O Estado de S. Paulo
O Fundo Monetário Internacional (FMI) alerta, em um estudo divulgado nesta terça-feira, para o forte aumento das dívidas das empresas de países emergentes, em que os passivos quadruplicaram nos últimos anos e a parcela em dólar cresceu de forma expressiva. Esta expansão pode ser um problema em um momento de alta dólar e da perspectiva de aumento de juros nos Estados Unidos. O relatório destaca que o Brasil foi a quarta economia emergente em que os passivos corporativos mais cresceram desde 2008, atrás apenas da China, Turquia e Chile.
A dívida corporativa de empresas não financeiras dos principais países emergentes saltou de US$ 4 trilhões em 2003 para US$ 18 trilhões em 2014 e a parcela em moeda estrangeira cresceu de forma expressiva. No Brasil, o crescimento dos passivos entre 2008 e 2014 foi em torno de 15% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto na China foi de quase 30%, seguido por Turquia, com 22%, afirma o documento, que faz parte do relatório Estabilidade Financeira Global. Os setores que, em média, mais se endividaram nos emergentes foram o de petróleo e gás e o de construção, de acordo com o relatório.
“A dívida corporativa quadruplicou e os emergentes precisam estar preparados”, afirma o FMI, destacando que os casos mais graves são da China e Turquia, mas chamando atenção para o problema também no Brasil. Além de se endividarem mais, as companhias dos emergentes passaram a emitir mais bônus no mercado internacional em moeda estrangeira. Com isso, a participação desses papéis nos passivos das empresas dobrou para 17%.
“Essas mudanças deixam os países emergentes mais vulneráveis a um aumente das taxas de juros (nos países desenvolvidos), à alta do dólar e ao aumento da aversão ao risco”, afirma o chefe da divisão de Estabilidade Financeira do FMI, Gaston Gelos, um dos responsáveis pelo estudo. A alta dos juros nos Estados Unidos, por exemplo, pode encarecer os custos para as companhias rolarem suas dívidas. “Apesar de balanços financeiros mais fracos, as firmas dos emergentes conseguiram lançar bônus com taxas mais baixas e de maior prazo de maturação.”
A alta dos juros nos países desenvolvidos combinada com a desvalorização das moedas dos emergentes ante o dólar deve tornar “crescentemente mais difícil” que as companhias com passivos em moeda estrangeira honrem suas dívidas, principalmente aquelas que não estão devidamente protegidas das oscilações da dívida dos EUA por meio de instrumentos de hedge cambial.
Para piorar, a queda internacional dos preços das commodities, influenciada pelo desaquecimento da China e a economia mundial crescendo em ritmo mais lento, afeta a receita das companhias dos emergentes que são exportadores desses produtos, destaca o FMI. Com isso, uma forma de proteção natural, que são as receitas em dólar, fica comprometida.
Recomendação
A recomendação do FMI é que os governos monitorem de perto as empresas mais vulneráveis e com importância sistêmica, bem como bancos e outras companhias que têm relações mais estreitas com essas firmas. O uso de políticas macroprudenciais também é recomendado. Como forma de mitigar o risco, o estudo alerta que os governos podem lançar mão de medidas que limitem os empréstimos excessivos de bancos. No caso de saída desordenada de capital externo, a sugestão do FMI é que os países emergentes usem uma combinação de políticas fiscais e monetárias.
“Os mercados emergentes devem estar preparados para turbulências corporativas na esteira do aumento das taxas de juros nas economias avançadas e, se necessário, devem reformar os regimes de insolvência”, afirma o documento.
O aumento do endividamento das empresas em dólar se acelerou no pós-crise financeira mundial, quando os países desenvolvidos, sobretudo os Estados Unidos, baixaram as taxas de juro para níveis próximos de zero para estimular a economia. Com isso, os investidores do primeiro mundo passaram a buscar papéis de maior retorno e aumentaram as compras de bônus corporativo. Além disso, os bancos centrais de países como EUA e Japão lançaram programas bilionários de compras de ativos, despejando trilhões de recursos no mercado financeiro. (O Estado de S. Paulo/Altamiro Silva Junior)