O Estado de S. Paulo
O governo prepara um aumento da Cide, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, com duplo objetivo: dar um gás para o combalido setor do etanol e obter certo aumento de arrecadação.
Em 2012, o governo zerou a Cide de modo a promover o achatamento dos preços da gasolina e, assim, segurar a inflação. Com isso, salvou o aquário, mas matou o peixe. A economia do etanol entrou em processo de forte deterioração, como mostra o gráfico.
No momento, a Cide está de volta, embora a níveis inferiores, com o objetivo de abrir um pequeno espaço para o etanol. Explicase: como apresenta apenas 70% do teor energético da gasolina, o etanol perde competitividade sempre que seus preços ultrapassam os 70% dos preços da gasolina. Apesar da derrubada das cotações internacionais do petróleo, a Petrobrás ainda segura o preço antigo dos derivados, o que ainda dá certo fôlego ao etanol.
Mas essa situação é instável, porque mantida artificialmente. Na medida em que aumenta os preços da gasolina ao consumidor, a Cide ajuda o etanol. O efeito colateral é seu impacto sobre a inflação. Além disso, um combustível mais caro tende a reduzir o consumo e, com isso, a reduzir a arrecadação, especialmente do ICMS. As resistências dentro do governo ao aumento da Cide levam em conta esses dois fatores.
Mas o problema do etanol enfrenta problema mais grave: o da enorme perda “natural” de competitividade em relação à gasolina, num ambiente de forte derrubada dos preços internacionais do petróleo.
O exministro da Agricultura Roberto Rodrigues, hoje coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas, reconhece que a competitividade do etanol no Brasil fica comprometida sempre que os preços do petróleo resvalam para abaixo dos US$ 40 por barril de 159 litros.
Este é o nível em que, nas condições atuais de impostos, compensa mais a queima de gasolina nos motores dos veículos, especialmente nos dotados de tecnologia flex. Hoje, os preços do petróleo oscilam em torno desse limite, mas grande número de analistas de respeito no seu setor prevê que a baixa continuará.
Para a defesa do etanol contra predadores de vários tipos, os especialistas evocam duas “externalidades”: seus efeitos positivos na preservação ambiental e sua forte capacidade de produzir empregos.
Um estudo da Unicamp apontou redução de 11% nas emissões de CO2 no Brasil, graças à maior utilização do etanol desde o início do Proálcool, em 1975. Então, se é para desenvenenar o ar, é preciso garantir o futuro do etanol como se pode deduzir desse estudo.
E há o fator emprego. Estimativas de analistas da área dão conta de que o setor do etanol no Brasil produziu cerca de 1 milhão de empregos. Uma devastação nessa área, já enfraquecida pela crise, poderia gerar estragos significativos no mercado de mão de obra.
Mas, apesar dessas recomendações, nas atuais condições em que opera o mercado, o etanol está vulnerável. Poderia não estar se o governo mantivesse regras firmes de jogo, como reclama o presidente da consultoria Datagro, Plínio Nastari. Houvessem essas regras, os empresários do setor poderiam correr mais riscos e, por exemplo, investir em tecnologias redentoras.
O professor Roberto Rodrigues observa que há enormes avanços na área de tecnologia agrícola da cultura da canadeaçúcar, cujo emprego poderia derrubar substancialmente os custos de produção. Mas reconhece que a implantação desses avanços de ponta requer grande emprego de capitais, que o setor hoje nem está em condições de fazer nem está disposto a isso.
O Brasil está diante de três opções, como aponta Antonio de Padua, diretor técnico da Única, uma das entidades do setor: ou investe em refinarias que custam algumas dezenas de bilhões de dólares; ou investe em projetos de logística que garantam importações de gasolina; ou provê as condições necessárias para que o setor privado invista em etanol e dobre sua produtividade para 12 mil litros de etanol por hectare de cana produzida. O País decide. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming e Laura Maia)