos tempos, porém, com exceção do Uber, elas resolveram tirar o pé do acelerador. No início de agosto, o Google perdeu Chris Urmson, que comandava o projeto de veículos autônomos. Um mês depois, foi a vez da Apple enxugar a equipe que trabalhava no desenvolvimento de um carro elétrico autônomo, indicando que nem tudo vai bem nas empresas de tecnologia (se bem que a possível parceria com a McLaren, equipe britânica de Fórmula 1, pode dar novo ânimo às ambições da Apple).

 

Tradição

 

Por sua vez, as montadoras que, na largada, haviam ficado para trás, estão recuperando o terreno perdido. Apesar de ter enfrentado alguns problemas de segurança recentemente, a fabricante de carros elétricos Tesla vem realizando avanços importantes com seu sistema Autopilot.

 

A Volvo, que trabalha em parceria com a Uber, vai testar em 2017 um modelo próprio, colocando-o pela primeira vez nas mãos de motoristas comuns, cuidadosamente selecionados entre o público em geral. Em agosto, a Ford anunciou que lançará, até 2021, um carro totalmente autônomo, sem volante nem pedais, destinado ao compartilhamento de veículos.

 

Entre os envolvidos na busca da autocondução é consensual que o grosso dos lucros ficará com quem produzir o sistema operacional desses carros, que integrará softwares e algoritmos que processam e integram informações geradas por sensores e mapas às partes mecânicas do automóvel.

 

Nesse aspecto, as empresas de tecnologia provavelmente levam vantagem. Mas as montadoras e as fabricantes de autopeças não têm a menor intenção de entregar os pontos. Por isso embarcaram numa atividade frenética, a fim de manter o controle sobre o centro nervoso dos carros autônomos. Em julho, por exemplo, BMW, Intel e Mobileye (fabricante israelense de sistemas avançados de assistência ao motorista) anunciaram uma parceria.

 

Outra estratégia adotada pelas montadoras é desenvolver internamente seus próprios veículos autônomos. Para tanto, elas estão adquirindo companhias menores, que já detêm tecnologias de autocondução, diz Andrew Bergbaum, da consultoria AlixPartners.

 

A Ford investiu numa fabricante de sensores que utilizam raios laser para escanear os arredores e medir a distância do automóvel em relação a objetos circundantes e numa empresa que comercializa serviços de mapeamento. Também comprou companhias de aprendizado de máquina (“machine learning”).

 

Tudo indica que as últimas colocadas serão as fabricantes de autopeças. Ao longo do tempo, as montadoras foram delegando ao segmento de autopeças a tarefa de desenvolver tecnologias. Se agora resolverem promover uma reintegração vertical, essas fornecedoras podem perder boa parte de seus negócios.

 

A dianteira das gigantes de tecnologia ainda é enorme. Além de dinheiro, elas estão melhor posicionadas para lucrar com o sistema operacional dos carros. Se comprar a McLaren, a Apple poderá reativar seu projeto de veículo autônomo. E o Google está na frente em aprendizado de máquina, vital no desenvolvimento dos algoritmos que substituirão motoristas. Mas as montadoras vêm correndo por fora. (O Estado de S. Paulo)