Para mercado, nem pacote fiscal evitará degradação financeira

Folha de S. Paulo

 

“A ‘ineptocracia’ atuou mega bem hoje no mercado”. Ineptos são governo e Congresso. Mas, um alto executivo, com passagem pelo governo, “tira o chapéu” para o modo como Banco Central e Tesouro apagaram ontem o incêndio do dólar e a explosão das taxas de juros.

 

No entanto, muita gente graúda, gestores de dinheiro grosso também com experiência de governo, dizia que a equipe econômica apenas atenuou um sintoma agudo de uma crise “catastrófica”.

 

Os mais pessimistas, quase todos, acreditam que nem mesmo a difícil aprovação do pacote fiscal do governo terá o efeito de evitar a degradação financeira, desvalorizações extras do real e altas de juros no mercado, embora possa atenuar o pânico no curto prazo.

 

Se por mais não fosse, a aprovação do pacote, metade dele dinheiro da CPMF, vai demorar e ficará sujeita ao turbilhão político, argumentam. Mais importante, o pacote é “pífio” porque incapaz de dar segurança mínima de que a dívida pública não vai continuar a crescer sem limite, o fator “primordial” da jornada nas estrelas de dólar e juros.

 

“Isso (o pacote) não vai funcionar, acabou o tempo de pequenas medidas, de mais imposto aqui, de queima de patrimônio público (privatização) a preço de banana”, diz um financista.

 

Vários desconfiam que o Banco Central seja capaz de evitar a elevação da “sua” taxa de juros (a Selic, a taxa de juros calibrada pelo BC com o fim de controlar a inflação).

 

A direção do BC diziam ontem, em público e privado, que a alta de dólar e dos juros na praça, puxada pelo aumento do descrédito da política fiscal (alta do risco­país) pode ser transitória, com o que não seria preciso bulir com os juros. E se for duradoura? Um diretor de banco dizia que “pelo jeito, eles vão tentar segurar a coisa com mais intervenção cambial. Se a expectativa de inflação continuar a subir, fica difícil segurar a Selic até o fim do ano”.

 

Isto é, o BC terá de jogar a toalha se quiser evitar que a inflação supere o teto da meta (6,5%) no ano que vem (o BC diz ainda pretender levar a inflação à meta de 4,5% em 2016. Porém, no Relatório Trimestral de Inflação divulgado ontem pelo BC, a previsão é de inflação de 5,3%). Na manhã de caos de ontem, economistas de bancos e consultorias praticamente faziam campanha para o BC elevar juros, até como um meio de controlar o pânico pontual.

 

Havia mais preocupações. “A piora em cima de piora, a previsão de três anos de déficit somado ao caos dos últimos dias, está fazendo com que apareçam problemas ainda maiores”, diz um executivo. Um deles é a Petrobras. A alta adicional do dólar fez a dívida da empresa explodir ainda mais. “Ninguém sabe como resolver isso, todo mundo já percebeu, é óbvio. Se a Petrobras precisar de mais capital, vai sair de onde? Do governo quebrado?”.

 

O tamanho da empresa, de seus problemas e de seu impacto possível no governo estaria contribuindo para elevar risco e portanto juros

no Brasil.

 

Enfim, há as dívidas de empresas. “A gente tem reservas, não tem dívida externa líquida (o Brasil tem mais ativos do que passivos “em dólar”), ok. Mas, lá fora, a conversa é sobre o endividamento externo das empresas brasileiras é dos mais altos entre os emergentes. As pessoas se perguntam quando as empresas brasileiras vão precisar renegociar esses papeis”. (Folha de S. Paulo/Vinicius Torres Freire)