O Estado de S. Paulo
A sobrevivência do arcabouço fiscal até o fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2026, é o objetivo imediato da equipe econômica na elaboração de um pacote de cortes de gastos. A estratégia inicial seria a de aprovar propostas que evitem um estrangulamento das despesas discricionárias (passíveis de bloqueios e contingenciamentos). Numa segunda etapa, propostas mais robustas poderiam ser aprovadas, como mudanças na indexação do salário-mínimo e nos pisos da Saúde e Educação. Há em estudo diversas propostas, com cortes de até R$ 50 bilhões neste ano. O objetivo de Lula é o de que o Brasil obtenha, em seu mandato, o grau de investimento das agências de classificação de risco. Ainda assim, a equipe econômica admite que é incerto o grau de comprometimento do presidente com essa agenda e que ainda estão tentando convencê-lo de que ele poderá ter ganhos políticos. Ontem, antes de encontro com banqueiros, Lula voltou a se queixar da cobrança por corte de gastos em Saúde e Educação.
O primeiro pacote de medidas de cortes de gastos em estudo pela equipe econômica tem como objetivo manter o arcabouço fiscal de pé até o término do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A visão de interlocutores da equipe econômica é de que há obstáculos políticos para mudanças mais profundas, não só no Executivo, mas também no Congresso.
A estratégia inicial será aprovar propostas que sejam suficientes para evitar um estrangulamento das despesas discricionárias (que são passíveis de bloqueios e contingenciamentos), que vêm perdendo espaço no Orçamento com o crescimento acelerado dos gastos obrigatórios, até 2026.
O entendimento é de que há duas janelas para votações. A primeira, após as eleições municipais no fim deste mês, até o recesso parlamentar no final do ano. O período seria utilizado para aprovar essas medidas mais palatáveis do ponto de vista político, aproveitando projetos já em tramitação, como o que estabelece o fim dos supersalários, antecipado pelo jornal O Globo.
A segunda viria só após as eleições presidenciais de 2026 e a posse do próximo presidente, seja ele Lula ou não. Nesse intervalo, propostas mais robustas poderiam ser aprovadas, garantindo – na visão da equipe econômica – a sustentabilidade do marco fiscal para os próximos anos. E, entre as medidas, estariam as mudanças na indexação do salário-mínimo e também nos pisos da Saúde e Educação.
O diagnóstico de que a indexação é o principal problema estrutural do Orçamento já está mais do que assimilado pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento, mas o momento político não permite o avanço dessas propostas nem se Lula quisesse.
Embora várias medidas já estejam circulando, ainda não há nada definido porque as propostas não foram para o papel, e, principalmente, não passaram pelo crivo de Lula. Há um “cardápio” de propostas, como antecipou o Estadão, que podem chegar a 30, com cortes de até R$ 50 bilhões neste ano.
Lula tem demonstrado internamente a intenção de manter a regra fiscal de pé, e também conseguir novamente o grau de investimento durante o seu mandato. Ainda assim, a equipe econômica admite que é absolutamente incerto o grau de comprometimento que o presidente terá com essa agenda. Ontem, em evento público, ele voltou a se queixar da cobrança por corte de gastos em Saúde e Educação.
Por isso, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) têm evitado dar detalhes sobre esses estudos, já que Lula demonstra irritação quando descobre pelos jornais o que pode ser proposto, principalmente se ele entender que haverá impacto sobre os mais pobres.
A equipe econômica acertou os ponteiros sobre as propostas que pretende levar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após o segundo turno das eleições municipais, para desacelerar o crescimento dos gastos públicos. Agora, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, elaboram os argumentos para convencer o presidente a embarcar na agenda de resgate da credibilidade do arcabouço fiscal.
A palavra final de Lula é considerada incerta até por seus auxiliares. Por isso, a lista de medidas de contenção tem mais de uma dezena de itens, entre iniciativas para segurar gastos na Educação, na Saúde, na Previdência e em benefícios para militares. Será um pacote “robusto” nas palavras de um assessor do presidente, com o objetivo de dar margem para ele escolher o que aceita levar adiante.
Integrantes da equipe econômica afirmam que as ações não miram o cumprimento da meta em 2025, e que o alvo é 2026, quando analistas que acompanham as contas públicas afirmam que não será mais possível cumprir as regras do arcabouço fiscal. O ceticismo que domina os mercados faz com que o governo tenha que arcar com juros mais altos para financiar a dívida pública e provoca insegurança que se traduz em um dólar mais caro.
Diante disso, o primeiro argumento é de que nem todas as medidas precisam ser aprovadas agora, e que é possível dar um passo de cada vez na direção de uma agenda estrutural de revisão das políticas públicas. Afinal, não se pode cobrar de Lula o que nenhum presidente conseguiu fazer em termos de reformas em benefícios sociais – um mantra repetido em Brasília diz que um benefício, quando se dá, ninguém consegue tirá-lo.
Há uma lista extensa de iniciativas, mas se forem aprovadas duas de mais relevo é possível alcançar uma faixa de economia de gastos de R$ 40 bilhões, o que tornaria viável o arcabouço. Se não forem todas
aprovadas em 2024, podem ser levadas para o início de 2025, até maio, desde que estejam prontas para entrar em operação em 2026.
Os auxiliares de Lula afirmam ainda que há uma janela temporal favorável para convencer o presidente da necessidade de conter gastos. Isso porque foi concluída a revisão de despesas no Bolsa Família e na
Previdência, com esperados ganhos de R$ 25 bilhões em 2025, indicando que a gordura já foi queimada e que é preciso avançar para o segundo degrau, cuja única pauta é a revisão de gastos.
Espaço no orçamento
Se o governo embarcar na agenda, é possível abrir espaço, por exemplo, para elevar a faixa de isenção do Imposto de Renda para R$ 5 mil, como prometeu o presidente Lula em 2022. A equipe econômica debate como financiar a ampliação do benefício, que pode custar entre R$ 35 bilhões e R$ 100 bilhões a depender do desenho da medida. Um espaço extra, por meio da revisão de gastos, pode ajudar a entregar a promessa.
Há sinais também que vêm das eleições municipais e que estão no radar político do presidente, que tenta reter apoiadores após uma disputa com resultados positivos para partidos do centro e da direita moderada.
A economia dando sinais de melhora, com uma baixa na cotação do dólar, dos juros e um controle da inflação, pode ajudar a atrair os eleitores de camadas da classe média. Isso pode fazer com que Lula consiga reter inclusive os partidos que hoje flertam com o apoio a um eventual sucessor do bolsonarismo, como os governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União-GO) e Ratinho Júnior (PSD-PR).
Nessa balança de ganhos e perdas, não se espera que o mercado tenha uma reação positiva imediata ao pacote fiscal, uma vez que a desconfiança é grande. Mas a conversa de Lula com banqueiros ontem já é um sinal citado como um indício de que o presidente enxerga relevância no trabalho da equipe econômica. (O Estado de S. Paulo/Alvaro Gribel)