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Diante do acesso mais restrito ao crédito no País, as fabricantes de máquinas e equipamentos para a cadeia alimentícia vem oferecendo aos clientes financiamento próprio para garantir vendas.
“Tivemos de fazer o papel dos bancos e financiar nossos próprios clientes para que a roda continuasse girando”, conta o presidente da Equimatec, fabricante de fatiadores e raladores industriais, Josinei Martins.
Atualmente, segundo ele, a empresa parcela em até 12 vezes suas vendas e até oferece a opção de aluguel dos equipamentos. “A flexibilização do pagamento foi necessária e tem dado certo por enquanto.”
Martins explica, porém, que, antes de realizar a concessão, a empresa realiza uma análise detalhada do mercado em que o cliente atua e da sua situação financeira, o que garante baixos índices de inadimplência. “Acredito que [a inadimplência] esteja abaixo de 5%”, calcula.
Apesar disso, ele ainda não sabe por quanto tempo será possível manter o atual sistema de financiamento. “Vamos continuar vendendo parcelado, mas isso tem um custo para nós e, consequentemente, um limite. Até agora conseguimos passar pela crise graças aos nossos próprios recursos, mas essa não é uma solução a longo prazo”, pondera o empresário.
Na visão do presidente da Câmara Setorial de Máquinas para a cadeia alimentícia, associada à Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Judenor Marchioro, é a falta de crédito disponível no mercado um dos responsáveis pela queda da atividade no segmento. Ele estima que o nível de utilização da capacidade instalada do setor esteja entre 55% e 60%, hoje.
“Olhando para essa dificuldade, algumas empresas estão de fato fazendo financiamentos próprios, mas isso deveria ser pontual pois gera um risco grande”, alerta o dirigente.
Segundo Marchioro, 70% das empresas do segmento estão inadimplentes, aumentando a ameaça para quem decide oferecer linhas próprias de financiamento. “Acredito até que haja mais empresas com desejo e possibilidade de oferecer essa facilidade, mas ficam inseguras com medo de calote”, avalia.
“Nossa experiência diz que, apesar do caixa muito saudável que essas empresas financiadoras devem ter, não dá para correr mais riscos nesse momento econômico. Em um cenário favorável seria possível, mas da maneira como estamos hoje não vejo como esse modelo será sustentável por muitos meses”, alerta Judenor Marchioro.
Já o presidente do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi), Joseph Couri, vê a estratégia como “agressiva, inteligente” e com poucos riscos de inadimplência. “Quem pode fazer esses financiamentos conquista uma fatia de mercado que os concorrentes não têm condições de atingir. É uma relação mais próxima e que não envolve banco, com uma análise individual do cliente que necessita melhores condições, ao contrário da avaliação por segmento feita pelas instituições financeiras”, avalia.
O diretor industrial da JS Multienvase, fabricante de máquinas de envase para bebidas e alimentos, Jecleano Santos, decidiu correr o risco e estima avanço de 20% em receita bruta neste ano em relação a 2015, em parte graças aos acordos de financiamento que tem feito com seus clientes.
Em 2015, a JS registrou um faturamento de R$ 10 milhões. “A partir do momento que colocamos uma máquina no cliente, temos o objetivo de que seja rentável o suficiente para garantir o pagamento. A diferença de custo gerada com a automatização, por exemplo, faz com que o equipamento seja pago”, estima Santos.
Atualmente, a JS oferece parcelamento em de 10 a 36 vezes para cerca de 300 empresas. Santos destaca que parte dos pagamentos é utilizada para financiar outros clientes, formando um ciclo. “Só vamos ver os resultados efetivos dessa ação daqui uns dois anos, conforme os contratos que envolvem essas longas parcelas forem terminando. Mas considerando os tempos de crise, nós estamos muito bem e otimistas com nossos resultados”, diz.
De acordo com ele, a taxa de inadimplência é de 3% e sua capacidade produtiva está no limite, com prazos de entrega que passaram de 90 para até 180 dias.
Perspectivas
Por enquanto, o empresário não define uma data para o fim desses financiamentos por conta da instabilidade político-econômica do Brasil. “Acredito que a economia possa mostrar uma recuperação real a partir do ano que vem, mas ainda é difícil prever o que vai acontecer. Então por enquanto vamos continuar oferecendo essa opção, não vejo problemas”, revelou Santos, em entrevista ao DCI.
Marchioro, da Abimaq, acredita em uma “sensação” de melhora da indústria de máquinas e equipamentos, em geral. “Não vejo como uma retomada real, mas como um aumento na confiança do empresário, que já está mais confortável para planejar investimentos e retomar projetos”, avalia.
Conforme levantamento da Abimaq, as vendas líquidas da indústria brasileira de máquinas e equipamentos somaram R$ 5,52 bilhões em maio, um recuo de 28,8% sobre o mesmo mês do ano passado.
Já na comparação com abril, a receita líquida foi 4,1% superior. De janeiro a maio, as vendas líquidas do setor acumulam retração de 30,7%, totalizando R$ 27,129 bilhões. (DCI/Ana Carolina Neira)