Transporte Moderno
A Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (ANIP) está em busca de medidas emergenciais junto ao Governo Federal para combater a crescente importação de pneus, principalmente vindos da Ásia. De acordo com as empresas com fabricação nacional, essa é uma concorrência desleal. Em entrevista ao portal Transporte Moderno, o presidente da ANIP, Klaus Curt Muller, contou que os preços dos pneus importados da Ásia estão significativamente abaixo dos custos das matérias-primas usadas na produção nacional.
Conforme dados da Receita Federal levantados pela ANIP, metade das importações chega ao Brasil a aproximadamente US$2,65/kg, enquanto o preço médio da borracha natural é de US$2,12/kg. “Como essa é apenas uma das matérias-primas, fica evidente que esses preços são desleais”, diz Muller.
Na visão do coordenador de cursos da FGV, Antonio Jorge Martins, o momento é propício para que a indústria local avalie o quanto tem evoluído em competitividade. “Buscando atrair novos investimentos que tornem as importações de pneus menos viáveis, a indústria tem considerado sugerir ao governo o aumento das tarifas aduaneiras, com prazos de amortização alinhados aos novos investimentos realizados.”
O presidente da ANIP conta que o setor tem utilizado todas as ferramentas de defesa comercial disponíveis, mas essas medidas têm prazos específicos para serem executadas pelo governo. Para ele, a concorrência desleal afeta toda a cadeia produtiva, incluindo produtores de borracha, têxteis, produtos químicos e aço. Além disso, a redução na produção da indústria de pneus impacta automaticamente o consumo de matéria-prima.
“O setor de pneus consome 70% da produção de borracha natural, e essa redução nas vendas representa uma perda estratégica para o país, além de afetar diretamente 32 mil empregos diretos e mais de 500 mil indiretos”, ressalta. Conforme o executivo, já são 2.500 funcionários em lay-off, e essa situação tende a piorar. Ele aponta que o crescimento de 117% nas importações de pneus no mesmo período está baseado em práticas desleais de comércio.
Queda nas vendas e empregos
Entre 2017 e 2023, as vendas de pneus da indústria nacional caíram 18%, resultando em altos estoques e uma redução na produção. O mercado nacional encolheu 19% entre os primeiros cinco meses de 2017 e 2024, enquanto as importações cresceram 229%.
Os pneus de carga registraram o pior desempenho do acumulado de 2023, com vendas 13,8% menores que no ano anterior. O segmento saiu de cerca de 7,48 milhões de unidades vendidas para 6,45 milhões. As vendas para montadoras tiveram recuo de 26,9%, saindo de 2,06 milhões para 1,50 milhão. No mercado de reposição, a queda foi de 8,8%, sendo 5,41 milhões em 2022 ante 4,94 milhões em 2023.
Muller destaca que mercados como EUA, Europa e México conseguiram erguer barreiras contra os pneus asiáticos, enquanto o Brasil ainda trabalha para implementar medidas de defesa comercial. “Estamos buscando medidas emergenciais para conter essa situação”, diz
Risco de desindustrialização
Um possível risco que a importação acelerada poderia trazer seria a desindustrialização do setor de pneus no Brasil, o que, segundo o presidente da ANIP, traria consequências severas. “A dependência de importações é impensável para um país com dimensões continentais que utiliza intensamente o modal rodoviário. Durante a pandemia, a indústria local ampliou sua produção para suprir a falta de pneus importados”, lembra Muller.
O executivo afirma que ANIP não é contra as importações, mas contra a concorrência desleal. De acordo com ele, o pneu importado é importante para oferecer mais opções ao consumidor, mas as importações devem ser feitas de forma justa. “Eliminando a deslealdade, salvaremos investimentos, empregos e evitaremos a desindustrialização do país”, afirma.
Outra preocupação é com relação ao impacto ambiental. De acordo com os dados da associação, os fabricantes nacionais têm um saldo acumulado de 127 mil toneladas de pneus recolhidos para reciclagem, enquanto os importadores têm um passivo ambiental de 419 mil toneladas.
Investimentos e futuro do setor
Nos últimos 10 anos, as fabricantes de pneus investiram R$ 11 bilhões em suas unidades fabris. “Esses investimentos foram feitos para aumentar a capacidade de produção, tecnologia, inovação e sustentabilidade. No entanto, a concorrência desleal desincentiva novos ciclos de investimento”, explica Muller.
O Brasil tem hoje 11 fabricantes de pneus com operações no país. São 21 plantas industriais, distribuídas por sete estados. Este conjunto foi responsável pela venda de 52 milhões de pneus no mercado local em 2023. (Transporte Moderno/Aline Feltrin)