Financial Times
Quando um carro autônomo do Google entrou em uma pista a 3 km/h e bateu na lateral de um ônibus, foi um barulho ouvido em todo o mundo. O acidente, revelado pela Alphabet, dona do Google, na segundafeira (29/2), foi assunto da feira de automóveis de Gênova, na semana passada.
Eu prefiro um carro guiado por um computador a um dirigido por um humano distraído pelo celular. Um executivo em Gênova contou como um amigo ficou seriamente ferido quando uma mulher que mandava mensagens de texto enquanto dirigia entrou direto em um cruzamento e o derrubou da motocicleta.
O acidente ilustra como computadores e pessoas constituem uma combinação perfeita nas ruas. Robôs são muito bons em seguir regras muitas vezes mais rápida e eficientemente do que pessoas, sem cansaço, distração ou embriaguez. Mas eles não são melhores do que os humanos em prever como os próprios humanos irão se comportar.
Isso parece algo para as gerações futuras tentarem entender, mas não é. A tecnologia para carros completamente autônomos já existe ou vai existir em breve. A maioria das grandes montadoras acredita que vai poder, em 2020, produzir e vender veículos capazes de guiarem a si mesmos pelas ruas das cidades e pistas de estradas.
Máquinas e gente
Cerca de 33.000 pessoas são mortas todos os anos em acidentes de trânsito nos Estados Unidos, e 3,9 milhões são feridas, com 24 milhões de veículos danificados. Em torno de 92% dos acidentes envolvem erro humano pessoas correndo ou distraídas. Nada disso aconteceria se computadores comandassem.
E, no entanto, vá a uma feira de automóveis e examine por um minuto o que está sendo exibido para a plateia majoritariamente masculina. Carros funcionais, é verdade, mas mais do que isso.
Poder, excitação e velocidade a satisfação de pisar num pedal e a máquina obedecer. Um executivo elogiou um redesenho mais “arrojado e masculino”, outro “a emoção e a esportividade” de sua marca.
Um embate entre homem e máquina está quase diante de nós. Computadores derrotaram humanos no xadrez e no Go, um jogo de tabuleiro complexo feito o diabo. Logo eles serão melhor dirigindo. Será então lógico, e muito mais seguro, deixálos fazer isso transformar motoristas em passageiros, levados a seus destinos por choferesrobôs.
Tão perto, tão longe
A coisa mais chocante é o quão perto a indústria acredita estar de fazer isso possível. Mas há muitas complicações a superar antes que os volantes possam ser removidos.
Autonomia completa requer mapas tridimensionais de altadefinição para que veículos saibam exatamente onde estão. Também é preciso que eles se comuniquem com os outros veículos e com a infraestrutura, como semáforos.
O acidente do Google jamais aconteceria em um mundo adaptado à direção autônoma. O carro calculou que o ônibus ia parar, enquanto o motorista do ônibus esperava que o carro parasse. O Google planeja programar seus veículos para entender mais profundamente o comportamento de motoristas de ônibus. Boa sorte com isso.
Se o julgamento humano fosse removido completamente da equação, e o carro e o ônibus pudessem concordar, em milésimos de segundo, quem tem prioridade, o trânsito ficaria muito mais seguro. Não poderia haver humanos no banco da frente, no entanto enquanto houver, robôs terão de adivinhar.
A indústria precisa focar em passageiros no lugar de motoristas. Carros autônomos podem ser propagandeados pelo estilo e conectividade, em vez da velocidade. No lugar de pessoas arriscando suas vidas mandando mensagens enquanto dirigem, elas poderiam ler, trabalhar ou navegar na internet no conforto do banco de trás.
Parece bom, e ninguém reclama de ter um chofer. Eu adotaria. A indústria pode desenvolver a tecnologia. Mas precisa pensar de forma diferente sobre seus clientes. (Financial Times/John Gapper, com tradução de Bruno Scatena)