De olho nos EUA, fábricas chinesas de carro elétrico ‘invadem’ o México

O Estado de S. Paulo/The New York Times

 

Atrás de uma parede de tijolos em ruínas, em um bairro de classe trabalhadora da Cidade do México, esconde-se um estacionamento aparentemente inócuo. Mas ele pode ser um sinal de uma ameaça potencialmente grave para o setor automobilístico americano.

 

Uma concessionária improvisada da empresa chinesa de veículos elétricos BYD surgiu nesse terreno empoeirado. Esteban Alegría, um funcionário, disse que a concessionária estava vendendo carros tão rapidamente quanto eles chegavam da China. O carro mais vendido por Alegría é o Dolphin Mini, um compacto elétrico de quatro portas, que custa cerca de US$ 18 mil (R$ 109 mil), cerca de US$ 10 mil (R$ 60 mil) a menos do que o veículo movido a bateria mais barato disponível nos Estados Unidos.

 

A concessionária de Alegría é uma das dezenas que as montadoras chinesas, como BYD, Chery, Geely e SAIC, estão abrindo no México à medida que estabelecem um ponto de apoio na América do Norte.

 

As montadoras chinesas são efetivamente impedidas de entrar nos Estados Unidos por tarifas que dobram o preço de etiqueta dos veículos importados da China. No entanto, sua ambição de expandir-se para o exterior está em evidência no México e em toda a América Latina, Ásia, Europa e África. Anúncios de marcas chinesas estão em aeroportos e estádios de futebol e aparecem nas ruas da Cidade do México em grandes outdoors. Os carros chineses, tanto os modelos a gasolina quanto os elétricos, são cada vez mais comuns.

 

Expansão

 

BYD e outras empresas também estão procurando lugares para construir fábricas no México, embora nenhuma tenha anunciado planos concretos. Inicialmente, as unidades atenderiam a América Latina, como parte de uma campanha das montadoras chinesas para diminuir o domínio das montadoras japonesas, americanas e europeias em países como o Brasil e a Tailândia. Mas há pouca dúvida de que, eventualmente, as montadoras chinesas esperam usar o México como uma rampa de acesso para os Estados Unidos.

 

“Talvez no próximo ano a BYD possa entrar nos Estados Unidos”, disse Alegría com otimismo, enquanto uma música de salsa tocava em um alto-falante pendurado em um poste e dois homens lavavam a poeira de um Dolphin recém-chegado. Perto dali trabalhadores colocavam argamassa numa parede de blocos de concreto, parte de um novo prédio que substituirá o escritório de vendas de um cômodo feito de tijolos brutos e coberto por um telhado de metal corrugado. “Se não”, acrescentou Alegría com um sorriso, “eu posso entregar”.

 

Mudança

 

Há menos de 20 anos, os carros chineses eram vistos como inferiores, até mesmo por muitos motoristas do próprio país. Mas, nos últimos anos, os fabricantes se equipararam aos rivais estrangeiros em termos de qualidade mecânica, dizem os analistas, e muitas vezes superam as montadoras americanas, japonesas e europeias em tecnologia de bateria, direção autônoma e software de entretenimento.

 

As montadoras chinesas conquistaram uma participação significativa no mercado interno de empresas que já foram dominantes, como a Volkswagen. Até mesmo a Tesla, que tem uma grande fábrica em Xangai, perdeu terreno para a BYD e outras montadoras chinesas. “Antes da pandemia, as regras eram estabelecidas pelas montadoras ocidentais”, disse Felipe Munoz, analista global da JATO Dynamics, uma empresa de pesquisa. “Agora é o contrário.”

 

No México, as marcas chinesas agora respondem por 9% das vendas de carros novos, em comparação com nada efetivamente há cinco anos. “Elas ganharam participação no mercado quando outras marcas não tinham estoque e havia longas esperas para obter carros no México”, disse Guillermo Rosales Zárate, presidente da Associação Mexicana de Distribuidores de Automóveis.

 

No México, os veículos elétricos representam menos de 2% das vendas de carros novos, mas cresceram mais de 40% este ano, apesar da escassez de carregadores públicos. Os veículos elétricos na Cidade do México estão isentos das restrições que se aplicam aos veículos a gasolina e a diesel nos dias em que a poluição do ar é muito ruim.

 

Isso ajuda o Dolphin Mini, disse Daniela Alvarez, vendedora em outra concessionária da BYD, espremida em uma loja embaixo de um estacionamento na Cidade do México. Embora os veículos elétricos chineses ainda custem mais do que os modelos a gasolina, disse ela, há menos gastos para abastecer. “A eletricidade é mais barata”, disse ela. “Você pode compensar a diferença”. (O Estado de S. Paulo/The New York Times)