O Estado de S. Paulo
A proposta da prefeitura é que as viações de ônibus que conseguirem operar com veículos ainda mais cheios ganhem valores extras na nova licitação do transporte público paulistano, válida por até 40 anos. E a estratégia já provoca críticas de especialistas.
Entre as mais de mil páginas do edital recém-lançado, o “índice de produtividade” surge como a única maneira das viações ampliarem recebimentos. O pagamento será feito quando a administração municipal identificar, na operação das linhas, a entrada de mais passageiros do que essas deveriam receber, de acordo com os estudos de demanda já feitos pela SPTrans.
A produtividade é vista, no edital, como “a redução de custo por passageiro”. Como o ônibus tem custo fixo para rodar, quanto mais gente no veículo, mais se rateia o custo. Segundo o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, o pagamento da produtividade só ocorrerá se as demais exigências, como cumprimento das partidas, forem cumpridas. “Se você está prestando um serviço de excelência e consegue aumentar o número de usuários sem baixar a qualidade do serviço, você será recompensado por isso”, argumenta. “E essa produtividade será partilhada: parte para o empresário, outra parte para o poder público”.
O valor que seria possível obter enchendo os ônibus é difícil de calcular. Para tentar reduzir ganhos de empresários e forçar melhorias, a Prefeitura montou na licitação uma complexa equação (com seis variáveis, cada uma com até oito itens). Em linhas gerais, sem o pagamento extra, segundo a Prefeitura, metade da remuneração às empresas será feita com base no número de passageiros transportados, 25% de acordo com cumprimento das viagens, 10% pelo cumprimento da oferta exigida de veículos e 15% como remuneração dos investimentos em ônibus e equipamentos, o chamado custo de capital. Hoje a remuneração é só por passageiro transportado.
Lotação
O professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) Mauro Zilbovicius não partilha dessa visão otimista. Ao analisar o edital, o engenheiro afirma que o conceito de produtividade deve induzir as empresas a tentar rodar com mais passageiros e com o mesmo custo total. “Isso pode estimular as empresas a lotarem os veículos, e não a adotar outros elementos que podem trazer ganhos de produtividade, como melhor treinamento de operadores e otimização de peças e combustíveis”, afirma.
O conceito de produtividade, para ele, deveria estar relacionado não a transportar mais gente, mas sim a rodar mais quilômetros – e assim aumentar a oferta de viagens – com o mesmo custo. “Poderíamos ter mais corredores exclusivos, veículos elétricos, corredores com sinalização inteligente para prioridade ao ônibus, entre outras ações”, diz Zilbovicius. (O Estado de S. Paulo)