Folha de S. Paulo
Comprar um carro ou um imóvel e pagar, em parcelas, quase dois. Embora muitos consumidores passem por essa situação, quase nenhum deles sabe apontar o mecanismo que, combinado aos juros altos, faz com que o valor pago por um bem seja tão mais alto que o original.
É o que mostra pesquisa elaborada pelo diretor da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), Miguel José Ribeiro de Oliveira, em parceria com o portal Vida Econômica.
De acordo com o levantamento, 99,4% dos brasileiros desconhecem o conceito de juros compostos –983 usuários do site tiveram seus conhecimentos testados sobre o assunto.
Para entender o mecanismo, utilizado nas transações financeiras no Brasil, é preciso fazer as contas. Quem aplica R$ 10 mil em um investimento com rendimento mensal de 1%, teria no mês seguinte R$ 10,1 mil.
No próximo período, os juros serão calculados sobre o montante atual, e não sobre o inicial. Portanto, no segundo mês, teria R$ 10.100 mais 1%, ou seja, R$ 10.201, e assim sucessivamente. Se os juros fossem simples, o rendimento seria sempre calculado sobre os R$ 10 mil iniciais.
No caso de compras parceladas no longo prazo, os juros compostos elevam o preço final do bem, já que as taxas são sempre calculadas sobre os juros anteriores.
Compras
Um exemplo simples é a aquisição de um carro de R$ 55 mil, com entrada de 20% do valor –ou R$ 11 mil. Os R$ 44 mil restantes, se financiados em 72 parcelas de R$ 1.323,70, com juros compostos mensais de 2,50%, totalizariam R$ 95.306,40, elevando o valor final do carro para R$ 106.306,40.
O raciocínio é o mesmo no que diz respeito a imóveis. Cálculos de Mauro Calil, da Academia do Dinheiro, mostram que um apartamento de R$ 500 mil, com entrada de R$ 165 mil e financiado em 30 anos a juros anuais de 11% somaria R$ 1,26 milhão ao final do período – ou seja, mais que o dobro do valor inicial.
Mas, mais do que saber como funciona o cálculo, os especialistas afirmam que o consumidor precisa prestar mais atenção ao preço final do item, e não só no valor da parcela. Ainda de acordo com a pesquisa, 95% dos participantes verificam apenas se a prestação cabe no bolso.
“A pesquisa não é surpresa para nós. O brasileiro olha muito a prestação na hora de fazer o financiamento, e não a taxa de juros. Se estivesse nos EUA ou na Europa, não teria que se preocupar com isso. Mas no Brasil, com juros elevados, é preciso conhecer a taxa.
No fim, você paga dois carros”, afirma Ribeiro.
Para ele, a crise deve fazer com que os consumidores se atentem mais aos juros das compras. “O aumento do desemprego, a redução do crédito e a elevação da inflação e dos juros passam a exigir do consumidor mais pesquisa de preços e instrumentos que possibilitem planejar e fazer economia”, diz.
O momento é bom também para guardar dinheiro e barganhar desconto no pagamento à vista. Para móveis, eletrônicos e carro, vale poupar e adquirir o produto sem parcelar. Já no caso do imóvel, a dica é economizar o máximo possível para dar uma entrada maior e reduzir o valor a ser financiado.
Ribeiro diz ainda que o consumidor deve tomar cuidado com prazos curtos e comparar o número de prestações em lojas diferentes. (Folha de S. Paulo/Anderson Figo r Danielle Brant)